O tricampeão mundial de Fórmula 1 Nelson Piquet se divide hoje entre dois papéis: o de empresário bem- sucedido e o de pai coruja de seu filho Nelson Ângelo, o segundo de seus seis filhos e que, nas pistas, está se revelando um legítimo sucessor. Depois de ser campeão da Fórmula 3 inglesa, Nelsinho se prepara para competir na nova Fórmula 2, que será o grande vestibular para a categoria mais importante do automobilismo. Mas Piquet encontra tempo de dar uma olhada na F-1. Ele acha que o domínio da Ferrari, que vem transformando as corridas em uma chatice, se deve principalmente ao talento de Michael Schumacher, “milhões de vezes melhor do que os outros”. E não vê futuro na Ferrari para Rubens Barrichello depois que o alemão parar. Na segunda-feira 18, antes de viajar pelo País divulgando sua empresa de rastreamento e controle de veículos por satélite, Piquet ligou sua metralhadora giratória verbal e falou a ISTOÉ. Como bom piloto que é, afundou o pé no acelerador e pouco pisou no freio.

ISTOÉ – O campeonato deste ano na Fórmula 1, que termina neste domingo
com o GP do Brasil, em Interlagos, foi um dos mais monótonos dos últimos tempos, por causa do domínio da Ferrari e de Michael Schumacher. O que
pode acontecer com a Fórmula 1 se isso continuar?
Nelson Piquet –
Primeiro, não foi só este ano que o alemão e a Ferrari ganharam tudo. Eles vêm vencendo todas nos últimos cinco anos. Mas o mais importante é o talento do Schumacher, que se mantém em grande forma e se junta a um carro excelente e à qualidade do time. Com o alemão animado, vai ser difícil para o resto mudar o panorama já em 2005.

ISTOÉ – Então o ano que vem será igual? Ou as outras equipes vão melhorar?
Piquet –
Esse negócio de adivinhar só é bom para loteria. Não sei em detalhes o que os outros times estão fazendo, como estão os projetos dos carros, que melhoras os projetistas estão conseguindo nos testes. Nem eu nem ninguém. Eu só posso dar opinião, fazer previsões sobre coisas das quais tenho informações concretas, consistentes. Chutar é coisa para o Galvão.

ISTOÉ – Este ano alguém já deu sinais de que poderá ameaçar ou pelo menos chegar perto da Ferrari?
Piquet –
A BAR foi a única que evoluiu para valer. Diziam que os tempos que eles conseguiam no começo eram armação, do tipo treinar com tanque vazio. Eles mostraram que trabalhavam sério. É claro que ninguém vai querer ficar todo o tempo atrás. Os outros vão aprontar alguma para o ano que vem.

ISTOÉ – E o Rubinho, o que se pode esperar dele?
Piquet –
Ele é um bom piloto, está no melhor time e pilota o melhor carro. O problema é o outro, que é milhões de vezes melhor do que ele. Aí não dá.

ISTOÉ – Ele, então, não tem chances de ser mais do que um segundo-piloto?
Piquet –
Tem que ser macumba da brava, daquelas bem-feitas, para o alemão não ganhar. Senão, pode esquecer.

ISTOÉ – Mesmo em Interlagos, com tudo decidido, ele não tem chances?
Piquet –
Condições técnicas e carro ele tem. Mas é preciso puxar bem o cinto, apertando o saco dele para ele ficar com raiva, que aí pode acontecer. Mas é bom fazer o alemão encher a cara de Nova Schin antes, para garantir.

ISTOÉ – Os outros brasileiros na F-1, como Felipe Massa, Antônio Pizzonia e Ricardo Zonta estão em situação pouco confortável. Você vê futuro para eles?
Piquet –
É preciso estar no carro certo, na hora certa e no time certo. Tem de despertar interesse dos patrocinadores, ser simpático, ter uma cara bonitinha
e dar sorte. Ajuda estar em um bom time no qual o primeiro-piloto é um veterano prestes a se aposentar. Se você mostra serviço, pode garantir o futuro. A outra chance é botar tempo em cima do companheiro de time. A turma atual não estava
no lugar certo nem na hora certa.

ISTOÉ – Quando Schumacher parar, Rubinho poderá ser o primeiro-piloto
da Ferrari?
Piquet –
Não acredito nisso. Eles já estão de olho em pilotos de ponta capazes de dar títulos durante muitos anos, gente como o Mark Webber, por exemplo.

ISTOÉ – E seu filho, o Nelsinho, que aos 19 anos
acaba de ser campeão da F-3 inglesa? Quais seus
planos para ele?
Piquet –
Ele vai para a nova Fórmula-2. Serão carros com chassi Dallara, motor Renault V-8 de 600 cavalos, os mesmos pneus da F-1, com duas paradas de boxe nas corridas. Tudo parecido com a F-1, mas com extremo equilíbrio. Vai ganhar quem for mesmo bom. A idéia é o Nelsinho passar dois anos competindo e depois, aos 21 anos, estará pronto para a Fórmula 1.

ISTOÉ – Nelsinho chegou a ser sondado por equipes
da F-1 para ser piloto de testes?
Piquet –
Foram várias propostas. Mas tudo contrato Mandrake, com cinco, seis anos de duração, sem garantia de que ele passaria a piloto titular. É melhor ganhar experiência em uma categoria altamente competitiva.
Além disso, as provas serão preliminares da F-1 na Europa. Vitrine melhor impossível.

ISTOÉ – Você chegou a pensar em montar uma equipe de F-2 para o Nelsinho, como fez na F-3?
Piquet –
Pensei, mas desisti. Para ter uma idéia, há 24 times disputando as 12 vagas disponíveis. É preciso uma estrutura grande e cara, com dois pilotos, mais carros e tudo o mais. É melhor dar um apoio forte à sua entrada em uma boa equipe. Já estamos em negociações avançadas para isso. Ele também vai levar o Felipe Vargas, seu engenheiro, para o time, o que será um belo reforço.

ISTOÉ – Nelsinho ganhou o título inglês liderando desde a primeira etapa. E você foi menos pai coruja do que no ano passado, quando esteve em todas as provas, assistindo somente a uma corrida. Foi duro acompanhar à distância?
Piquet –
Foi um ano difícil, quando ele ganhou maturidade e responsabilidade, aprendendo a se virar sozinho. A idéia foi mostrar como será a vida dele daqui para a frente. E ele correspondeu. É um Piquet bem aprimorado.

ISTOÉ – Você disse que hoje um piloto, além de bom de braço, tem de ser simpático, ter bom visual, para fazer sucesso. Nelsinho se enquadra nisso?
Piquet –
Ele já foi melhor na F-3 do que eu. E a Sylvia, mãe dele, ajudou muito
no visual. Nelsinho tem um bom gênio, é um ótimo garoto. Ninguém vai vê-lo
saindo na porrada na pista como eu fazia. Embora essas confusões estejam
fazendo falta na F-1 de hoje, que está muito certinha.