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VIDEOCLIPE
Daniel de Oliveira e Daniela Escobar em cena do filme “400 Contra 1”: anacronismo

Havia caído em desuso, para o bem geral da nação, a moda de cineastas romantizarem o banditismo nas telas – e foi um dos representantes máximos da malandragem na vida real, também glamourizado no cinema, quem fez o corte nessa absurda e oportunista estética do crime com uma frase lapidar nos anos 1970: “Bandido é bandido, polícia é polícia.” As palavras vieram do submundo pela boca do famoso marginal Lúcio Flávio e, entre outras coisas, ele queria dizer que não há glamour na troca de tiros. Transformar bandidos em românticos heróis charmosos e desmiolados não é crime, mas trata-se de um modo de enxergar a vida que vai da ingenuidade bem-intencionada à irresponsabilidade perigosa e à arte mal realizada. Pendula entre esses vértices, por exemplo, o trabalho de estreia do cineasta carioca Caco de Souza em seu filme “400 Contra 1”. Ele se propôs a contar a história da famigerada facção Comando Vermelho, que hoje atua apenas no Rio de Janeiro, a partir da trajetória prisional de um de seus fundadores: William da Silva Lima, apelidado de “Professor” e autor do livro homônimo. Souza tinha tudo para produzir um bom filme se tivesse se disposto a mostrar apenas os fatos. Pecou, no entanto, ao estruturar o enredo sobre um escapismo estético no qual a fotografia, a edição em estilo videoclipe e a trilha sonora black music romantizam a malandragem e esvaziam a gravidade de um evento que está intimamente relacionado com os altos índices da criminalidade urbana atualmente.

Foi no presídio de Ilha Grande, no litoral do Rio de Janeiro, que presos políticos que participavam da luta armada contra a ditadura militar passaram a conviver com presos comuns. Imbuídos do absurdo idealismo (ou desespero) de dar-lhes consciência e dimensão política na desobediência à lei, os guerrilheiros ensinaram-lhes a se organizar. O “Professor”, ex-assaltante de banco, viu nisso o caminho para lutar contra as arbitrariedades do sistema penitenciário e tornou-se um preso acima das disputas de facções – podia até dormir durante rebeliões porque era intocável pelos outros presidiários. Ele, e somente ele, conquistou tal posição.

O restante dos presos comuns se tornou células-tronco dos grupos que hoje aterrorizam fora e dentro da cadeia. Nada disso o filme mostra com clareza e exatidão.