Vamos fingir que o jogo começa nesta semana, com o horário eleitoral gratuito. Vamos também esquecer que ele já foi decidido, como ­naqueles torneios em que se conhece o vencedor de antemão e os outros times só entram em campo para cumprir tabela nas últimas rodadas. Finalmente, tentemos simular algum interesse pela disputa presidencial de 2010. Só nós, porque os outros já não dão a mínima importância. Se perguntarem aos investidores, que votam trazendo ou não seus recursos para cá, tanto faz como tanto fez. Pela primeira vez na história, o Brasil entra numa eleição com a inflação em queda, o risco-país em baixa e o dólar estável. Se consultarem os jovens, que poderiam sair às ruas ­organizando carreatas por seus candidatos, quase todos trocariam o voto por uma boa praia ou uma conversa de botequim – e a militância que resta no Brasil agora é paga.

O eleitor normal, por sua vez, prefere qualquer partida de futebol a um debate político. E até mesmo as ruas das grandes metrópoles foram salvas do clima eleitoral pelas leis civilizatórias que restringiram os cartazes e a propaganda.

A que se deve esse torpor? A uma economia estável, uma sensação de bem-estar inédita em praticamente todas as classes sociais e uma disputa com três candidatos sem carisma, todos incapazes de empolgar o eleitor e de fazer qualquer criancinha sorrir. A consequência? Uma disputa fria, sem emoção, regida pelos marqueteiros e dominada pelo dinheiro. Um dinheiro pragmático, que pressente

o rastro da vitória, e desemboca no caixa daqueles que hoje representam o status quo. E que parte, em geral, dos grupos econômicos mais favorecidos pelos subsídios do BNDES e pelo capitalismo de compadres vigente no País. Como diria o escritor americano Greg Palast, o Brasil de hoje experimenta “a melhor democracia que o dinheiro pode comprar”.

A sorte é que ainda existe vida além do horário eleitoral, que é gratuito para os candidatos, mas custa quase R$ 1 bilhão aos contribuintes, em renúncias fiscais do governo federal às emissoras de rádio e televisão. Sempre será possível sintonizar na tevê a cabo, colocar um CD ou mesmo acessar o YouTube quando aqueles rostos e vozes estranhas, vindas de um mundo subterrâneo, invadirem a sua tela ou o seu carro. E depois da “eleição” de 2010, marcada pela imposição de um nome pela vontade imperial do chefe da tribo, uma pergunta será cada vez mais urgente e terá de entrar na ordem do dia: afinal de contas, por que o voto ainda é obrigatório no Brasil, um país que se rendeu aos caprichos do seu grande coronel? Um domingo em paz vale mais do que um simulacro de eleição.