São 200 mil telegramas trocados entre o governo dos Estados Unidos e as suas embaixadas pelo mundo entre 1973 e 1974. Desses, quase cinco mil referem-se ao Brasil. E jogam luz sobre um dos períodos mais obscuros da história do nosso país: a ditadura militar. Corroboram a existência da prática de tortura patrocinada à época pelo próprio regime autoritário. E a conivência do governo americano com os desmandos e violações aos direitos humanos que aqui o Estado praticava.

A ditadura militar acabou há 22 anos. Ao longo de todo esse tempo de democracia plena nunca se falou na disponibilização de uma quantidade tão grande de documentos oficiais sobre o regime de exceção. E eis aí o dado que mais choca em toda essa história: esses documentos foram disponibilizados agora pelo governo americano. Enquanto isso, os papéis que o governo brasileiro produziu naquele período continuam dormindo em arquivos de aço, protegidos por militares que insistem em tentar esconder a história e, com ela, os seus próprios atos.

Os documentos americanos foram liberados por força da Freedom of Information
Act (Foia), ou Lei de Liberdade de Informação, de 1966, que permite o acesso de qualquer pessoa aos documentos oficiais do governo após um período de classificação, dado o grau de confidencialidade dos papéis. No Brasil, o governo Fernando Henrique Cardoso criou dispositivos que tornam documentos confidenciais eternamente. Já Lula prometeu uma flexibilização dos arquivos que,
na prática, até hoje não ocorreu. Há papéis até referentes à guerra do Paraguai
ainda classificados como secretos! Ficamos, assim, alijados de conhecer a nossa própria história. Há famílias que até hoje buscam saber do paradeiro de seus
filhos desaparecidos. O que resta deles mora na gaveta de um arquivo trancado.
Até quando?

 

Rudolfo Lago é Editor Especial da Revista ISTOÉ