George Walker Bush foi reeleito de modo incontestável à Presidência dos Estados Unidos. Num recorde de participação, 120 milhões de cidadãos foram às urnas, na terça-feira 2, para fazer esta escolha. A maioria, 51%, lhe deu uma vitória de 3,5 milhões de votos populares – ou 286 eleitores no Colégio Eleitoral. Seu opositor, John Kerry, do Partido Democrata, amealhou 48% das preferências – ficando com 252 delegados. Legitimou-se deste modo um claro mandato. Foi a aprovação à agenda política de Bush, em contraste ao que ocorreu em 2000, quando ele chegou ao poder sem esta vantagem e graças a uma decisão da Suprema Corte. E, pela primeira vez desde 1924, com Calvin Coolidge, um presidente consegue manter maioria também no Legislativo. Fez mais: assim como Franklin D. Roosevelt, em 1936, ampliou o número de correligionários na Câmara dos Representantes e no Senado. Os republicanos ficaram com 55 dos assentos no Senado, contra 44 para democratas e um independente. Na Câmara, a diferença governista agora é de 31 cadeiras. Assim, a América estampou seu caráter de modo indelével nos sufrágios, e o retrato que se vê é de um conservadorismo insuspeitado pelos analistas políticos.

Para o presidente, saem das urnas o apoio para uma agenda política que busca a reforma tributária, com corte de impostos, e diminuição do papel do Estado em programas sociais; a defesa de uma moralidade reacionária; desregulamentação de atividades econômicas e de consumo; menores interferências nas questões ambientais; livre comércio e unilateralidade de decisões na política externa. O selo de aprovação se estende ao modo como é conduzida a chamada “guerra contra o terrorismo” – dentro e fora das fronteiras nacionais, mas pode não ter sido cravado nos planos de ação no Iraque. “Os eleitores ratificaram a agenda presidencial de modo geral. Porém, no que toca à ocupação do Iraque, o próprio governo sabe que será preciso correção de rumos nesta questão. Oitenta e cinco por cento dos americanos acreditam que o país deve buscar maior colaboração com a ONU”, disse a ISTOÉ o deputado Tom DeLay, republicano doTexas e líder da maioria na Câmara. “Isso, porém, não implica saída apressada do cenário iraquiano, entrega do comando nas decisões fundamentais ou desvios no plano político  para a região”, completa DeLay.

Na terça-feira 2, os americanos votaram não apenas com a carteira ou os temores sobre a fragilidade da política externa, como previam os democratas, mas principalmente com os valores morais da sociedade. Nada menos do que um quinto dos eleitores disse que a agenda sócio-cultural dos candidatos teve peso fundamental na escolha do vencedor. Foram demolidos, assim, vários dogmas sobre o país. O primeiro a se esfarelar foi o conceito de que a nação busca o centro no espectro político. “Desde os anos 90, a nação está se encaminhando cada vez mais para o conservadorismo”, diz Newt Gingrich, republicano, comandante do ultraconservador “Contrato com América”, ex-líder da maioria na Câmara e arqui-rival do presidente Bill Clinton. “Clinton foi esperto e percebeu que, se não abraçassem valores conservadores, os democratas perderiam o contato com a nação”, disse Gingrich a ISTOÉ. Esta receita, de certo modo, foi seguida pelo democrata John Kerry, que exibiu uma plataforma de centro-direita em seus comícios. Pregou desde a responsabilidade fiscal – corte de gastos, que é um dos pontos principais dos conservadores –, passando por maior respeito para decisões legislativas de cada Estado – no caso do não reconhecimento de casamentos de homossexuais – até posições bem militaristas na conduta da “guerra ao terrorismo” e aumento dos contingentes das Forças Armadas.

Outro revés ao imaginário ideológico democrata foi o importantíssimo papel da direita religiosa nestas eleições. Karl Rove, guru marketeiro de Bush, já dizia há tempos que, se este exército beato tivesse comparecido às urnas em 2000, seu candidato não teria perdido para Al Gore no voto popular. Há quatro anos, a revelação de que W. Bush havia sido preso por dirigir embriagado, quando era mais jovem e bebia, tirou muito do entusiasmo desta fatia de eleitores. “Desta vez, as comunidades da fé tinham certeza de que George W. Bush era seu candidato e sua agenda política era para valer”, disse a ISTOÉ Ralph Reed, ex-diretor executivo da organização Coalizão Cristã, e que agora foi coordenador de campanha da dobradinha Bush-Cheney para todo o Oeste e Meio-Oeste. “Nossos militantes foram em peso buscar os votos daqueles que ficaram em casa em 2000. Somente na Flórida e em Ohio tínhamos cinco mil pessoas em cada Estado”, diz Reed.


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