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Quando se fala em plágio, a discussão costuma se concentrar na cópia de livros, artigos científicos, músicas, bolsas, filmes, sapatos e roupas. Pouco se fala da apropriação do design ou de um projeto arquitetônico. Talvez porque a imitação seja praxe neste mercado e a criatividade uma prerrogativa de poucos profissionais. O fato é que raros são os arquitetos que conhecem os seus direitos e que se protegem da cópia alheia. Para trazer o debate à arquitetura e à engenharia civil no País, o advogado e engenheiro Leandro Flôres está lançando o livro "Direito Autoral na Engenharia e na Arquitetura" (Editora Pillares), no qual analisa mais de 100 jurisprudências dos tribunais brasileiros sobre o tema. A obra reitera que o plágio não se restringe à cópia na íntegra.

"Ocorre mesmo quando um projeto é aproveitado parcialmente para a elaboração de um novo, omitindo a autoria das ideias originais", afirma o autor. Segundo ele, sob o escudo da utilização de uma referência ou tendência, o plagiador aproveita a concepção do projeto alheio e faz pequenas alterações. "O que caracteriza o plágio é a percepção imediata da semelhança", afirma o advogado Pedro Bhering, especialista em propriedade intelectual. "Mesmo a menor parte copiada é um plágio."

Nos Estados Unidos, a briga pelo projeto de substituição das torres gêmeas foi o marco jurídico nos debates sobre a propriedade intelectual na arquitetura. Em 2004, o arquiteto Thomas Shine processou o colega David Childs por copiar o esboço do edifício Olympic Tower, apresentado em 1999, durante a banca do seu mestrado na Universidade de Yale. Childs, que participou do júri, teria apresentado o mesmo projeto anos depois, com o título de Freedom Tower, para substituir o World Trade Center. A semelhança visual das estruturas dos dois projetos foi suficiente para que a Justiça acatasse o pedido. No entanto, Shine não havia registrado sua criação no Departamento de Direitos Autorais e Childs alterou detalhes do projeto original enquanto a ação corria nos tribunais. Pela dificuldade de calcular o dano moral a favor de Shine, a corte americana encerrou o caso.

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Entre os projetos arquitetônicos mais copiados do mundo estão a Casa da Cascata, de Frank Lloyd Wright, o edifício Sears Towers, em Chicago, nos Estados Unidos, a Ópera de Sydney, na Austrália, as intervenções urbanas de Antoni Gaudí em Barcelona, na Espanha, e a Casa Rosada, em Buenos Aires, na Argentina.

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No Brasil, sob a alegação da "referência estética", os estilos mais copiados são os projetos em curvas de Oscar Niemeyer e as ondas de Ruy Ohtake. Não apenas os papas, mas o alto clero da arquitetura brasileira também enfrenta o desconforto do plágio. "Da Costa do Sauípe à orla marítima de Salvador não faltam cópias dos meus projetos", afirma o arquiteto baiano Davi Bastos, conhecido pelas casas em eucaliptos. "Só há duas opções: ou fico bravo ou encaro como um elogio", diz.

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MADE IN CHINA Uma réplica da Torre Eiffel na cidade chinesa de Tianducheng

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IDÊNTICOS Projeto de museu em Nova York é igual ao de uma escola na Alemanha

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A FAVORITA Casa da Cascata, de Frank Lloyd Wright, está entre as mais copiadas do mundo

A arquiteta Bya Barros conta ter enfrentado inúmeras situações de plágio. Nesses casos, o cliente encomenda um projeto, mas contrata outro profissional para executá-lo por um preço menor. "Já sofri muito com esta situação", afirma Bya. "Hoje, me previno com contratos. Não se faz arquitetura sem um bom advogado." Os arquitetos que registram suas ideias no Instituto de Propriedade Intelectual saem no lucro. Após ter patenteado o seu projeto urbanístico para a cidade de Curitiba, o arquiteto Jaime Lerner foi contratado pela prefeitura de Aracaju para revitalizar a orla marítima da cidade e utilizar os mesmos equipamentos urbanos da capital paranaense.

Além do plágio, o advogado Leandro Flôres aponta para um outro tipo de violação de propriedade intelectual: a usurpação. É uma espécie de réplica da obra sem a citação do original. A China, a campeã das imitações, seguiu o caminho de Las Vegas (EUA). Aproveitou que os monumentos históricos europeus caíram no domínio público e reproduziu a Torre Eiffel, o Arco do Triunfo e réplicas perfeitas de casas alemãs na cidade de Tianducheng, ao sul de Pequim. "Os chineses copiam tudo. Não seria diferente na arquitetura", diz o arquiteto e designer Arthur Casas.

"É algo de extremo mau gosto", diz. Entre a usurpação e o plágio, trafega o conceito da tendência, muito popular entre artistas.

Não é raro que a inspiração se confunda com a cópia. "Evito feiras internacionais para não repetir o que vejo por lá", afirma Bya, que critica o mercado de arquitetura pela repetição na íntegra dos projetos apresentados nos salões internacionais e a obsessão pelos mesmos mobiliários, objetos de decoração e luminárias nas revistas especializadas. "Sou contra tendência, prefiro a ousadia."


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