É considerado imprevidente aquele que só instala cadeados em sua porta
depois de ela ter sido arrombada. Por aqui, nossas portas há tempos vêm sendo despedaçadas, e por elas passam, sem a menor cerimônia, os escândalos políticos que teimam em nos envergonhar. Como esse que agora nos assola.
Além da profunda indignação, também nos surpreendemos, mas, a bem da
verdade, não há por quê. Nós somos muito mais que imprevidentes. Com tudo
o que acontece, até agora nenhuma tranca foi colocada, nem se pensou em providenciá-las de maneira objetiva, para proteger nossas portas contra a insistente vergonha dos escândalos. E, no caso, cadeados e trancas significam leis mais explícitas, leis mais rígidas, leis para balizar o trânsito confuso e caótico da nossa política e de seus personagens e agregados. De maneira simplista, algo como “É proibido comprar deputado”, “Não é permitido distribuir dinheiro para governar cidades, Estados ou o País”, “É proibido presentear com objetos de valor – jóias, cargos, automóveis, canetas – vereadores, deputados, senadores, etc., em troca da aprovação de projetos, sejam eles quais forem”. E por aí vai.

Quando convivemos com os escândalos no governo Collor, dizia-se que o lado
bom daquela vergonha toda era que vivíamos uma depuração das instituições e
dos políticos. Não era verdade. Essa depuração só vai mesmo ocorrer quando
novas regras forem implementadas. Um novo plano de sinalização de mão e contramão, a instalação de guard-rails para impedir o tráfego no lado errado da pista, para organizar o voraz congestionamento dessa coisa confusa, complexa
e marota que é a política. Ou seja: uma efetiva sinalização do que se pode e do
que não se pode fazer. Das verbas de campanha aos chamados lobbies.

Se nada for feito nesse sentido, o vencedor das próximas eleições de outubro
de 2006 – seja a oposição, seja o atual presidente da República – proporcionará
em pouco tempo, com certeza, a mesma reprise deplorável a que estamos sendo obrigados a assistir agora.


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