MAX G PINTO

ALÍVIO Aurélia submeteu-se à investigação dos genes do câncer de mama. O resultado deu negativo

O câncer talvez seja a doença mais estudada pela medicina. A conseqüência imediata desse investimento intelectual e financeiro é a descoberta de novas armas contra ele. Com intervalos de tempo cada vez menores, as companhias de biotecnologia estão lançando métodos bastante precisos de diagnóstico, uma nova geração de medicamentos inteligentes e exames de sangue que identificam as mutações genéticas associadas aos riscos e à progressão da doença. Esses testes de sangue estão sendo considerados uma das armas mais eficientes e simples para atacar o mal no seu início. Quanto ao tratamento, as drogas mais recentes pertencem a uma linha conhecida como targeted therapy, ou terapia dirigida ao alvo. Também são chamados de anticorpos monoclonais. Trata-se de substâncias que agem seletivamente sobre as proteínas de cada tumor. Embora drogas com esse princípio ainda não sejam numerosas, os cientistas garantem que nos próximos cinco anos surgirá uma onda sem precedentes de novas moléculas para atingir o inimigo em pontos vitais.

 Na última semana, pesquisadores brasileiros mostraram que estão apertando o passo para conquistar um luregar nessa corrida (bilionária, diga-se de passagem) contra o câncer. À frente de uma parceria que une o governo federal, a Universidade de São Paulo e os Institutos Ludwig e Butantan, o cientista José Fernando Perez anunciou a decisão do grupo de somar recursos para dedicar-se à pesquisa e desenvolvimento dessas terapias dirigidas. No segundo semestre, começarão os testes com novos medicamentos no Brasil. "Faremos o primeiro estudo clínico em pacientes conduzido por empresa nacional com um novo anticorpo monoclonal, que poderá se tornar um medicamento contra o câncer de ovário", diz Perez.

NOVOS TESTES Mais exames de DNA vão surgir em cinco anos

Na origem desses avanços está o maior conhecimento dos genes e dos tumores. Na semana passada, um consórcio de pesquisadores de 80 organizações divulgou nos periódicos científicos Nature e Genome Research um minucioso estudo sobre estruturas do DNA até hoje chamadas de sucatas por não terem função biológica definida. A pesquisa mostrou que elas formam uma intricada rede de controle até então desconhecida. "Ainda há muito o que entender. Mas os resultados práticos dessa descoberta poderão se traduzir em novas drogas ou no melhor entendimento de algumas doenças", diz o médico Francisco Nóbrega, coordenador do Laboratório de Genética Molecular e Genoma da Universidade do Vale do Paraíba, em São Paulo.

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Buscamos alta tecnologia para aprimorar o diagnóstico genético e torná-lo mais rápido
Carlos Alberto Moreira-Filho, geneticista

A descoberta de novas áreas dos genes terá impacto, por exemplo, no desenvolvimento de testes de DNA para revelar as alterações que determinam o surgimento e a evolução dos tumores. São testes que começam a ser largamente utilizados, mas que ainda enfrentam barreiras como a dificuldade de se lidar com informações sobre a própria programação genética. Eles têm colocado médicos e pacientes diante de dilemas éticos. Bem indicados, os exames de DNA mudam a maneira dos pacientes de encarar a vida. A vendedora Aurélia Guerra, 28 anos, é um exemplo. Há cerca de um mês, ela recebeu o resultado negativo do teste genético que fez para avaliar os riscos de câncer de mama. "Tirei um peso enorme dos meus ombros. Minha mãe morreu aos 30 anos de câncer de mama e perdi também duas tias. Cresci com muito medo de adoecer", diz ela. Decidiu então se submeter ao teste quando viu umar e – portagem sobre o assunto. "O resultado mudou minha vida", conta. Assim como Aurélia, dezenas de pessoas já se beneficiam dos exames que predizem o surgimento do tumor. Eles não são uma sentença, mas têm alta precisão. Alguns, como o que escaneia mutações nos genes BRCA1 e BRCA2, mostram a difícil realidade de ter 80% de chances de manifestar um câncer de mama ao longo da vida. A grande vantagem, nesses casos, é aproveitar o tempo para ajustar o estilo de vida e adotar tratamentos preventivos. No Brasil e no mundo, a aplicação desses exames genéticos cresce junto com a necessidade de estruturas de suporte para os pacientes.

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150 MIL mulheres fizeram exame das mutações do câncer de mama

"O geneticista passou a ser parte importante das equipes que tratam o câncer", diz o oncologista Paulo Hoff, do Hospital Sírio-Libanês, de São Paulo. O papel do geneticista é orientar as pessoas que devem fazer esses exames porque possuem casos na família e podem ter mutações hereditárias – e também pacientes que tenham manifestado diversos tumores. "O aconselhamento genético é indispensável. O paciente necessita de suporte para lidar com informações sobre a sua carga genética", diz a geneticista Maria Isabel Achatz, do Hospital do Câncer A.C. Camargo, de São Paulo. Grandes laboratórios, como o Fleury, estão investindo nas áreas de aconselhamento genético.

CUSTO ALTO No Brasil, há estudos para baratear esses exames

Mas não basta conhecer as chances. Outro caminho promissor para vencer os tumores é o estudo da assinatura molecular de cada um deles. Companhias americanas, como a Illumina, já estão desenvolvendo chips com seqüências genéticas para esquaessencial, pois um dos principais entraves para a difusão dos benefícios da genética é o preço", afirma Nelson Gaburu, responsável pelas inovações em genética da rede Diagnósticos da América. Junto com o Hospital do Câncer, Gaburu está empenhado em criar rotinas nacionais para analisar amostras de sangue e facilitar o acesso a testes genéticos, como o que deu tranqüilidade a Aurélia.