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IRONIA
No passado, o Devo brincou com a fama ao simular que inspiraria bonecos

Um disco feito pelos fãs – este deve ser o sonho de todos que adoram uma banda ou um cantor. Mas só o público do irreverente grupo americano Devo conseguiu essa façanha. Pelo menos, é o que se alardeia. Na página oficial do quarteto (www.clubdevo.com), os amantes do seu som new wave se tornaram consultores e participaram da produção do álbum “Something for Everybody”, ainda sem previsão de lançamento no Brasil. Eles ajudaram a escolher as 12 músicas, o nome do CD, a cor da capa e também o tipo de som da guitarra na canção “Step Up”. Até mesmo reuniões com os ouvintes teriam sido realizadas pela gravadora Warner Bros e pela agência de publicidade Mother, de Nova York, que fez a campanha do novo álbum. Tudo isso para saber que tipo de disco eles gostariam de ouvir.

O objetivo não era apenas lançar um álbum ao gosto do cliente, mas também fazer uma crítica aos tempos do Facebook e da infinidade de redes sociais de muita interação e pouca privacidade. O site inteiro tem piadinhas. “Devo is everywhere” (Devo está em toda parte), diz a chamada para os links da banda em três redes sociais, além do YouTube. Ou seja: ao vender seu produto e ingressar no universo virtual, o quarteto abraçou o sistema que ironiza. Para não deixar dúvidas (ou ludibriar mais), o processo de criação de “Something for Everybody” foi todo documentado. Em um vídeo, um suposto funcionário da Mother, vestido de modo engraçado, pede aos fãs-consultores que levantem a mão quando gostarem do que estão ouvindo.

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Embora haja dúvidas sobre a dimensão da interferência do público na confecção do álbum, o cantor e tecladista Jerry Casale, 61 anos, cofundador do grupo ao lado de Mark Mothersbaugh, um ano mais novo, garante que o making of, inclusive as filmagens de fãs dando pitacos, é real. Ele diz que o público decidiu inclusive a exclusão da música “No Place Like Home”, de sua autoria – ao todo, a banda finalizou 16 novas canções. Não é a primeira vez que o Devo cria esse tipo de jogo com a sua plateia: em 1979, o grupo produziu um vídeo protagonizado por um tal de Rod Rooter, executivo de uma gigantesca gravadora que obrigava os músicos a participar do lançamento de uma linha de bonecos inspirada no visual da banda, que prima pela paródia de trajes futuristas. Descobriu-se, mais tarde, que tudo era ficção. E nada científica. Fã do grupo há mais de uma década, o arquiteto e cartunista paulista Rodrigo Figueiredo, 31 anos, sugere: “Não esperem veracidade de uma rapaziada cuja base é a ironia e a irreverência. Pode ser só uma jogada de marketing.” Ninguém questiona, entretanto, que a volta da banda – que esteve no auge do sucesso em meados dos anos 1980 – ao mercado é uma boa novidade. Afinal, foram duas décadas sem gravar, desde “Smooth Noodle Maps”, o seu mais bem-sucedido álbum. E, como convém a um grupo que fez fama por meio do deboche e da crítica ácida aos costumes, eles voltam satirizando a internet e a indústria fonográfica.