Pela primeira vez desde o início das discussões em torno da sucessão presidencial de 2010, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), admitiu que é candidato a presidente da República. Em entrevista exclusiva à ISTOÉ, Aécio revelou que se lançará na disputa, assim que forem confirmadas as prévias para a escolha do nome do PSDB ao Palácio do Planalto. “Aprovadas as prévias, é natural que eu seja uma alternativa para o partido e para o País”, disse. “Estou disposto a disputar as prévias e discutir com as bases do partido um projeto novo para o Brasil.”

FOTO: ANDERSON SCHNEIDER/AG. ISTOE

"Tenho conversado muito com o PMDB, o que mostra que há espaço para o entendimento, mesmo que eu não esteja nos quadros do partido" Aécio Neves

A entrevista ocorreu na quarta-feira 11 (leia as declarações à pag. 38), quando ele fechou uma rodada de reuniões políticas em Brasília, aberta na sexta-feira anterior em audiência no Palácio do Planalto com o presidente Lula. Em todos os encontros, Aécio avisou que vai iniciar uma campanha pelas prévias no ninho tucano. “A tradição do PSDB de optar por uma decisão centralizada nos levou nas duas últimas eleições a duas derrotas”, disse ele à ISTOÉ. “É hora de mudar essa tradição para mudarmos o resultado da próxima eleição.”

Dois fatores animam o governador a encarar uma disputa contra o governador paulista, José Serra. A primeira é a aceitação nacional de seu nome. Na mais recente pesquisa, realizada pela CNT/Sensus, em que aparece como candidato tucano, Aécio lidera, em qualquer cenário, a disputa contra a pré-candidata do governo, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, ou contra o deputado Ciro Gomes (PSB). A outra é baseada numa análise política.

"O PSDB não pode ter medo de debater"

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Durante sua passagem por Brasília, na quarta-feira 11, o governador Aécio Neves, apesar da agenda superlotada de compromissos, reservou um espaço para uma entrevista exclusiva à ISTOÉ.

Por sugestão dele, o diálogo ocorreu no trajeto do escritório do ex-ministro Pimenta da Veiga, no Lago Sul, onde os tucanos tiveram reuniões políticas, até o aeroporto.

ISTOÉ – O sr. é candidato à Presidência da República?
Aécio Neves –
Só posso ser candidato a presidente se o partido me indicar candidato. Mas estou disposto a disputar as prévias e discutir com as bases do partido um projeto novo para o Brasil.

ISTOÉ – Mas, confirmadas as prévias, o sr. é candidato?
Aécio –
É natural que eu seja uma alternativa para o partido.

ISTOÉ – E também uma alternativa para o País?
Aécio –
Exatamente: sou uma alternativa para o País. Agora, temos que aguardar essa regulamentação porque ela vai definir quem pode financiar as prévias, se os candidatos podem receber doações e de que forma os meios de comunicação vão poder cobrir as prévias, de modo que não se configure campanha antecipada. Temos que ter todo o cuidado de não infringir qualquer legislação para que não haja questionamentos futuros. Aí é natural que, sentindo que existe, como eu sinto hoje, espaço dentro do partido para discussão de uma alternativa nova e de um equilíbrio federativo, meu nome seja colocado.

ISTOÉ – As principais lideranças políticas dizem que o PMDB seria uma opção para o sr. disputar a Presidência, caso não haja espaço no PSDB. Esse cenário é possível? Aécio – Tenho conversado muito bem com o PMDB, o que mostra que há espaço para um entendimento, mesmo que eu não esteja nos quadros do partido. Agora, se estou propondo no PSDB uma discussão interna, não faz sentido eu dizer que vou para outro partido. Se aceito e proponho a discussão interna, tenho compromisso de estar com o PSDB. Vejo, inclusive, não só no PMDB, mas em outras forças políticas que estão hoje sob o guarda-chuva do presidente Lula, que muitas dessas legendas não vão estar necessariamente com o PT. Uma coisa é o Lula. Outra coisa é o PT, que pode ter aliados, mas não nessa amplitude. Por isso, o PSDB tem que abrir diálogo com essas forças partidárias. Para isso, precisamos de um projeto para o País. Não um país que encarne o anti-Lula, mas um país que chamo de pós-Lula.

ISTOÉ – O sr. pretende discutir esse novo projeto?
Aécio –
O Brasil teve uma sequência de avanços importantes desde o governo FHC. Mas o País precisa de uma agenda nova. E é isso que vamos discutir. Porque senão vamos nos conformar com candidaturas pré-colocadas e as pessoas vão chegar às eleições sem saber exatamente o que elas significam.

