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SEM CRISE Alta de 3,5%, em janeiro, mostra resistência das vendas nos supermercados

No último trimestre de 2008, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) reuniu-se duas vezes para decidir a taxa básica de juros do País. Naquele momento, até mesmo empregadas domésticas, taxistas ou porteiros de prédio, que nunca leram um livro de economia na vida, percebiam os sinais de desaquecimento da economia. Mas, na sala de reunião do Copom, decidiu-se pela manutenção dos juros no patamar de 13,75% ao ano. O presidente do BC, Henrique Meirelles, e seus diretores decidiram ignorar até mesmo a quebra do Banco Lehman Brothers e as consequências que um evento como este produz na economia, embora esta seja uma história contada em qualquer manual para estudantes de graduação.

Pois bem, esta semana, quando o IBGE divulgou o resultado do Produto Interno Bruto (PIB), a soma da produção de riquezas pelo País, pôdese constatar o erro dos comandantes do BC. No último trimestre de 2008, o PIB brasileiro encolheu 3,6%, a maior redução desde o Plano Collor. Com um detalhe: nenhuma ameaça de inflação. Nas apresentações dos diretores do BC, disponíveis no site do banco, é fácil verificar que nenhuma delas previa o desaquecimento do último trimestre. Pelo contrário, acreditava-se piamente que os números de demanda interna e a confiança do consumidor no terceiro trimestre, portanto antes do momento mais agudo da crise internacional, se manteriam no quarto trimestre de 2008. Apesar de ter verificado uma tendência de queda na produção industrial instalada, o BC acreditou – no pior momento da crise – em aumento da massa salarial, quando o consumo das famílias caía 2,0%.

Segundo a Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio), em janeiro, o comércio varejista continuou retraído, com destaque para automóveis (-13%) e móveis (-20%). O setor de supermercados apresentou crescimento de 3,5%. No entanto, nenhum número sustentava a insistência do BC em deixar os juros nos mesmos patamares de setembro. Teimosia como esta justifica a crítica feita pelo exministro Delfim Netto, em artigo no jornal Valor, no qual decreta o “fracasso dos economistas neoclássicos, que se pensam portadores da verdadeira ciência econômica.”

Apesar da derrapada do BC, o Brasil cresceu 5,1% em 2008 e elevou o PIB a R$ 2,9 trilhões. Demonstrou, como reconhecem alguns economistas com Prêmio Nobel nas costas e instituições relevantes, como o Banco Mundial e a OCDE (o grupo dos países mais industrializados), que está bem preparado para enfrentar a crise. Um dia depois de descobrir que estava atrasado, o Copom decidiu cortar a taxa de juros em 1,5 ponto percentual, deixando a Selic em 11,25%. “O corte em si não foi pequeno. O problema é que partimos de uma taxa muito elevada. E ainda a demora que levou para isso ocorrer”, critica o economista Fernando Cardim de Carvalho, da UFRJ. “Nosso BC é muito lento quando se compara ao resto do mundo.”

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Até mesmo o presidente Lula deixou vir a público, por meio de auxiliares, seu descontentamento com a demora do BC. A oposição aproveitou para tripudiar. Mas o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, surpreendeu ao pedir que Lula interviesse no BC. Esqueceu que os tucanos sempre lutaram pela independência da instituição. Só depois de deixar o governo Fernando Henrique Cardoso passou a ser contra essa liberdade total à autoridade monetária. Mas continuou a favor da autonomia. Seja lá o que for que o BC faça com ela.

 

FOTOS: ZECA CALDEIRA; THE METROPOLITAN CORRECTIONS CENTER/AP PHOTO; STUART RAMSON/AP PHOTO