A cidade de Itu, a 98 quilômetros de São Paulo, amanheceu na quarta-feira 15 invadida por um verdadeiro batalhão de policiais federais e agentes da Receita Federal. Os alvos principais foram a fábrica da Schincariol e as residências dos donos e sócios da fabricante de bebidas, segunda maior cervejaria brasileira. Os diretores Adriano e Alexandre, filhos do falecido Nelson Schincariol, além de Gilberto Schincariol, vice-presidente da empresa, e seus dois filhos, Gilberto Júnior e José Augusto, foram presos e acusados pelos crimes de sonegação fiscal, formação de quadrilha, evasão fiscal, lavagem de dinheiro e corrupção ativa de servidores públicos. Batizada de Operação Cevada, a investida policial mobilizou 800 agentes e atingiu outros 12 Estados, onde foram presas 68 pessoas, entre elas o diretor-presidente da Cervejaria Petrópolis, Walter Farias, dono das marcas Crystal e Itaipava e ex-distribuidor da Schin. Todos os diretores presos foram transferidos de Itu para a sede da PF em São Paulo.

O esquema de sonegação da Schin, segundo a polícia, tinha como base a parceria da cervejaria com centenas de distribuidores. Constituídas em nome de laranjas, essas distribuidoras eram usadas para emitir notas fiscais subfaturadas e realizar operações contábeis falsas. A diferença dos valores subfaturados era recebida “por fora” e em dinheiro e levada aos donos da cervejaria. Foi através de denúncias anônimas de sonegação à Receita na fábrica de Cachoeira de Macacu (RJ) e da descoberta de uma mala de dinheiro que a PF passou a investigar a existência de irregularidades fiscais na empresa. A confirmação veio há cerca de dez meses, quando policiais prenderam no aeroporto de Belo Horizonte (MG) um funcionário de uma distribuidora com R$ 500 mil, que seriam entregues ao grupo de empresários de Itu. “Foi desmontada uma quadrilha que atuava como organização clandestina e criminosa”, resumiu o superintendente regional da PF em São Paulo, José Guimarães Lobato.

A PF e a Receita calculam que a sonegação pode chegar a R$ 1 bilhão nos últimos cinco anos. Documentos obtidos por ISTOÉ, entregues por um grupo de laranjas que atuavam no esquema, demonstram que o valor sonegado pela quadrilha deve ser muito maior. Com medo de represálias, esse grupo de 24 pessoas humildes – a maioria da região próxima a Itu – foi aliciado pelo braço direito de Walter Farias, hoje dono da Cervejaria Petrópolis. Farias teria implantado o esquema na Schin em 1990, com o consentimento de Nelson Schincariol, pagando uma espécie de salário mensal aos laranjas, que variava de R$ 1 mil a R$ 1,5 mil. “Nós dávamos os nossos nomes e toda a documentação para eles abrirem as empresas”, diz um dos laranjas, que junto com outros sócios participa de quatro empresas, duas delas com sede em cidades do Nordeste. Todas viravam distribuidoras da Schin. Com a afirma aberta, o grupo emitia as notas fiscais subfaturadas e falseava as operações fiscais e contábeis. Eles confirmam também a utilização das notas para exportações fictícias de cerveja, geralmente para o Paraguai. Só que os milhares de caixas do produto “exportadas” eram vendidos no mercado interno.

Em nota, o grupo Schincariol negou todas as acusações e lamentou a forma como foi conduzida a ação da Polícia, considerada violenta e sensacionalista. “São cidadãos de bem e não oferecem qualquer resistência, com residência fixa e conhecida, dirigentes de uma empresa que contribui reconhecidamente para o desenvolvimento do País”, diz a nota. O advogado da família, Roberto Podval, também questionou as prisões: “Elas são desnecessárias”, disse, lembrando que todos foram presos antes mesmo de saberem daquilo que estavam sendo acusados. Eles podem não saber do que estavam sendo acusados, mas com certeza sabiam por que estavam sendo presos.