ISTOÉ – Como foram os encontros em Brasília e quais as perspectivas para o sr. e para o PSDB?
Aécio –
Acho que o PSDB não pode se acomodar achando que vai ganhar as eleições só porque está na frente nas pesquisas. Quando defendo as prévias e digo que têm que ser regulamentadas até o final de março, é porque acredito que elas podem ser o instrumento que falta ao PSDB para reencontrar-se com suas bases. Nós somos um partido que se distancia um pouco de setores que nos apoiavam e que estiveram sempre muito próximos a nós. A agenda do Brasil que nos levou à Presidência da República é muito diferente da agenda atual. Naquela época a estabilidade econômica era a prioridade. Hoje a agenda é outra, sem contar a agenda da crise.

ISTOÉ – Qual é a sua proposta?
Aécio –
Estou estimulando que o PSDB não tenha medo de debater internamente com seus filiados um projeto novo para o Brasil. Precisamos apresentar o novo PSDB. O que diferencia o projeto do PSDB do que está aí. Muita gente tem dificuldade em encontrar as nuances e as diferenças, a não ser das figuras dos candidatos. Precisamos fugir de uma campanha personalista em que de um lado há o candidato que o presidente Lula apoia e do outro um candidato que não participa de um debate interno. O PSDB não pode ter medo dessa discussão. Obviamente, quem entra numa disputa dessas tem o compromisso de apoiar quem vence a disputa. Esse é um instrumento do qual não podemos abrir mão e minha expectativa é que possamos regulamentar essas prévias.

ISTOÉ – Na reunião de lideranças do PSDB com o ex-presidente Fernando Henrique foi defendida a antecipação do lançamento do candidato do partido ao Planalto. Isso abre caminho para uma decisão de cúpula?
Aécio –
Essa reunião teve um objetivo principal, que foi alcançado, de acabar com essa história de dissidência interna. Também se falou sobre candidatura e minha opinião é que não devemos definir a nossa estratégia em função da estratégia dos outros. Se o governo federal optou por antecipar o nome da Dilma, é uma estratégia dele. Talvez estejam até certos.

Nós já temos nomes conhecidos e o que precisamos é discutir um projeto para o País. Precisamos de duas ou três ideias mestras para que as pessoas voltem a ter confiança no PSDB. De qualquer forma, a proposta das prévias já é uma antecipação.


ISTOÉ – Por quê?
Aécio –
As convenções ocorrem em julho do ano eleitoral. Estou falando em antecipar em seis meses pelo menos, o que me parece um prazo adequado. Nem acho que um candidato exposto muito tempo tenha muitas vantagens assim. Os nomes estão aí colocados, não vejo espaço para o surgimento de outras alternativas e vou me bater nisso. Quando tomamos decisões de forma centralizada, e eu participei dessas decisões, o resultado é o que nós sabemos: nós perdemos em 2002 e 2006. É hora de mudar essa tradição para mudarmos o resultado da próxima eleição, quem sabe.

"Precisamos de um país pós-Lula, não anti-Lula"

Hoje, o principal argumento da cúpula do PSDB a favor de Serra é o de que o paulista está na dianteira nas pesquisas – segundo a CNT/Sensus, Serra faria quase cinco pontos percentuais a mais que Aécio na espontânea e cerca de 20 pontos na maioria das comparações contra Dilma, Ciro, Heloísa Helena ou Marta Suplicy. Em conversas reservadas, porém, o governador mineiro e seus aliados rebatem dizendo que os levantamentos mostram que ele teve pouca exposição nas regiões Norte, Nordeste e Sul. As prévias, então, serviriam para consolidar seu nome em todo o País. "Além do mais, uma boa largada não necessariamente garante uma boa chegada. Nós já vimos isso no passado", tem dito Aécio.

As movimentações de um candidato em Brasília

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PLANALTO
Na sexta-feira 6, o governador iniciou seu périplo por Brasília em encontro com Lula

CÂMARA
Na quarta-feira 11, visitou o deputado Michel Temer, presidente nacional do PMDB

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ESPLANADA
Depois esteve com o ministro Nelson Jobim (Defesa), outro nome importante do PMDB

SENADO
Com Sarney, ouviu declaração de apoio incondicional

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TUCANATO
Com o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, discutiu tática para levar o partido às prévia


O pontapé inicial nesta pré-campanha será dado no dia 16 de março, no Recife. A convite do ex-ministro Fernando Lyra, ele participará do lançamento de um livro em comemoração ao centenário do presidente Tancredo Neves, avô de Aécio. Haverá ainda uma escala no Ceará do ex-presidente do PSDB Tasso Jereissati, que tem um histórico de divergências com Serra, e do deputado Ciro Gomes (PSB), com quem Aécio flerta há dois anos para a construção de uma possível aliança. O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), resultado concreto desta parceria Aécio-Ciro, vai direto ao que talvez seja o principal trunfo do governador para conquistar o direito às prévias. "Se o Serra atropelar, o risco é de que não tenha voto em Minas Gerais", analisa ele. "Essa é a escolha de Sofia do PSDB."

