Símbolo de uma época na qual aproveitar o dia era só o que importava para uma minúscula e privilegiada parcela da juventude americana, o casal Zelda e Scott Fitzgerald representa, no imaginário de toda uma geração, quase uma obra de ficção em si mesma. O livro Querido Scott, querida Zelda – as cartas de amor de Scott e Zelda Fitzgerald (Companhia das Letras, 472 págs., R$ 56,50) tenta romper essa amálgama, ao mesmo tempo que a desmistifica e, contraditoriamente, a reafirma e cristaliza. Porque nunca houve nem voltaria a existir um casal tão freneticamente ávido pela vida e pelo escapismo hedonista como Zelda e Scott Fitzgerald.

Organizado por Jackson R. Bryer e Cathy W. Barks, o volume reúne em três grandes blocos grande parte da correspondência trocada pelos Fitzgerald. Na primeira parte, Namoro e casamento, as cartas de amor não conseguem esconder o prenúncio da conturbada relação, com o charme que desafiava o moralismo já ameaçado pela juventude da época. Na segunda fase, Os anos de convívio, o casal troca impressões de uma era conturbada e dos conflitos que indicavam o que viria pela frente. E que aparece na terceira parte, O declínio: 1930-38.

É aqui que a doença mental de Zelda – que alguns insistiam em atribuir à opressão hipoteticamente exercida por Scott sobre um talento que concorria com o seu – se manifesta, com suas seguidas internações, agravando o alcoolismo do qual Scott já se ressentia há anos. Ironicamente, a vida dos dois refletiria a decadência da própria sociedade americana, que caminhava inexoravelmente para um novo conflito, a Segunda Guerra Mundial. Mas o casal-símbolo da era do jazz não viveria para ver. Scott morreu em dezembro de 1940. Zelda permaneceu internada e alheia à realidade até março de 1948, quando um incêndio da casa de saúde onde vivia a matou com mais oito pacientes. O mito da grande e interminável festa dos anos loucos, porém, esse não morrerá jamais.