Vivemos em um momento de pura reflexão sobre nosso modo de viver, nossa saúde e nosso bem-estar. Surge também uma profunda reflexão sobre a importância do dinheiro. No mundo da arte, esses questionamentos sempre existiram. Temos pintores que sempre tiveram a sorte de comercializar suas obras por muito dinheiro e também uma infinidade de artistas que sequer venderam quadros em vida, como Van Gogh.

Nesse universo, um pintor italiano sempre despertou minha atenção. Amedeo Clemente Modigliani era um artista irônico e que ficou célebre sobretudo por seus retratos femininos, caracterizados por rostos e pescoços alongados, sempre inspirados em máscaras africanas.

Confira 7 curiosidades que selecionei sobre Modigliani:

 

1 – Visão que dispensa os olhos

Fotos Reprodução

Seus quadros são enigmáticos, pela simplicidade e genialidade dos traços. Enquanto a maior parte dos artistas inicia um retrato começando pelos olhos, ele fugia do óbvio. Dizemos no mundo das artes que os olhos são a janela da nossa alma. São sinceros e brilham diante de uma paixão ou diminuem diante da tristeza. Dizem muito sobre as pessoas pela energia que transmitem.  Mas, para o artista, o comum não fazia parte de sua vida. Dizem que Modigliani comentava: ‘Quando eu realmente conhecer sua alma, pintarei seus olhos’. Pintou poucos retratos com olhos e até autorretratos estão com imagens vazadas. Pouco antes de morrer, pintou sua amada Jeanne Hébuterne, com olhos azuis maravilhosos.

 

2 – Parto do pintor rendeu auxílio emergencial para a família

‘Sou Modigliani, judeu’. Assim, o pintor italiano se apresentava a todos. Orgulhava-se de sua herança cultural, apesar de não ser praticante. Defendia suas raízes e buscava uma sociedade pluralista e tolerante. Era filho de um pai italiano e mãe francesa. Tornou-se símbolo de pintor boêmio criando-se, após sua morte, um verdadeiro mito em torno de sua vida, trágica e curta (de apenas 35 anos). Salvou a família quando nasceu. Foi o quarto filho de uma família que, pela parte materna, tinha parentes que eram relativamente abastados e que enriqueceram especulando com algumas mercadorias e imóveis. Porém, pela área paterna, os Modigliani tinham empobrecido, chegando à falência. O nascimento de Amedeo salvou a família da ruína total. Conforme uma lei antiga, os credores não podiam tomar bens de uma mulher grávida ou de uma mãe com um filho recém-nascido. Os oficiais de justiça entraram na residência da família, justamente na hora do trabalho de parto. Foi uma grande sorte e, com isso, seus pais protegeram seus bens mais valiosos, colocando-os sobre a cama de sua mãe.

 

3 – Quadros por um prato de comida

Produziu mais de 500 obras, mas a história de sua vida muitas vezes sobrepõe ao seu trabalho por conta da boemia. A força do mito é responsável pelo fato de que um dos primeiros e mais conhecidos artistas modernistas tenha sido também um dos menos compreendidos. Convivendo com pintores e poetas da época, é fascinante como se manteve fiel a seu próprio estilo. Seu grande telhado de vidro era financeiro. Para sobreviver, aceitava muitas vezes qualquer valor por suas obras e alguns de seus quadros foram trocados por refeições em restaurantes por valores ínfimos. Se ele conseguisse mudar esse ciclo, certamente conseguiria vender obras por valores maiores, a exemplo do que acontecia com outros pintores bem valorizados na época, como Picasso. Modigliani fazia parte dos chamados “Artistas Malditos” da capital francesa. Recusava-se a definir um estilo para sua arte, buscando uma forma que mesclava classicismo, expressionismo e modernismo. Nota-se em suas obras um traço sublinhado e constantemente visível, criando rostos e corpos com grandes curvas melodiosas.

