Punir nunca foi o forte nos rincões brasileiros, mas a experiência política tem contribuído dia a dia com novos e primorosos casos. Tome-se, por exemplo, a recente lista do Tribunal de Contas da União (TCU), apontando 2,9 mil gestores do dinheiro público que tiveram suas contas reprovadas e que, teoricamente, deveriam ser considerados “inelegíveis” para futuras candidaturas a cargos eletivos – inclusive já na próxima eleição de outubro. São todos “inelegíveis” pelo TCU, mas, pelos meandros legais e pela morosidade dos processos, serão todos sim “elegíveis” perante o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E aí se estabelece o paradoxo inédito e indecente da Justiça brasileira: realizam-se a apuração e a denúncia, engavetam-se as penas. A desmoralização do sistema vem por conta do próprio Legislativo, de deputados e senadores que formatam as leis advogando em causa própria. Pelo estratagema esperto (representado na Lei nº 64/90), uma simples ação perante o Judiciário pode suspender temporariamente as decisões do TCU e assim aqueles “inelegíveis” – mesmo os políticos acusados criminalmente – terão uma brecha para testar, de novo, seu prestígio nas urnas. Por essa interpretação tresloucada, não interessa se o sujeito é acusado de estelionato, fraudes, extorsão ou mesmo homicídio. Se não há sentença definitiva e ainda cabem apelações e recursos – que podem se estender indefinidamente –, ele tem o direito de concorrer à eleição ou reeleição. O quadro deplorável pode levar o País a experimentar um comando político ainda mais desqualificado que o atual. Na lista do TCU, há cinco governadores, mais de 1,5 mil prefeitos e ex-prefeitos, além de nove juízes. Inútil acusá-los. Eles podem voltar, iludindo o eleitor com promessas fáceis. Para os cidadãos que almejam o restabelecimento da moralidade é vexame sobre vexame no vale-tudo eleitoreiro.


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