A revolução não será televisionada.” Essa frase
é o nome de um movimento de mídia independente
que nasceu por volta de 2000, pouco tempo antes
de o primeiro brasileiro descobrir o significado da palavra blog. A julgar pelas mudanças que a explosão dessas páginas eletrônicas está causando nos meios de comunicação, esse movimento já começou. O ambiente da internet está dominado por esses sites pessoais que no início eram usados como diários –
e muitos analistas apostaram que não passariam
de modismo adolescente. Hoje, essas páginas
com opiniões, relatos e fotos atraem a atenção de muitos internautas. Longe de ameaçar ou substituir
os meios de comunicação tradicionais, trazem a possibilidade inédita e democrática de publicar artigos sem controle algum.

Não é necessário ter conhecimento profundo sobre informática para criar um blog. Basta ter um computador com acesso à internet. Como não há controle sobre o conteúdo divulgado, o internauta que visita a página pode publicar seus comentários. É a famigerada liberdade de expressão elevada à potência máxima. A novidade chegou ao Brasil por volta de 2002 e começa a chamar a atenção da opinião pública, das celebridades, de empresários e da classe política. Os blogs, enfim, parecem ter saído da adolescência e chegado à maturidade.

Assim como é impossível controlar o conteúdo dos weblogs, é difícil contabilizá-los e, portanto, dimensionar esse fenômeno. Estima-se que sejam mais de 11 milhões deles no mundo e que surjam 40 mil novos por dia, segundo a empresa Technorati, que rastreia esses endereços. O maior catálogo de blogs brasileiros, o www.blogs.com.br, da mineira Maysa Pereira, já registra mais de 30 mil páginas – embora se suspeite que o número seja ainda maior. É quase impossível traçar um perfil dos blogueiros brasileiros, que estão em todas as faixas etárias, regiões e profissões. Maysa arrisca um palpite: “Os diários pessoais são a maioria, sete em cada dez pessoas que têm blogs são mulheres entre 15 e 23 anos.”

A apresentadora de tevê Fernanda Lima ilustra bem essa estatística. Seu blog (www.fernandalima. com.br/blog.html) tem de tudo um pouco. Conversas com telespectadores de seu programa na MTV, detalhes de sua vida pessoal e comentários sobre o noticiário no mundo. “Às vezes, chego a acordar no meio da noite com idéias sobre algum assunto, mas já pela manhã penso que ele não tem relevância alguma para quem vai ler”, ela escreve. Seus leitores discordam, comentam seus textos, tecem elogios e trocam desabafos.

Assim como a VJ, a atriz Samara Felippo (www.samarafelippo.blogger. com.br) criou um blog para dialogar com seus fãs, contar novidades e ler comentários sobre seu trabalho. Sua página, porém, ficou maior, com iniciativas solidárias como a campanha para doação de medula óssea para salvar a vida de crianças com leucemia. Já a atriz e cantora Thalma de Freitas usa seu blog como ferramenta de marketing pessoal (www.afilhadomaestro.blogger.com.br). Ali, a carioca Thalma, filha do maestro Laércio de Freitas, divulga seus shows, bastidores de ensaios fotográficos, encontros com celebridades e muitas fotos.

Fama – Embora a maioria dos blogs ainda seja do tipo “diário pessoal”, são os endereços jornalísticos, como o do apresentador de tevê Marcelo Tas, e os políticos, como o do jornalista Ricardo Noblat, que ganharam notoriedade, prestígio e audiência. O blog de Noblat (https://noblat.blig.ig.com.br) protagonizou episódios que confirmam que a revolução da blogosfera já começou. Lido assiduamente pelos interessados em política, a página foi citada pelo deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) em seu primeiro depoimento no Congresso. Semanas antes, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) resolveu assinar o pedido de abertura da CPI dos Correios, depois de ler os comentários dos leitores de Noblat.

No dia seguinte ao depoimento de Jefferson, Noblat registrou recorde de audiência. Num único dia foram 72.240 visitantes. “Os números desmoralizam a idéia de que as pessoas não se interessam em ler sobre o que já viram na televisão. Elas querem ver, escutar e ser ouvidas. Querem opinar”, diz. Noblat, que foi diretor de diversos jornais impressos, no momento não trabalha em veículo de comunicação de massa, mas criou um meio em que a massa se comunica com ele.

A idéia de que blogs são verdadeiras tribunas livres é que torna esse fenômeno revolucionário. A interatividade em tempo real é o diferencial inovador. O presidente da Associação Brasileira de Provedores de Acesso à Internet (Abranet), António Tavares, diz que na internet tudo nasceu para ser caótico, acessível e livre. “Antes o caos do que o cerceamento da liberdade”, diz, criticando o governo chinês por impor uma censura à sua blogosfera. “Nos blogs, o direito de resposta é natural e instantâneo. Isso aumenta a responsabilidade de quem escreve. Os temas são pautados pelos leitores e não o contrário, é uma inversão da hierarquia”, diz.

Há quem diga que liberdade em excesso tem seu lado negativo. É possível encontrar blogs de conteúdo nocivo aos olhares de crianças e jovens. Um exemplo é o “viciado carioca”, diário virtual de um cocainômano. Segundo especialistas, mesmo com o risco de desprevenidos se depararem com blogs como esse, nada justifica qualquer tipo de controle. “A rede é um espaço de expressão livre e quem está imbuído de ética sabe se comportar”, afirma Gilberto Lacerda, da Universidade de Brasília (UnB). “Vemos o surgimento de uma nova sociedade impulsionada pela explosão dos blogs. É tão novo que nem sabemos como lidar com essa liberdade inédita”, afirma.

Big Brother – O psicólogo paulista David Pereira, autor de tese sobre sociedades de informação, chamou o fenômeno de revolução anarquicultural. Ele analisa os blogs como ferramentas “com vocação para despertar polêmicas e paixões”. E ressalta que viver a comunicação em rede ameniza a solidão. Assim como nas salas de bate-papo (chats), a possibilidade de fazer contato e trocar idéias é o que move os blogueiros de plantão. Fabiana Komesu, especialista em lingüística da Universidade de Campinas (Unicamp), pesquisou 53 blogs do tipo “diário” para sua tese de doutorado. “Muitos usam o computador para acessar o mundo e o universo do outro sem sair de casa. Não são diários íntimos, mas um fenômeno de comunicação social complexo”, atesta.

Apesar de toda essa reorganização social, ainda não se pode falar em cifras.
Por enquanto, o serviço é oferecido gratuitamente pelos provedores de internet.
Para os anunciantes de mídias tradicionais, os blogs praticamente não existem. Alguns blogueiros garantem que já é possível ganhar uns tostões. O escritor Alex Castro, criador do guia de páginas brasileiras SobreSites, diz que há pelo menos duas formas de se ganhar dinheiro com blogs. Uma delas é ser filiado a um shopping virtual, que paga comissão sobre as vendas aos que chegarem à loja
a partir de sua página.

A outra forma de lucrar na blogosfera é com um braço do mecanismo de buscas Google, o Adsense, no qual as empresas oferecem produtos relacionados às palavras-chave mencionadas no blog. São modelos ainda incipientes. Por enquanto, a vantagem de manter um blog atraente e atualizado é ter uma ferramenta eficaz
de marketing pessoal nas mãos. Que o digam as centenas de celebridades blogueiras, como a atriz Samara Felippo, a cantora Thalma de Freitas e a apresentadora Fernanda Lima.