 

4 – Bebidas, drogas e uma obra cheia de vida

Modigliani era alcoólatra e viciado em drogas, mas não pelas razões que você imagina. Desde pequeno, sua saude era muito debilitada. Aos 11 anos, teve um ataque de pleurisia – a primeira de uma série de doenças que acabou levando à sua morte precoce. Usava substâncias em excesso para tentar esconder sua tuberculose, uma doença incurável e altamente contagiosa na época. Os bêbados eram tolerados, mas os portadores de doenças infecciosas, não. Apesar do vício e dos poucos anos de vida, sua produção artística é impressionante, estando em destaque nos maiores e mais importantes museus do mundo. A breve vida de Modigliani foi uma sucessão de misérias e tristezas, fracassos e doenças. Mas, apesar disso, não se encontra em seus retratos nada de deprimente ou de doentio. Pelo contrário. Sua obra é cheia de vida, brilhante, cativante e enigmática.

 

5 – Guerra e boemia impediram seu enriquecimento

“A Judia”

Modigliani nasceu em 1884 em Livorno (Itália) e mudou-se aos 22 anos para Paris, o centro da vanguarda artística da época. Acreditava que somente na França seria capaz de desenvolver uma linguagem artística própria e realizar suas ambições. A vida na “Cidade-Luz” foi um período de criação de um estilo próprio, que misturasse o antigo e o novo. Era irreverente e usava praticamente todos os dias o mesmo paletó de veludo, registrado na maioria dos seus autorretratos. É desta época a obra “A Judia”, que mostra a influência de Paul Cézanne e dos expressionistas. Modigliani poderia ter ganhado muito dinheiro e ter suas obras em destaque enquanto era vivo, mas o ambiente econômico ruim por causa da guerra, e seu modo de vida fazia com que fosse obrigado a vender quadros a preços irrisórios. Importante dizer que, apesar de todas as dificuldades, Modigliani jamais deixou de acreditar em si mesmo e em seu talento. Sua arte sempre teve propósito e é única em sua essência.

 

6 – Polícia fecha a primeira e única exposição do pintor

Em 1917, Modigliani estreou sua primeira e única exposição individual na Galeria Berthe Weill, em Paris. Seu show exibiu desenhos e pinturas encomendadas pelo amigo e comerciante Leopold Zborovski. Os retratos de nus tornaram-se objeto de escândalo público, e a polícia fechou o show em questão de horas, no mesmo dia da inauguração. Seus nus, que provocaram escândalo na ocasião, não revelam sensualidade, mas sim um desnudamento da alma humana pela simplicidade como foram retratados. Seu estilo faz parte de um momento no qual a arte pictórica, confrontada à fotografia, lutava para manter seu espaço, seus valores e sua estética.

 

7 – Mulher grávida se atira do quinto andar

“Nu Couché” (Crédito:Reprodução)

Tinha uma maneira única de viver, e sua vida pessoal era bem complicada. Se tivesse se cuidado melhor, certamente teria vivido mais. A morte chegou aos 35 anos para Modigliani, em decorrência dos problemas de saúde acentuados pelos abusos de haxixe e álcool. Diziam que nos últimos tempos estava sempre “muito bêbado, muito chato e muito abatido”. Contraiu pneumonia em um terrível inverno, após passar quase todas as noites bebendo nos bares e voltando para casa apenas de manhã. Em janeiro de 1920 morreu de meningite tuberculosa, e a tragédia ganhou ainda mais destaque porque sua mulher, Jeanne Hébuterne, que estava grávida do segundo filho, atirou-se pela janela do quinto andar logo após sua morte. Felizmente, sua memória continua em destaque por meio centenas de obras, todas geniais. Um contraponto interessante ao ambiente de extrema pobreza que Modigliani vivia é notar o valor atingido pela tela “Nu Couché” (“Nu Deitado”, em tradução livre), comercializada em 2018 pela casa de leilões Sotheby’s por 157,2 milhões de dólares. Trata-se de um quadro raro, que mostra o corpo inteiro da modelo. Vale comparar essa obra com outros 22 nus recostados e 13 sentados para notar a diferença. Tomara que mais artistas brasileiros sejam reconhecidos em vida.