O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, vai testar o seu prestígio. Tentará reduzir os efeitos do que
ele chama de “crise da abundância”, que ameaça os resultados do agronegócio brasileiro. Em entrevista a ISTOÉ, Rodrigues analisou esse e outros desafios da sua pasta.

ISTOÉ – Qual a perspectiva para o próximo ano?
Roberto Rodrigues
– Nos últimos três anos, a oferta de commodities, de grãos em especial, foi menor que a demanda. Atraídos pelos preços altos, os produtores plantaram soja, milho e algodão, além do trigo. Em 2005, o quadro vai mudar, com uma oferta superior à demanda, derrubando os preços. Já vi isso várias vezes. São ciclos naturais da agricultura que, com a globalização, se tornaram internacionais. Mas eu previa essa situação para mais adiante. O aumento espetacular da safra americana precipitou os acontecimentos. No Brasil, existem três fatores adicionais: o aumento dos preços de derivados de petróleo, elevando o custo de fertilizantes e defensivos agrícolas; do aço, que encareceu máquinas e equipamentos; e o preço do dólar, muito baixo. O agronegócio brasileiro terá um problema muito sério no ano que vem, embora ele não seja uniforme. O açúcar, o café, o etanol e, talvez, a laranja devem ter uma situação melhor.

ISTOÉ – O sr. tem conversado com a área econômica sobre o dólar?
Rodrigues
– Não. É uma questão de mercado. Mas para nós, com os atuais custos, com alta média de 20%, e preços, um dólar abaixo de R$ 3 é complicado. Tenho trazido ao governo essa preocupação. Não podemos esperar que essa crise chegue. Temos que criar mecanismos que minimizem as perdas.

ISTOÉ – Que mecanismos?
Rodrigues
– Na área financeira, os problemas são juros e impostos. Desoneramos insumos agrícolas para reduzir o Custo Brasil. Diminuímos os juros do Banco do Brasil, que ficaram entre 12% e 13% ao ano. O governo pode comprar parte da produção, formando estoques e ajudando a limpar o mercado. Estamos negociando com a Fazenda mais recursos para 2005 e forçando para que a Conab compre do pequeno produtor, dentro do Programa Fome Zero.

ISTOÉ – O reverso da queda de renda agrícola é o alimento barato que ajuda a controlar a inflação. É difícil convencer a equipe econômica?
Rodrigues
– O ministro Palocci (Antônio, da Fazenda) é de Ribeirão Preto, conhece o agronegócio, sabe como funciona a crise agrícola. Também já existe no governo um sentimento de que, se você destruir a galinha dos ovos de ouro, simplesmente não vai ter ovos de ouro. Não adianta nada ter um ou dois anos de preços baixos e depois faltar produto, ter que importar. Hoje, a agricultura é o carro-chefe da economia. O agronegócio corresponde a 34% do PIB. É responsável por 37% dos empregos do País e por 43% das exportações. Não quero permitir que o setor chegue a um endividamento insuportável. Tivemos três anos ótimos. Agora, é como me diz um amigo: “O céu cairá sobre tua cabeça (risos). É a Rússia com a carne, a China com a soja, aftosa no Amazonas, o mercado despencando, geada, ferrugem na soja, transgênicos. Mas, citando o falecido Vicente Matheus (ex-presidente do Corinthians), quem está na chuva é para se queimar.

ISTOÉ – Os agricultores afirmam que não há dinheiro para defesa sanitária.
Rodrigues
– O presidente Lula fez uma medida provisória com um adicional de
R$ 44 milhões, além dos R$ 67 milhões que tínhamos, que eram ridículos. Para o ano que vem, temos R$ 150 milhões e estamos brigando no Congresso para chegar a R$ 250 milhões. Há limitações, o governo tem prioridades na área social. Navego conforme as possibilidades.

ISTOÉ – Surgiu um foco de febre aftosa na Amazônia. O problema é sério?
Rodrigues
– Ou a pecuária brasileira acaba com a aftosa ou ela acaba com a pecuária brasileira. É uma questão de interesse nacional. Um caso na Amazônia está inibindo a exportação de frango e suínos de Santa Catarina. Além do produtor, é preciso envolver o consumidor, os supermercados, as universidades.

ISTOÉ – O que ajuda e o que atrapalha a agricultura brasileira?
Rodrigues
– Temos três fatores favoráveis: terra disponível – mais 90 milhões de hectares para incorporar –, a melhor tecnologia tropical do planeta e gente preparada e jovem. Fatores inibidores: falta de infra-estrutura, de defesa sanitária e de marco legal no direito de propriedade, na legislação trabalhista no campo, na legislação ambiental e na de biossegurança. Esses problemas devem ser atacados para reforçar a confiança do investidor estrangeiro. Me empenho nas questões da União Européia versus Mercosul, Alca. Bons acordos são cotas, tarifas, barreiras que caem.

ISTOÉ – Como está o diálogo com a Marina Silva (ministra do Meio Ambiente)?
Rodrigues
– Muito bom. Eu dialogo com todo o mundo, e ela também. Eu não preciso concordar, mas dialogo.