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DOIS JARDINS
O Jardim Panorama (acima) é um conjunto de 400 casas modestas.
O Cidade Jardim (abaixo) tem apartamentos que custam até R$ 16 milhões
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A exatos 371 passos do Jardim Panorama, uma pequena favela de São Paulo, ergue-se outro conjunto de prédios que, em comum, só tem o “jardim” do nome. Ambos, o Jardim Panorama e o Shopping Cidade Jardim, ficam na valorizada zona oeste da capital paulista. O Jardim Panorama se constitui de 400 casinhas precárias, onde vivem 1.500 pessoas. Já o Cidade Jardim, com 80 mil metros quadrados de área construí-da, é o mais impressionante templo do luxo do País. Um colosso do consumo que reúne um centro comercial com várias das mais caras grifes do planeta integrado a oito prédios residenciais com apartamentos avaliados em até R$ 16 milhões e a um complexo de serviços de lazer de primeira classe. Só a maquete dos prédios custou R$ 800 mil, preço equivalente ao de 27 casas populares. Poucos lugares como esses dois jardins representam com tanta precisão o conceito da Belíndia, a junção imaginária de Bélgica e Índia que o economista Edmar Bacha, então presidente do IBGE, criou nos anos 70 para explicar a distribuição de renda nos tempos do regime militar.

Em menos de um mês, o centro luminoso dessa Bélgica paulistana com suas 180 lojas foi devassado por duas vezes. Sem nenhum disfarce, à luz do dia, criminosos fizeram ações rápidas, cinematográficas, levando pânico a uma área até então tida como uma das mais seguras por dez de cada dez milionários brasileiros. Era pouco mais do meio-dia, da segunda-feira 7, quando o bando de assaltantes chegou ao shopping em dois Citroën C4. Alguns bandidos vestiam roupa esportiva, outros estavam engravatados, de terno e óculos escuros. Quatro deles chegaram a um corredor onde há ternos de R$ 10 mil expostos na vitrine e tomaram de assalto a loja da Rolex. Armados, apanharam relógios de oito mostruários – o mais barato avaliado em R$ 12 mil e o mais caro, em R$ 120 mil – e colocaram tudo em mochilas. No momento da fuga pegaram uma funcionária como escudo. Caminharam 22 passos com ela até alcançar a saída de emergência do prédio. Ao fugir com os carros que os esperavam na saída do shopping, atiraram contra um segurança, atingindo o carro blindado de uma cliente. A ação durou apenas cinco minutos.

Segundo investigações preliminares, a gangue é a mesma que há 22 dias roubou a exclusivíssima loja Tiffany no mesmo shopping, levando 72 peças, entre anéis, pulseiras e brincos. Os bandidos foram filmados pelo circuito interno de tevê. Dias depois, a polícia anunciou que havia prendido parte deles. Nenhuma mercadoria, no entanto, foi recuperada. Os dois assaltos renderam ao grupo criminoso mais de R$ 3 milhões, segundo avaliação dos investigadores do caso.

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Além das lojas, a ação dos assaltantes atingiu um verdadeiro modo de vida. O Shopping Cidade Jardim foi construído de olho num especialíssimo nicho de mercado. Ele oferece a famílias abastadas a possibilidade de morar – teoricamente com segurança e privacidade – numa espécie de microcidade exclusiva. O chamado Parque Cidade Jardim tem oito torres de apartamentos, o menor deles com 230 metros quadrados e as coberturas com mais de 1,7 mil metros quadrados. Ele é integrado a um moderno centro de compras, que concentra marcas de luxo e algumas lojas exclusivas no mercado brasileiro, como Hermès e Carolina Herrera. Ao seu redor, uma variedade incrível de serviços especiais, classe super A. O centro esportivo do complexo, com anualidade de R$ 5 mil, oferece estrutura para ginástica, lutas, pista de cooper de 250 metros, quadra poliesportiva e duas piscinas, uma semiolímpica. Na área de serviços dedicados à beleza e à forma física, os moradores e clientes do shopping contam com um spa, que dispõe de terapeutas, orientadores de estilo de vida e especialistas em beleza. O espaço pode ser frequentado com mensalidade de R$ 1.200. No shopping existem as duas únicas salas de cinema do Brasil que contam com cadeiras inteiramente reclináveis e serviço de garçonete. Durante a sessão, é oferecido um cardápio de petiscos, espumantes, vinhos e cervejas – uma Heineken pequena sai por R$ 14 e um vinho argentino de 350 ml por R$ 40. O ingresso nestas salas vip custa R$ 49, nos fins de semana. Há também 15 lanchonetes e docerias e quatro restaurantes de alta gastronomia no Cidade Jardim.

Em média, 30 mil pessoas circulam por dia no local. A vigilância interna é feita por agentes desarmados e por 40 câmeras de tevê. Na parte externa, ficam dois grupos de segurança, cada um com quatro agentes armados. Eles usam revólveres, mas nada puderam fazer quando, no primeiro assalto, os bandidos lhes apontaram submetralhadoras e armas de grosso calibre. Os especialistas em segurança consideram a estrutura adequada. Fazer um bunker, segundo eles, só afastaria os clientes.