Brasil

A tragédia anunciada
Todos os anos, vários Estados brasileiros sofrem nos períodos de chuva. Mas políticas públicas eficientes e conscientização da população podem evitar o caos

Suzane Frutuoso

 i78607.jpg

 

 

 

O Brasil sempre se vangloriou de ser um território livre de desastres naturais, como terremotos e tornados. Mas tem na chuva um inimigo difícil de vencer. Historicamente, além de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais sofrem com enchentes e deslizamentos de terra quase todos os anos. Na semana passada, enquanto a tragédia catarinense comovia o País, fortes chuvas mataram duas pessoas soterradas e deixaram mais de mil desabrigadas em Rio Bonito, no Rio de Janeiro. No Espírito Santo, quase 800 moradores tiveram que deixar suas casas. Uma queda de barreira no quilômetro 684 da BR-376, no Paraná, interrompeu na segunda-feira 24 o tráfego nos dois sentidos da pista. No mesmo dia, São Paulo registrou pontos de alagamento com uma chuva de cerca de uma hora.

i78608.jpgAs condições climáticas no Sul e no Sudeste propiciam os temporais de verão. A região é atingida por um fenômeno conhecido como Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), em que frentes frias vindas do sul do continente estacionam em cima dessa área, provocando chuvas intensas. Conforme sobe pelo País, elas perdem força. Por isso, chove menos no Nordeste. No caso de Santa Catarina, é importante destacar que o excesso de chuva foi um fenômeno atípico que, segundo meteorologistas, não poderia ser previsto. O solo raso desses locais, com relevo e alta inclinação, é outra característica comum. Significa que quando há deslizamento o processo é veloz. Piora porque o solo é poroso, absorve a água mais rápido e faz a areia pesar. Tragédias seriam evitadas se houvesse ações do poder público eficientes, mas não há, por exemplo, uma política nacional de prevenção a enchentes.

O que agrava a ação da natureza é o crescimento desordenado, a falta de saneamento adequado e o mau hábito dos cidadãos de jogar lixo nas ruas – quando chove, esse lixo vai para as tubulações e obstrui a passagem das águas. "A falta de planejamento levou ao caos", afirma o urbanista Benny Schasberg, professor de planejamento urbano da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília. O plano diretor das cidades também deveria ser levado a sério, diz a professora Silvia Gattai, coordenadora do curso de gestão pública da Universidade Metodista, em São Bernardo do Campo. "É o que define quais áreas podem ser ocupadas no município e o que deve ser evitado, como encostas de morros. Isso controla os riscos de desabamentos."

No início do mês, alguns governos começaram a anunciar seus planos preventivos para o período de chuvas, que vai até abril. Em Minas Gerais, rodovias tiveram o asfalto melhorado, com sistemas que permitem o escoamento da água nas estradas, e foi criada uma comissão especial para atender em menos tempo às ocorrências causadas pela chuva. A Prefeitura de São Paulo investiu ao longo do ano na reforma das bocas-de-lobo, na limpeza de córregos e retirou famílias de áreas de risco. A Defesa Civil fica de prontidão para monitorar a drenagem dos piscinões, criados no começo dos anos 90. "Eles realmente funcionam e são fundamentais para reter o excesso de água. Fazem o papel do solo, ocupado com concreto", diz o geólogo Ronaldo Malheiros, da Defesa Civil da capital. Tempestades sempre irão ocorrer. É preciso planejamento e eficiência para conter sua ação destruidora.