O balanço do debate que discutiu os efeitos da crise política na economia brasileira, realizado na sucursal carioca de ISTOÉ na quarta-feira 24, apresentou um resultado inesperado. Divididos em cinco correntes de pensamento diferentes, os participantes da discussão somaram argumentos quanto a dois assuntos. Unânimes, avaliaram que a economia tem força suficiente para agüentar a saraivada de denúncias que atinge o governo. Em outro ponto há consenso negativo: a condenação às altas taxas de juros, criticadas também pelo presidente do BNDES, Guido Mantega. “Isso é uma anomalia”, afirma ele. “Mas é uma situação que já vem de muito tempo.” Também participaram do debate o secretário de Estado de Planejamento e Coordenação Institucional do Rio de Janeiro, Tito Ryff; o ex-ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Velloso; o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Unesco Theotonio dos Santos e o ex-diretor do Banco Central e atual chefe do Departamento Econômico da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Tadeu de Freitas. Por três horas, eles deram sugestões de curto, médio e longo prazos para que o Brasil, com ou sem crise política, cumpra seu destino de potência mundial emergente.

É emblemática a manifestação de tamanha confiança na estabilidade justamente na semana em que o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, deu entrevista coletiva para se defender das acusações de corrupção de Rogério Buratti, seu assessor na Prefeitura de Ribeirão Preto. Para o presidente do BNDES, o responsável pela condução das finanças nacionais é o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A solidez das estruturas institucionais é elogiada por Mantega. “O País demonstra uma capacidade inédita de enfrentar a turbulência”, avalia. Nem mesmo o professor Theotonio dos Santos, que diverge profundamente do modelo adotado, acredita que a saúde da economia dependa da inocência do ministro da Fazenda. “Não é Palocci o fiador dessa situação favorável”, argumenta. O secretário Tito Ryff vai mais longe: “Existe uma certa blindagem, por conta de postulados econômicos que hoje fazem parte da cultura nacional. São conquistas da sociedade brasileira.”

O ex-ministro Reis Velloso identifica uma espécie de “piloto automático” por conta da adoção de fundamentos econômicos básicos. “Como dizia Deng Xiao Ping, há nove maneiras de tirar a pele de um gato e é preciso escolher a melhor”, brinca Reis Velloso. Mesmo diante de várias formas de gestão, segue o ex-ministro, há uma estratégia macroeconômica universalmente aceita que serve como salva-vidas para o governo brasileiro. O economista Carlos Tadeu de Freitas chega a sugerir uma inversão na equação proposta. “Não é a política que contamina a economia, mas a economia que influencia a política”, diz.

Os elogios se transformam automaticamente em críticas quando o assunto é taxa de juros. O professor Santos contesta os que classificam a política atual como conservadora. “Mesmo os mais conservadores nunca puseram em prática algo desse tipo”, argumenta. O secretário Tito Ryff mostra indignação: “Nada justifica essa taxa real de 14% ao ano. Na política de juros, esse governo se parece com o anterior, talvez até com algum fator agravante.” Para o chefe do Departamento Econômico da CNC, esse é um obstáculo ao crescimento. O ex-ministro Reis Velloso e o presidente do BNDES, Guido Mantega, que também desejam juros mais baixos, concordam em outro ponto: a mudança deve ocorrer sem solavancos. “Não tenhamos ilusões. Isso deve ser feito com cuidado”, adverte Reis Velloso.

O debate suscitou uma série de questões que se presta ao planejamento estratégico, expressão que há décadas não orienta as ações dos governantes brasileiros. Um projeto que evite as turbulências e garanta a estabilidade econômica deve priorizar uma melhor distribuição da renda, aumentar o investimento público em infra-estrutura, educação e tecnologia. A maioria dos debatedores aderiu à onda de defesa das reformas políticas para fortalecer as instituições democráticas. Além disso, na avaliação dos economistas, a inserção do Brasil no cenário da globalização como uma nação emergente e respeitada pela comunidade internacional pode deixar de ser um sonho para se tornar realidade – desde que o governo e os agentes econômicos sejam capazes de aproveitar potencialidades brasileiras há décadas desperdiçadas.