O ministro da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos, recebeu na última semana um relato a respeito de
novos documentos que chegaram
à CPI dos Correios, à Polícia Federal
e ao Ministério Público. Seus interlocutores estavam preocupadíssimos. A lista de nomes autorizados a fazer saques nas contas de Marcos Valério, apreendida pela PF no Banco Rural, e a documentação entregue pelo Banco do Brasil à CPI envolvem no escândalo do mensalão mais de 40 parlamentares, entre eles o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). O pouco que vazou desse material já bastou para provocar um verdadeiro terror no Congresso. Embora Roberto Jefferson tenha poupado a bancada petista em seus ataques, o que os documentos revelam atingiu em cheio vários deputados do partido de Lula, além de sua antiga cúpula, já afastada. O poder do vai-e-vem de dinheiro das contas de Marcos Valério é tão explosivo que no Congresso já circula uma lista de candidatos à cassação.

Novas provas complicaram ainda mais a vida de parlamentares que hoje figuram na lista dos que correm o risco de perder o mandato. Um auxiliar direto do líder do PP, deputado José Janene (PP-PR), apontado como um dos principais operadores do mensalão, figura nas transações bancárias com saques de R$ 1,15 milhão. Trata-se de seu chefe de gabinete, João Cláudio Genu. Também o presidente e líder do PL, Valdemar Costa Neto (SP), foi acusado pela ex-mulher, a socialite Maria Cristina Mendes Caldeira, de repassar malas de dinheiro para deputados do partido, citando pelo menos um nome novo: Remi Trinta, do Maranhão. Além disso, o tesoureiro do partido, Jacinto Lamas, retirou do Rural pelo menos R$ 1,35 milhão. Em depoimento ao Ministério Público, Marcos Valério afirmou que o ex-ministro José Dirceu (PT-SP) sabia dos empréstimos “não contabilizados” ao PT e confirmou pagamentos ao presidente licenciado do PTB, Roberto Jefferson (RJ). O deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ), que negou ter recebido mensalão, beneficiou-se com
R$ 150 mil em saques.

Alvos – Além desse, time existem outros candidatos à seleção da cassação.
O ex-presidente da Câmara deputado João Paulo Cunha (PT-SP) foi flagrado
na lista de sacadores. Sua mulher, Márcia Regina Milanese Cunha, foi à agência
do Banco Rural em Brasília e sacou R$ 50 mil. Não bastasse ter colocado a mão
no nebuloso dinheiro de Marcos Valério, João Paulo Cunha, em uma versão insustentável, chegou a dizer que sua mulher – que esteve três vezes no Rural
num mesmo dia – teria ido ao banco pagar contas atrasadas de assinatura de
tevê a cabo. Vendo a explicação ruir diante dos extratos bancários e sob o risco de ser acusado de quebra de decoro parlamentar por ter mentido ao Congresso, João Paulo retirou a justificativa por escrito, que já havia encaminhado à CPI. Chegou a redigir uma carta de renúncia e depois desistiu. Pesam contra ele dois agravantes. Márcia Regina foi retirar o dinheiro em setembro de 2003, quando o marido estava em pleno exercício da presidência da Câmara, o quatro cargo mais importante do País. Também foi sob sua administração que a agência SMP&B, de Marcos Valério, levou a conta de R$ 10,7 milhões de propaganda da Câmara. O líder do PT,
deputado Paulo Rocha (SP), entrou no rol dos cassáveis depois de um papelão semelhante ao de João Paulo. Este, sim, renunciou à liderança do partido depois que a CPI confirmou que sua assessora Anita Leocádia sacou R$ 470 mil no Rural. Em uma primeira versão fajuta, Paulo Rocha declarou que Anita havia ido a uma clínica neurológica no mesmo andar da agência do banco. Depois, pegou o boné e saiu de fininho. Outros que devem dar explicações: Neide Aparecida (PT-GO), Sandro Mabel (PL-GO), Pedro Henry (PP-MT).

Movimentações – O pânico e os ânimos se acirraram ainda mais quando as primeiras caixas com as movimentações financeiras do Banco do Brasil começaram a ser abertas, na quinta-feira 21, na sala da assessoria da CPI dos Correios. As movimentações mostram que nem só de contratos públicos viviam as agências do publicitário mineiro. Boa parte da dinheirama era depositada nas contas de Marcos Valério em dinheiro vivo, o que, para integrantes da CPI, aponta um duto de propina. Surgiram novas baixas que não chegaram a causar surpresas. Apelidado de “Mentor da Pizza” por conta de sua atuação questionada como relator na CPI do Banestado, o deputado José Mentor (PT-SP) foi flagrado como beneficiário de dois cheques de R$ 60 mil da SMP&B em maio e agosto de 2004. Em depoimento à CPI, Marcos Valério disse ter se encontrado pelo menos três vezes com Mentor. Segundo a ex-secretária do publicitário, Karina Somaggio, Mentor viajava em jatinhos do Rural e discutia questões relacionadas ao banco com o publicitário. O deputado diz que o dinheiro é o pagamento por um serviço de advocacia prestado por seu escritório, J. Mentor Associados, e foi declarado ao Fisco. Coincidentemente, apesar de ter sido denunciado por lavagem pelo Ministério Público, o banco mineiro foi apenas citado no relatório de Mentor. Outro enrolado é o deputado Josias Gomes da Silva (PT-BA), que lascou o próprio jamegão ao sacar R$ 100 mil da conta. Dias antes de surgir a comprovação do saque, quando figurava apenas como um freqüentador da agência do Rural em Brasília, Josias deu uma desculpa esfarrapada: disse que foi ao Rural checar a cotação de câmbio do dia. Até o presidente da CPI, Delcídio do Amaral (PT-MS), acha que tem confusão. “Pela rotina dos saques, tudo indica que há mensalão”, declarou. E nem seus assessores mais próximos sairão poupados. Ex-coordenador de sua campanha elitoral, Roberto Costa Pinho, que também foi assessor do ministro da Cultura, Gilberto Gil, surge sacando um total de R$ 350 mil entre setembro e dezembro de 2003. “Quem cuidou da minha campanha foi o João Santana (publicitário baiano). Foi ele que mandou Roberto Pinho para Campo Grande. Na verdade, João Santana é ligado ao Antônio Palocci (ministro da Fazenda). O Palocci me apresentou ao João”, afirmou Delcídio na quinta-feira.