O guerreiro saiu da luta e entrou para a história. Às 11h40 do sábado 13, o deputado federal, ex-governador de Pernambuco e presidente nacional do PSB Miguel Arraes ingressou no Olimpo dos mitos políticos brasileiros. Espaço ocupado por figuras do porte de Leonel Brizola, João Goulart, Tancredo Neves, Ulysses Guimarães e outros poucos que pelos atos, conduta, personalidade e, até mesmo, idiossincrasias e contradições merecem ser tratados como lendas. Arraes era o último representante dessa geração. Após 58 dias de batalha, o Pai Arraia, como era carinhosamente chamado pelos camponeses pernambucanos, sucumbiu. Foi vitimado por uma infecção respiratória. Era o fim de uma trajetória de 55 anos de vida pública, marcados pelo apego às causas sociais e por uma fidelidade canina aos ideais de uma esquerda utópica e, para seus opositores, ultrapassada.

O mais pernambucano dos cearenses nasceu em Araripe, em 15 de dezembro de 1916. Viveu no Ceará até os 16 anos, quando seguiu para o Rio de Janeiro. Na então capital federal foi cursar direito. Porém, a falta de recursos o obrigou a abandonar o sonho de ser doutor. Resolveu partir para o Recife. “Lá, onde o mar bebe o Capibaribe”, como dizem Lenine e Bráulio Tavares na bela Caribenha nação, Arraes iniciou a carreira que o levaria ao topo no cenário político. Em 1954, foi eleito deputado estadual, na primeira de suas muitas vitórias. Depois foi prefeito do Recife, governador de Estado por três vezes e deputado federal por três legislaturas. Cassado pela ditadura militar, foi preso e exilado. Beneficiado pela anistia, em 1979 voltou como um mito ao País. Anos depois, ao ser eleito governador de Pernambuco pela segunda vez, iniciou o maior projeto de eletrificação rural da história do Estado. Pela ação ganhou aura de santo no sertão pernambucano. Apaixonado pela vida e pela política, Pai Arraia deixa dez filhos. O mais famoso deles, o diretor de cinema Guel Arraes, irá produzir um documentário sobre sua vida. Condensar tanta história em três horas de filme deverá ser uma missão árdua até para o talentoso Guel, diretor dos premiados Auto da Compadecida e Lisbela e o prisioneiro.