Se existe um livro de fotos pouco apropriado para descansar na mesa de centro à mercê de olhares desavisados, ele é Faces da floresta – os Yanomami (Cosacnaify, 144 páginas, R$ 79), do fotógrafo Valdir Cruz, 50 anos, paranaense radicado em Nova York desde os anos 70. Não por lhe faltar qualidades. Cruz, além de ótimo profissional das lentes, conhece bem os segredos da revelação. Fruto de expedições aventureiras feitas entre 1994 e 1997 pelas terras ianomâmis – o maior grupo indígena da América do Sul, com uma população de 26 mil pessoas numa área de 200 mil quilômetros quadrados na Bacia Amazônica, entre Brasil e Venezuela –, o livro alia a arte do registro em preto-e-branco a imagens fortes. Pode-se enxergá-lo como uma denúncia ao gravíssimo problema de saúde que atinge a nação ianomâmi e que, graças ao trabalho de Cruz, despertou organizações médicas brasileiras e internacionais.

A situação vivida pelos índios – que moram em aldeias de 30 a 100 pessoas – é descrita no livro com clareza pelo antropólogo americano Kenneth Good, que foi casado com a ianomâmi Yarima, com quem teve três filhos. Segundo Good, os índios são naturalmente submetidos a condições hostis, embrenhados nos grotões das matas, lugares onde chove muito e os recursos alimentares são escassos. O maior problema, porém, são as doenças decorrentes da invasão de 40 mil garimpeiros de ouro que poluíram seus rios e destruíram áreas de caça.

Ainda que flagre cenas quase idílicas de crianças risonhas e de curiosos rituais de cura com a inalação do epene, droga alucinógena que ele próprio experimentou, Cruz volta sua câmera para o flagelo de enfermidades como a malária, a gripe, a asma, o sarampo, o oncorcencose – doença que resulta em cegueira – e até para um raríssimo caso de hidrocefalia. O registro de dor e beleza ganha contornos mais leves na exposição

O caminho das águas

, em cartaz na galeria Rosa Barbosa, em São Paulo, que traz, além do registro dos índios, imagens de inúmeras cachoeiras e paisagens no sul do Paraná. Grande parte delas desapareceu com a construção de hidrelétricas e pode ser vista em belos registros, revelados num processo digital de alta definição e impressos em papel algodão. Outra parte do trabalho também está na mostra

Brasileiro, brasileiros

, no museu Afro-Brasil, no Parque do Ibirapuera. Mesmo fragmentado em várias frentes, o trabalho de Cruz merece ser conhecido em todas as suas facetas