Antonio Herbert Lancha Jr., 40 anos, é formado em educação física e tem mestrado e doutorado em Nutrição. Atualmente é professor titular de
nutrição aplicada à atividade motora da Escola de Educação Física da Universidade de São Paulo (USP). Em seu consultório, atende uma clientela de colunáveis como Abílio Diniz, que, diga-se de passagem, é um de seus melhores cartões de visita. Afinal, o empresário, seu cliente há 11 anos, exibe aos 67 anos um físico de fazer inveja a muitos jovens. A receita de Lancha pode surpreender aqueles que enxergam os carboidratos – nutriente presente em maior quantidade em massas, doces e grãos – como vilão. No seu cardápio, por exemplo, há espaço para a ingestão de um prato grande de macarrão no jantar. Nesta entrevista a ISTOÉ, ele falou sobre mitos da alimentação, exercícios físicos e a eterna procura pelo corpo perfeito.

ISTOÉ – Como seguir regimes alimentares com tantas privações sem sofrer?
Lancha Jr. –
Alimentação é um hábito ligado ao prazer. As pessoas sentem prazer em comer. Prezo muito isso. Por isso, de vez em quando você pode sair da dieta. Não é porque um dia você consumiu algo fora do regime que você vai engordar. O que não pode é simplesmente comer por comer, pelo vício. É importante que o consumo seja consciente e não compulsivo. Mas o melhor jeito de não sofrer é começar uma educação alimentar cedo.

ISTOÉ – O que fazer para moldar hábitos saudáveis nas crianças?
Lancha –
Fixamos o nosso padrão alimentar na adolescência. Por isso, é muito importante a participação dos pais na alimentação dos filhos. Na adolescência a pessoa forma seu universo de sabor e paladar. É lógico que, ao longo da infância, ela vai formando o acervo do que gosta e do que não gosta, mas o ciclo termina mais tarde. Os pais devem sempre dar bons exemplos. Consumir alimentos saudáveis na frente dos pequenos também ajuda. Uma criança tende a rejeitar os alimentos que ela desconhece.

ISTOÉ – Custa caro comer de forma equilibrada? E quem não tem uma infra-estrutura montada que lhe permita comer direito faz o quê?
Lancha –
Grande parte das informações que usamos são extraídas dos estudos que fazemos na universidade. A população que atendemos não é a classe mais abastada e temos de montar uma estratégia para que se alimentem corretamente. Um exemplo simples: o indivíduo vai a um restaurante por quilo e tem a oferta de todos os alimentos. Pode escolher uma alimentação ótima ou péssima. Deve existir um critério. Na universidade, temos um programa de orientação nutricional e atividade física que começou há dez anos para mulheres obesas e na pré-menopausa. O programa evoluiu. A partir do primeiro semestre de 2005, qualquer um poderá vir à USP e se inscrever. Isso custará em torno de R$ 20 a R$ 30 por mês. Elaboraremos um programa para cada um. O alvo é a população de baixa renda.

ISTOÉ – O bom resultado de uma reeducação alimentar só vem se forem feitos exercícios físicos?
Lancha –
Não adianta fazer uma coisa sem a outra. Só a mudança alimentar não ajuda a pessoa que quer emagrecer. Se imaginarmos a vida de um indivíduo comum sedentário hoje e compararmos com a de um de 30 anos atrás, o gasto calórico caiu 300 k/cal por dia. Matematicamente, isso quer dizer que o indivíduo engordará 12 quilos ao final de um ano. A atividade física hoje é o preço que devemos pagar pelo conforto que queremos ter. A vida moderna requer muito menos esforços físicos do que antigamente. Atualmente, o maior esforço é apertar botões.

