O diretor paranaense radicado em São Paulo Sérgio Bianchi levou quatro anos e gastou R$ 1,5 milhão para montar este pequeno desfile de mazelas genuinamente nativas sobre as quais ninguém gosta de falar. Assuntos sombrios e desagradáveis como discriminação social, racismo, falta de solidariedade e contravenção mascarada como jeitinho brasileiro são retratados em tom de comédia, o que só acentua sua gravidade. O centro da ação é um restaurante paulistano de classe média alta frequentado por Carlos (Daniel Dantas) e Maria Alice (Betty Gofman), um casal carioca aflito com a realidade à sua volta.

Enquanto o marido reage com cinismo, a mulher oscila entre a soberba e a total cegueira. Para deleite do dono do estabelecimento, o refinado Luiz (Cecil Thiré), que abusa sexualmente dos garçons, e de sua gerente Amanda (Dira Paes), traficante de órgãos retirados de crianças. Com a chegada do anarquista Adam (Dan Stulbach), ex-bóia-fria descendente de poloneses, escancara-se de vez a hipocrisia reinante. Valendo-se ainda das viagens do professor Alfredo (Umberto Magnani) pelo Brasil, Bianchi toca em questões delicadas, como a posse da terra, a escravidão infantil e a situação dos índios.  Dá-se ao luxo de recriar uma cena de Morte em Veneza, de Luchino Visconti, transformando o belo Tadzio em um jovem traficante que apanha da polícia de Salvador. Seria cômico se não fosse trágico.