A prendemos há tempo, no âmbito global, que o ódio é o contrário do amor. Na longa jornada humana, isso nos foi ensinado dentro dos contornos de uma visão dualista para aplacar as angústias da alma humana. Com igual objetivo, no microcosmo das relações individuais e passionais tornou-se lugar-comum o contrário: a construção emocional de que o amor e o ódio podem caminhar juntos, um sangrando o outro, mas, ao mesmo tempo, ambos alimentando-se reciprocamente em um jogo de teses e antíteses sem sínteses — algo feito uma espiral sem fim.

Vale a reflexão sobre esses dois ambientes do amor e do ódio, e, para tanto, o início é a troca da expressão do “sentimento de amor” pela do “sentimento de empatia”. O ódio não é o contrário do amor, o ódio é o contrário da empatia. Aliás, há palavra mais gasta do que a palavra amor? Amor não existe, o que existe é algo mais sofisticado que se chama empatia: colocar-se no lugar do outro, olhar a necessidade do outro, admitir em nosso universo psíquico que o outro existe em suas alegrias,
aflições e dores, independentemente de todas as diferenças. E isso serve para os dois campos citados, o da macro e o da micro relação humana. Dessa forma, o ódio é a negação da admissão do outro ser: é um sentimento narcisista e, por assim sê-lo, faz-se infantil. O ódio é, acima de tudo, a cristalização da infantilidade.

O homem tem como predadores somente alguns micróbios, uma vez que, racionalmente, não há evidência de que extraterrestres virão nos transformar em palitos de dentes. Daria, então, para vivermos empenhados na construção de um habitat pacificado. O homem tornou-se, no entanto, o predador do homem, enganando a si próprio com as construções das figuras do amor e do ódio, antagônicas ou às vezes aliadas, para se autoproclamar bonzinho com seus iguais e justificar o aniquilamento daqueles que são diferentes. Há ódio generalizado: ódio aos imigrantes, ódio nas questões raciais, ódio nos tiros, ódio nas redes sociais, ódio nas galerias, ódio nas relações de gênero, ódio nas religiões, ódio nas práticas políticas, ódio nos esportes, ódio nas poesias, ódio nos bares, ódio nos cemitérios, ódio no trânsito das grandes avenidas, ódio nas ruelas, ódio no aperto dos becos — e há até ódio ao ódio, o que também não presta. É urgente deixar de falar de amor, e passemos à nobre arte da empatia. Só assim o ódio morrerá.

Há ódio nas poesias, ódio nos bares, ódio  nos cemitérios, ódio  no trânsito das grandes  avenidas, ódio nas ruelas, ódio no aperto dos becos — e há até ódio ao ódio, o que também não presta

 

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