Sabe-se como uma CPI começa, mas não se sabe como ela termina.” A frase, do deputado do MDB Ulysses Guimarães, tem sido bastante repetida nos últimos dias por conta da divulgação das cenas patéticas e comprometedoras do burocrata dos Correios – filmado enquanto recebia um punhado de reais – e das denúncias do então presidente do PTB, Roberto Jefferson, da compra de deputados por parte do governo. Suas acusações levaram-no à Comissão de Ética da Câmara, onde ampliou as denúncias e empurrou o governo para dentro de sua maior crise. A divulgação das fitas dos Correios detonou a criação de uma CPMI, Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, instalada sob a presidência do senador Delcídio Amaral (PT/MS). O senador, entrevistado por Eduardo Hollanda e Luiz Cláudio Cunha, da sucursal de ISTOÉ em Brasília, disse que “a investigação vai trazer os resultados que a opinião pública espera”.

Esse, digamos, seria o lado bom da coisa. O lado ruim, também segundo o senador, é que “estamos chegando no limite: três CPIs ao mesmo tempo poderão causar uma onda de instabilidade e inviabilizar os trabalhos do Congresso”.

Não se sabe onde terminam as CPIs, mas sabe-se que elas aumentam muito o atrito entre governo e oposição e isso eleva em demasia a temperatura ambiente. Sabe-se ainda que o bom senso, essa rara qualidade humana, é produzido em baixas temperaturas. É produto de cabeças mais frias, não se dá bem no excesso de calor e não é gerado por mentes atabalhoadas, confusas. A CPMI começou e, como queria demonstrar Ulysses, não se sabe como vai terminar. Confirma-se o temor de seu presidente, o senador Delcídio Amaral, e, como uma metástase, ela já está se alastrando. Ou seja, a CPMI dos Correios pode se desdobrar na do mensalão e investigar as denúncias de Jefferson. E a alta temperatura está ressuscitando outra CPI, a dos Bingos, que mira em Waldomiro Diniz e, portanto, no ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Na seqüência da cocção cerebral generalizada vem também a ameaça de instalação da CPI das privatizações do governo FHC.

Temperatura fora de controle produz pratos de difícil digestão. O retorno do agora deputado José Dirceu ao plenário da Câmara foi pródigo em exemplos disso. Os raivosos, jurássicos e injuriosos apartes do deputado Jair Bolsonaro, os gritos histéricos da claque do Partido dos Trabalhadores nas galerias e as cenas de pugilato no plenário mostram que aconteceu de tudo por lá, mas nada que tivesse sido regido pelo bom senso.

Também não é baseado no bom senso o incentivo à agressão, física ou verbal, e as ameaças e telefonemas contra jornalistas que teimam em exercer sua função básica, a de olhar o poder através de uma lupa, apesar de tudo. E essa é uma função clara que todo bom profissional sabe que não pode ser confundida com as atribuições de delegados, promotores ou juízes. E também, é bom que se frise, não tem nada a ver com a também insensata prática do deplorável esporte de corrida de abutres que tem como regra básica ver quem, às bicadas, destrói o que ainda se encontra em pé nos momentos de caos.

E o jornalismo, governos democratas sabem disso, é fundamental para o exercício pleno da democracia. E o presidente Lula é um democrata.