Em 1976, quando Caetano Veloso gravou a canção “Um Índio” num álbum dos Doces Bárbaros, seria impossível prever que sua profecia se realizaria em plena disputa presidencial de 2010. Impávido que nem Muhammed Ali, apaixonadamente como Peri, tranquilo e infalível como Bruce Lee, um índio desceu de uma estrela colorida e desembarcou na campanha de José Serra. E, assim como num típico verso de Caetano, “as coisas que eu sei que ele dirá, fará, não sei dizer assim de um modo explícito”. Aliás, nem Serra deve saber, pois antes de definir seu companheiro de chapa, que será o deputado federal Índio da Costa, havia tido um único encontro com ele. Se perguntarem ao jovem parlamentar do DEM o que dirá ou fará, nem o próprio saberá responder. Índio da Costa é, antes de tudo, um grande salto no escuro. Um mergulho no abismo.

Pode-se dizer que nenhum eleitor vota em vice, por melhor que seja. É verdade. Mas também é fato que um vice mal escolhido pode contribuir muito para uma derrota. Quem, em sã consciência, se sentirá confortável com o risco de que, numa eventualidade qualquer, um garoto imberbe da zona sul carioca, de apenas 39 anos, desconhecido por 99,99% dos brasileiros, sem experiência política e mesmo sem experiência de vida, possa assumir a Presidência da República? Uma irresponsabilidade suprema. Ah, mas ele foi relator do projeto Ficha Limpa, dirão alguns. Então o risco é ainda maior, pois a história brasileira não se cansa de ensinar, didaticamente, que convém desconfiar de todos aqueles que fazem da ética seu estandarte.

O “índio” do DEM, no entanto, pode cumprir uma missão histórica: a de exterminar toda a tribo tucana. O PSDB entrou como favorito na disputa eleitoral, mas cometeu tantos erros que pode sair dela como um partido em extinção, assim como os índios arara ou caiapó. Um partido de caciques que já não falam a mesma língua.

Bom, mas e os outros vices? O deputado Michel Temer, o de Dilma Rousseff, pode ter todos os pecados do mundo, mas carrega uma certa densidade institucional. É presidente da Câmara e representa um grande partido. O empresário Guilherme Leal, de Marina Silva, possui uma história de sucesso e um discurso autêntico. Índio da Costa já foi “prefeitinho de Copacabana” na gestão de Cesar Maia. Sua escolha talvez seja a flechada definitiva na candidatura Serra. E o resultado disso virá nas próximas pesquisas. Virá que eu vi, como diria Caetano. Ou não.