ISTOÉ – No seu cardápio, o sr. recomenda à noite um prato de macarrão ao sugo. Pode-se então comer carboidrato à noite?
Lancha –
Quando as pessoas pensam em dieta elas imaginam um consumo baixo de alimento. O problema não é o volume que se consome. É a quantidade de energia que se ingere. Um grama de carboidrato tem quatro calorias, um de gordura tem nove. Então a turma acha que um bifinho e uma salada resolvem. Só que a maior parte do bife é gordura. Você consome um volume pequeno, mas com uma quantidade de energia gigantesca. O grande problema da obesidade no mundo é o consumo de gordura, e não o de carboidrato.

ISTOÉ – É muito ruim recorrer a um shake para perder dois quilos rapidamente?
Lancha –
Ataca-se o alvo errado. O ideal é pegar o seu padrão e aprender o que está errado para resolver o problema.

ISTOÉ – O que o sr. acha das dietas da moda, como Atkins e South Beach?
Lancha –
São situações oportunistas que normalmente acontecem perto do verão. Mas não se ataca o problema de fato. A pessoa faz qualquer uma dessas dietas e pensa: “Nossa, emagreci bastante. Só que agora estou me sentindo flácida.” Quando fala isso, relata o que mudou no corpo. Ela perdeu aquilo que tinha uma certa tonicidade, a massa muscular. E deixou o que não tem tônus, a gordura.

ISTOÉ – Muitos médicos dizem que
as vitaminas necessárias estão nos alimentos. Por que alguns nutricionistas recomendam seu consumo?
Lancha –
As vitaminas e os minerais estão presentes nos alimentos. Se o indivíduo tem uma boa alimentação, ela atende a sua necessidade de vitaminas e minerais. Os nutricionistas recomendam esses nutrientes para compensar o déficit provocado pela ingestão abaixo da necessidade. As doses elevadas de vitaminas e minerais podem ter efeitos positivos e negativos. Isso merece sempre cuidado e acompanhamento médico. Algumas vitaminas comprovadamente têm uma toxicidade se consumidas em largas doses por um período prolongado.

ISTOÉ – E os suplementos?
Lancha –
Entendo o suplemento como uma questão adicional. Ele deve vir
depois da alimentação correta. Ele corrige um déficit que não foi alcançado
com a ingestão alimentar.

ISTOÉ – Existem alimentos anti-stress?
Lancha –
Não. O que existe é uma vida sem stress.

ISTOÉ – O empresário Abílio Diniz é seu cliente. Ele é extremamente disciplinado com alimentação e exercícios fisicos. Só assim se consegue chegar aos 67 anos em ótima forma e com apenas 6% de gordura corporal?
Lancha –
Na família Diniz existe uma cultura da atividade física. Isso é incorporado na agenda. Frequentemente, eles comprometem aquilo que ninguém quer comprometer, que é o tempo de sono. Muitas pessoas preferem dormir uma
hora a mais a acordar e fazer 40 minutos de ginástica. No caso do Abílio, em particular, a disciplina é uma coisa extraordinária. Ele é extremamente disciplinado, um exemplo a ser seguido.

ISTOÉ – Por que o sr. aconselha a não olhar para a balança?
Lancha –
A balança tem de sair do referencial. Quando você ingere mais carboidrato e recupera a tonicidade muscular, hidrata mais o corpo. Uma pessoa mais hidratada com mais carboidratos tem o peso maior. Às vezes, ela entra em pânico, porém não parece mais gorda.

ISTOÉ – E beber durante as refeições?Pode?
Lancha –
Você pode consumir água durante a refeição,
mas o ideal é que a pessoa dê prioridade ao alimento sólido, que consuma aquilo que fisicamente vai ocupar lugar no estômago e depois a água.

ISTOÉ – Como é a sua alimentação?
Lancha –
Minha dieta é baixíssima em quantidade de gordura e tem um consumo elevado de fibras. Também como macarrão quase todos os dias, é o principal prato. E ainda carne, alimento que contém ferro e vitamina B. Mas dou preferência às carnes magras. Consumo açúcar nos doces, mas com moderação. Cerca de 70% do meu consumo alimentar é de carboidratos, 15% de proteínas e 15% de gordura.