i61058.jpg

Na quarta-feira 10 a humanidade será contemplada com um dos maiores acontecimentos da ciência nos últimos tempos: a simulação do Big Bang, a grande explosão cósmica que teria dado origem ao universo. É a primeira vez que o homem ousa imitar, reunindo e combinando teorias e elementos de todos os campos da tecnologia, o mais incrível fenômeno astronômico. Ele se desenrolará a 100 metros de profundidade na fronteira da Suíça com a França e envolve a mais gigantesca e fantástica máquina já construída: o Grande Colisor de Hádrons, ou simplesmente LHC (Large Hadron Collider). É ele, o LHC, que vai acelerar prótons a uma velocidade próxima à da luz (300 mil quilômetros por hora) e fazer com eles se choquem entre si em quatro pontos de colisão. O objetivo é promover a desintegração de partículas, para que outras se criem e, a partir daí, tentar responder a perguntas fundamentais para qualquer área do conhecimento humano: como o universo começou? De que ele foi feito? Existem outras dimensões?
Cientistas de mais de 80 países acertaram ao longo da semana passada os detalhes finais dessa missão no Centro Europeu de Física de Partículas (CERN), na região fronteiriça da Suíça com a França. Tudo tem de se dar com extrema precisão. O ligar da máquina, por exemplo, não acontece a um simples apertar de botão – ou seja, ela já vem sendo ligada paulatinamente e o auge desse processo é que ocorrerá na quarta-feira 10. Os diferentes setores do acelerador também estão sendo acionados há muito tempo, em um procedimento que exigiu o seu resfriamento a temperaturas próximas daquilo que a ciência chama de "zero absoluto": 271 graus Celsius negativos, a mais baixa temperatura a que a física consegue chegar. Esse resfriamento, iniciado em julho, é fundamental para acelerar os prótons no anel principal de uma quilométrica circunferência. Os testes mais recentes, envolvendo a injeção de feixes de prótons por cerca de três quilômetros do circuito, deixaram entusiasmado o responsável pelo Projeto LHC, o cientista Lyn Evans. "Graças a uma equipe fantástica, todas as experimentações ocorreram sem necessidade de reparos", diz ele. "Esperamos por um sucesso retumbante quando fizermos a primeira tentativa de mandar um feixe por toda a extensão do LHC." Para se ter uma idéia das dimensões desse megaprojeto, um dos quatro receptores da máquina é maior do que a Catedral de Notre Dame, na França. Outro receptor consumiu, em seu sistema de ímãs, mais ferro do que a Torre Eiffel – dez mil toneladas. Toda essa parafernália está montada em um túnel circular de 27 quilômetros.

Esse grande experimento começou a ser montado há 14 anos e tem entre seus objetivos explicar a origem da massa das partículas elementares, inclusive o chamado bóson de Higgs. Trata-se de uma partícula que, segundo seu descobridor, Peter Higgs, seria a responsável por dar massa a outras partículas. Em suma: seria ela a "mãe" do universo, por isso o seu polêmico apelido de "partícula de Deus". Toda a teoria proposta por Higgs já foi provada, exceto a própria existência dessa partícula. Os cientistas acreditam que ela tenha existido logo após o Big Bang, em instantes, e agora esperam encontrá-la após as fortíssimas colisões que acontecerão dentro dos túneis do LHC. Assim, a primordial expectativa é de que a máquina revele à humanidade a sua própria origem e novos tipos de partículas até agora inimagináveis – há quem fale, até, em uma possível quarta dimensão. Ciência da mais pura? Apenas espetáculo? Há pesquisadores que criticam o projeto, alertando para o risco de se colocar o LHC em funcionamento geral porque ele poderia colocar em risco todo o planeta. Explica-se: a colisão de partículas formaria pequenos buracos negros que, segundo eles, seriam capazes de aspirar o planeta. Em palavras mais claras, bem mais claras: o mundo poderia acabar na quarta-feira 10. Um grupo liderado pelo alemão Otto Rössler, bioquímico e teórico do caos, acredita que o risco é suficientemente alto para que o projeto seja interrompido. Ele chegou a encaminhar uma denúncia ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos para que se proíba a experiência. O fato é que a geração de buracos negros não é descartada nem pelo próprio Centro Europeu de Física de Partículas, mas há a ressalva de que os buracos negros formados com a experiência serão minúsculos (infinitamente menores do que um átomo) e se evaporarão quase instantaneamente – ou seja, nada será aspirado e a humanidade acordará normalmente na quinta-feira 11.