chamada.jpg
DESCONFIE
Não é qualquer selinho conferido por uma ONG que atesta
a correção ambiental de um produto “verde”

Pegue a onda sustentável que povoa as embalagens nas prateleiras. Junte o medo que as empresas têm de perder mercado. Por fim, adicione a desinformação da maioria dos consumidores sobre o que torna determinado produto sustentável. Resultado: 90% dos rótulos trazem imprecisões, equívocos ou – direto ao ponto – mentiras.

Essa conclusão salta de um levantamento da empresa brasileira Market Analysis, feito entre fevereiro e março deste ano e publicado com exclusividade por ISTOÉ. Usando metodologia desenvolvida pela agência de marketing ambiental americana TerraChoice, a empresa avaliou 501 produtos em 11 categorias. Diagnosticou sete “pecados”, que vão da falta de prova até a má-fé, passando pelas informações irrelevantes e por aquelas que procuram acobertar erros ambientais maiores. O consolo é que, aplicado nos EUA, Reino Unido, Canadá e Austrália, o levantamento não traz resultados muito melhores. A diferença é que, lá, a prática de ludibriar o consumidor “verde” é velha conhecida e tem nome: “greenwashing”.

Essa estratégia de marketing é eficaz. “Os apelos ecológicos nos rótulos funcionam e, muitas vezes, induzem a uma compra errada”, diz Thayse Kiatkoski Neves, pesquisadora da Market Analysis. Tem consumidor que se deixa seduzir com um vago “empresa amiga do verde”. Outros não param para pensar se aquele aviso de “feito com material reciclável” se estende ao que está dentro da embalagem. “É ilusório pegar uma mercadoria de alto consumo energético como o aço, embalá-la em um pacote reciclável, colocar selinho e achar que está tudo bem”, diz Carlos Thadeu de Oliveira, gerente de informação do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).

Aos poucos, o brasileiro vai se dando conta dessas armadilhas. Segundo o Idec, cresce o número de clientes que reclamam dos apelos contidos em rótulos que prometem benefícios para o ambiente e a saúde. E o que acontece com quem decora suas embalagens com falsas promessas ecológicas? Quase nada. Segundo Rodrigo More, consultor jurídico da Abief (Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas), as empresas agem com total liberdade e rotulam do jeito que bem entendem.

“A lei só pode ser acionada quando o rótulo atribui uma propriedade que o produto não tem”, diz More. Isso deixa de fora todas as promessas de correção ambiental no processo produtivo. O que já existe é um arsenal de orientações, normas e sugestões para tentar construir um manual definitivo da rotulação “verde”. Há até uma norma ISO para o assunto, a 14.021. Com base nela, a Abre (Associação Brasileira de Embalagens) lança em junho uma cartilha que traduz o “tecniquês” para orientar consumidores e fabricantes.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Diretora-executiva da associação, Luciana Pellegrino diz que, com a divulgação dessas informações, ficará mais fácil cobrar que os envolvidos cumpram seu papel na cadeia do consumo sustentável, principalmente o consumidor: “Não dá para ele ficar esperando a sustentabilidade chegar pelo governo ou pelos fabricantes. O começo do processo está na mão dele.”

Enquanto a cartilha não fica pronta, muita gente usa os sites de relacionamento para exercitar uma espécie de fiscalização de promessas “verdes”. Outra medida é comprar em estabelecimentos que garimpam fornecedores que façam jus aos apelos ambientais que ostentam em seus rótulos. É o que procura fazer a Mundo Verde, rede de produtos naturais com 160 lojas no Brasil. “Avaliamos de 30 a 50 produtos por dia”, diz o diretor de marketing da empresa, Donato Ramos, que completa: “São nossos clientes que cobram isso.” Sinal de que o consumo “verde” começa a amadurecer no Brasil.

G_Sustentabilidade.jpg


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias