A ciência que estuda as disfunções sexuais avançou tanto nos últimos anos que causou uma reviravolta na vida dos brasileiros mais velhos. Hoje, o desempenho dos sexagenários que recorrem a tratamentos médicos para continuar na ativa é praticamente igual ao dos jovens que não precisam fazer esforço para esquentar os lençóis. É o que revela um levantamento inédito do Núcleo de Estudos da Sexualidade e Gerontologia, instituto paranaense ligado à Sociedade Internacional de Sexologia, depois de acompanhar 25 mil pacientes, de 14 a 94 anos, nas últimas duas décadas. Entre os participantes com mais de 60 anos, as mulheres foram o motor das mudanças. Interessadas em superar as limitações físicas que chegam com a idade, elas arrastaram seus parceiros aos consultórios para colocar seu desejo em prática. Resultado: nas últimas duas décadas, a média de relações delas mais que dobrou, saltando de oito por mês, em 1981, para 17, no primeiro semestre de 2005. Os homens saíram de dez para 18. Esses índices serão apresentados durante um congresso promovido pela sociedade em Nova Délhi, na Índia, no final deste ano.

A esticada no prazo da validade sexual ocorre basicamente por dois fatores: a oferta de mais medicamentos e os cuidados com a forma. Sem doenças, o corpo pode funcionar por décadas após os 50 anos. E quanto mais vigorosos, mais os maduros se entregam sob os lençóis. É por isso que a atenção com a saúde deve começar cedo. Afinal, há várias doenças que podem atrapalhar o desempenho sexual. A diabete é uma delas. Metade dos portadores tem chance de ficar impotente e até 45% das mulheres podem ficar sem lubrificação e libido. No entanto, isso não significa que essas pacientes ou vítimas de outras enfermidades percam a imaginação para o sexo. Um estudo do Instituto de Cardiogeriatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (HC/SP), por exemplo, revela que 97% dos pacientes com dificuldades de ereção associada a problemas cardíacos têm vontade de transar. “Só que o corpo não responde”, diz o médico Maurício Wajngarten.

Investimento – Assim como quem planeja uma aposentadoria tranqüila, o sexo na fase madura deve ser encarado como um investimento. E ele será maior se as aplicações forem feitas mais cedo. Aos 30 anos, os jovens estão em pleno vapor. Boa parte deles não se preocupa em cuidar da dieta, dormir ou praticar exercícios. Para aliviar o stress, muitos apelam para o cigarro e a bebida. “A combinação é explosiva”, diz Marilene Vargas, do Núcleo de Estudos da Sexualidade e Gerontologia. “O desgaste se manifesta depois dos 35 anos”, afirma. Além disso, há de se considerar os fatores psicológicos. Trabalho, família, lazer e saúde são pilares que agem em conjunto. “Se um deles vai mal, a libido sofre impacto”, explica Carmita Abdo, coordenadora do Projeto Sexualidade do HC/SP.

A boa notícia é que a medicina dispõe de recursos para reverter esses transtornos. Um dos mais importantes é a reposição hormonal. A partir dos 40 anos, o corpo sofre mudanças drásticas. As mulheres são as mais afetadas, porque a fabricação do estrogênio e da progesterona pára abruptamente. Com isso, elas passam a enfrentar alterações de humor, perda de massa óssea e da musculatura, a pele perde o viço, há redução da libido e da lubrificação vaginal. Já nos homens a testosterona – o hormônio associado ao desejo – diminui gradativamente. “É por isso que o apetite deles dura mais”, explica José Toniolo Neto, da Universidade Federal de São Paulo.

Para trazer de volta o fogo de outrora, os laboratórios farmacêuticos reproduziram esses hormônios
na forma de medicamentos. Em poucos meses,
o desejo cresce, bem como a produção da dopamina, substância envolvida no processamento do desejo sexual. Os médicos passaram a receitar a suas pacientes, além do estrogênio necessário, doses extras de testosterona. Justamente aí mora o perigo. Os exames de sangue atuais não calculam a defasagem hormonal de cada uma com precisão. Há estudos indicando que, em dosagens desnecessárias, a reposição hormonal pode acarretar câncer de mama, útero, além de pedras na vesícula. Segundo o ginecologista César Eduardo Fernandes, as que tomam estrogênio em sua dosagem máxima por mais de cinco anos, por exemplo, têm 26% mais chances de adquirir câncer. Entre os homens, os efeitos colaterais da reposição de testosterona ainda não são conhecidos.

Quem não embarca na reposição tem à sua disposição vários recursos. Para os homens, há o Viagra, o Levitra e o Cialis – as drogas contra a impotência – e as próteses penianas, hoje mais sofisticadas. Para melhorar o orgasmo, as mulheres dispõem de terapias musculares. O biofeedback computadorizado está entre as mais usadas. O método funciona como os cinturões de ginástica passiva anunciados na tevê. Consiste na aplicação de microchoques na vagina para fortalecer a musculatura. Técnicas alternativas prometem resultados parecidos. O pompoarismo é uma delas. Caracteriza-se por exercícios de contração e relaxamento da musculatura da vagina para que, mais forte, fique mais fácil atingir o orgasmo.

Risco – Com a vida sexual mais apimentada, os sessentões recebem uma injeção de auto-estima. “Confiantes, repetem a dose”, diz a psicóloga Sueli Souza dos Santos, do Centro de Estudos Psicanalíticos de Porto Alegre. Algumas pesquisas afirmam que, para essa turma, o sexo funciona como elixir da juventude. Segundo o médico americano Michael Roizen, que fundou o RealAge Institute, nos EUA, para estudar os efeitos do envelhecimento e as alternativas para retardá-lo, quem transa duas vezes por semana rejuvenesce um ano e seis meses. Se a média de orgasmo for diária, é possível desacelerar o relógio biológico oito anos.

No entanto, essa redescoberta do prazer na velhice traz embutido um triste aspecto: o risco de contaminação pelo HIV, o vírus da Aids, aumentou. De acordo com o Ministério da Saúde, nesta idade, as mulheres, especialmente, são alvo fácil. Na última década, o crescimento da doença entre aquelas com mais de 60 anos galopou a um ritmo de 568%. Em 1993, eram 56 casos, saltando para 321, em 2003. Entre os homens da mesma idade, as ocorrências passaram de 283 para 577, uma alta de 142% – também a maior dentre as faixas etárias. Os casos cresceram muito depois dos remédios contra a disfunção erétil. E a disposição se elevou no mesmo ritmo da recusa ao uso da camisinha. “A contaminação aumenta entre os que não usam preservativo”, diz o infectologista David Uip, diretor executivo do Instituto do Coração (SP). E as mulheres, mesmo as mais velhas, ainda têm dificuldade de exigir o uso de proteção. “Confiam na saúde de seu namorado, da mesma forma como confiavam na do seu marido”, diz Maria Helena Vilela, coordenadora do Instituto Kaplan de São Paulo, centro de referência nos estudos da sexualidade humana.

Agradecimentos a Flor Bernardino, da Agência Flor da Idade