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Ou seja, se hoje Aécio não tem a preferência da cúpula, todos os tucanos sabem que sem ele o PSDB não ganha a eleição. É por isso que a disputa interna está recheada de declarações diplomáticas em público, enquanto ferve nos bastidores. Os serristas voltaram a defender a tese da "fila", segundo a qual a direção do partido decidiria que este seria o momento de Serra, enquanto Aécio teria de aguardar a vez.

"Precisa contextualizar a fila", explica o deputado Júlio Semeghini (SP), fiel escudeiro do ex-governador Geraldo Alckmin, que foi convertido em aliado de Serra depois de nomeado secretário de Desenvolvimento de São Paulo. "O Serra é o candidato natural do partido, o mais preparado, que já disputou a Presidência e foi ministro." O problema dessa tese é que, se ela tivesse sido seguida no passado, o candidato do PSDB em 1994 teria sido Mário Covas e não Fernando Henrique.

Na ebulição que vive nos bastidores, o PSDB não encontra consenso em relação aos nomes nem às teses. Na edição do dia 26 de janeiro, ISTOÉ consultou 23 dos 27 presidentes estaduais do PSDB sobre o melhor critério para a escolha do candidato à Presidência da República. Na ocasião, 18 votaram a favor de prévias. Repetida a pesquisa na última semana, a maioria dos diretórios optou por uma escolha de consenso (leia ao lado).

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FOGO AMIGO
Apesar da boa relação com Aécio, FHC quer pressa na definição do PSDB e torce por Serra

Parte dessa mudança deve ser creditada à antecipação da candidatura de Dilma Rousseff, no encontro com mais de três mil prefeitos em Brasília. A ministra fez discursos de campanha e prometeu irrigar os cofres municipais.

"É um escárnio", critica o serrista Luiz Paulo Velloso Lucas, presidente do Instituto Teotônio Vilela. "Por muito menos, prefeitos e governadores tiveram que responder a processo ou foram afastados dos cargos. Com isso, o PSDB tem que se mexer ou então vamos ficar para trás", prega.

Este novo tom de urgência surgiu em reunião em São Paulo entre líderes do PSDB e o presidente Fernando Henrique Cardoso na terça-feira 10. No encontro, destinado a resolver uma dissidência interna do partido durante a disputa pela liderança na Câmara, foi discutida a necessidade de precipitar a escolha do nome do PSDB na corrida ao Planalto. "Todo mundo sabe que os candidatos possíveis são dois, de Minas e de São Paulo. Minha posição é dar tempo ao tempo. Mas, como Lula está precipitando, nosso tempo está encurtando", afirmou FHC.

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Outro ex-presidente da República, Itamar Franco, também pediu pressa, mas antecipando seu voto. "Meu candidato é o governador Aécio", disse Itamar ao jornal Valor. "Mas ele tem que atravessar o Rubicão logo, este mês ainda. Porque a luta está aí", afirmou. Itamar é da parcela do PMDB que defende Aécio a ponto de vê-lo se filiando ao partido. Essa é uma alternativa admitida em muitas das conversas da semana passada em Brasília. "Para mim, Aécio é Tancredo e eu nunca vou ficar contra Tancredo", disse o presidente do Senado, José Sarney. "Ele é um administrador vitorioso em Minas Gerais, o avô dele foi eleito pelo PMDB, tem uma tradição no partido", acenou o presidente da Câmara, Michel Temer. Porém, o tempo joga contra a mudança, uma vez que a troca de legenda teria que acontecer até o fim de setembro. "Ele tem que vir para o PMDB espontaneamente. É bom que venha antes da prévia. Se ele perder nas prévias no PSDB, fica ruim para o PMDB", declarou um cacique peemedebista. Hoje, o futuro de Aécio parece estar na incógnita que ele mesmo costuma repetir: "Presidência da República é destino. Quantos tentaram e não conseguiram, como Tancredo?"


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