Ministro da Fazenda afirma que o mercado superestima previsões, mas que o País pode crescer 6% sem
pressão inflacionária

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O ministro da Fazenda Guido Mantega, Páginas Vermelhas desta semana, esteve em nossos estúdios e falou com o editor Yan Boechat. Confira

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Ministro da Fazenda rebate afirmação de José Serra de que o governo Lula é continuação da gestão FHC. Assista ao vídeo

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Guido Mantega explica qual será a sua participação na campanha da candidata do PT à Presidência

 

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OTIMISMO
Mantega não crê que haverá inflação de demanda

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, é um otimista, como ele próprio admite. Mesmo com o repique inflacionário do primeiro trimestre, Mantega está confiante de que o País encerrará o ano com a inflação dentro da meta estipulada pelo governo. Para ele, não faltam instrumentos do governo para conter a alta de preços sem precisar, necessariamente, ampliar a taxa de juros. “Não opi­no sobre as decisões do Comitê de Política Monetária”, diz. Re­ticente quanto à política monetária, Mantega é enfático sobre os resultados de sua gestão à frente do Ministério da Fazenda e não aceita insinuações de que a atual política econômica é um continuísmo dos anos de Pedro Malan. “Que fique claro, é tudo diferente.”

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"Se o setor siderúrgico aumentar os preços
demais, podemos liberar as importações"

Disposto a ficar no governo até o último dia, garante que não pretende se envolver na campanha da ex-ministra Dilma Rousseff. Mas, mesmo assim, não perde a chance de cutucar o principal adversário do PT: “Serra só conseguiu fazer os investimentos que fez porque nós permitimos que São Paulo ampliasse seu limite de endividamento."

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"Serra teve todo o apoio para fazer as obras que fez,
só no Rodoanel colocamos mais de R$ 1 bilhão"
 

ISTOÉ

Na última semana o sr. disse que o governo estaria disposto até a zerar a alíquota de importação do aço se houvesse aumento abusivo de preços. Existe uma pressão da indústria para recuperar as margens de lucro perdidas no ano passado?

Guido Mantega

É natural que em um ano de aquecimento econômico alguns setores queiram recuperar suas margens. Agora, é preciso fazer isso dentro de certos parâmetros, porque, se exagerar na dose, a inflação volta mesmo e aí o governo terá que tomar medidas que vão impactar a economia.

ISTOÉ

O governo já identificou esse problema?

Guido Mantega

A indústria siderúrgica deu indicativos de que pretende aumentar os preços. Como sabemos que o minério de ferro está para sofrer reajustes altos no mercado internacional, não gostaríamos que isso contagiasse o aço porque ele é um insumo importante para uma grande cadeia produtiva: carros, máquinas e equipamentos, indústria naval.

ISTOÉ

Há outros setores que preocupam o governo?

Guido Mantega

Há uma atenção com a  construção civil, pesada e leve, mas até agora os principais insumos da cadeia não estão pressionando os preços.

ISTOÉ

Muitos investimentos foram postergados por conta da crise e agora a economia está aquecida. Corremos risco de ter inflação de demanda?

Guido Mantega

Antes da crise, os investimentos estavam crescendo quase 14% ao ano. Já houve uma retomada desse investimento. Há ainda capacidade ociosa e a indústria não retornou ao nível de produção do período de pré-crise. A inflação está sendo gerada na parte de alimentos, principalmente por conta das chuvas do início do ano. Mas agora que as coisas estão voltando ao normal a inflação já está cedendo. Posso garantir que nos próximos meses os preços dos alimentos irão cair.

ISTOÉ

Então o sr. acredita que não haja necessidade de alta de juros para segurar a inflação?

Guido Mantega

Se houver um surto inflacionário causado por demanda, não por um choque de oferta passageiro, aí devemos tomar medidas. Além dos juros, o governo tem muitos mecanismos para combater a inflação.

ISTOÉ

O sr. ficaria surpreso se o Copom anunciassse na quarta-feira 28 uma elevação de um ponto percentual ou mesmo 0,75 ponto percentual, como está esperando o mercado?

Guido Mantega

Não costumo me manifestar sobre o Copom. Ele tem autonomia, faz as análises e chegará a uma conclusão. O que posso dizer é que os índices que estão sendo divulgados nesta semana mostram uma queda da inflação.

ISTOÉ

Mas qual é a sua opinião? É necessário um aumento dos juros?

Guido Mantega

Não vou opinar na véspera da reunião do Copom. Quem sabe, depois.

ISTOÉ

Há quem diga no mercado que podemos crescer 7%. O País tem capacidade para crescer a uma taxa dessa?

Guido Mantega

Acho esse número exagerado. Estão projetando o crescimento do último trimestre do ano passado, que é um período de recuperação, mas não estão levando em consideração que estamos retirando vários estímulos que a economia tinha. Acabou a redução do IPI para automóveis, está acabando a redução do IPI para móveis, acabou o estímulo para a linha branca, enfim, as vendas não serão as mesmas.

ISTOÉ

Há um otimismo exacerbado ou isso faz parte de uma pressão do mercado para ver os juros subirem com mais intensidade e rapidez?

Guido Mantega

Acho que o mercado costuma exagerar, tanto para mais quanto para menos. Eles são ciclotímicos, às vezes exageram para menos, às vezes exageram para mais. Neste momento, o exagero é para cima. Acho que podemos crescer 5,5% ou 6%, sem inflação maior, o que é importante.

ISTOÉ

O PSDB e o próprio ex-governador José Serra têm batido na tecla de que os ganhos econômicos e sociais do governo Lula são uma continuidade do governo FHC. O sr. se sente dando continuidade à gestão de Pedro Malan?

Guido Mantega

Não vou fazer comparações, mas quem quiser comparar vai ver que a economia está crescendo muito mais do que antes. Crescemos o dobro do que crescíamos no passado, então algo deve ter mudado. Em sete anos vamos ter dez milhões de empregos com carteira assinada criados. É claro que o governo anterior deu uma contribuição. Agora, em termos de modelo de crescimento, mudamos por completo. É uma nova política econômica, que fique bem claro. O Estado tem um outro papel, agora ele incentiva e impulsiona a economia, o que não acontecia. Muita coisa mudou. Não é uma continuidade simplesmente.

ISTOÉ

Uma das principais bandeiras do ex-governador José Serra será a questão do ajuste fiscal, e ele deve mostrar que investiu um volume considerável de recursos em obras de infraestrutura e manteve um superávit fiscal igual ou superior ao do governo federal. As contas públicas e o inchaço da máquina são o calcanhar de aquiles do governo nessa eleição?

Guido Mantega

Os governos estaduais só conseguiram ter uma melhoria em sua gestão, em primeiro lugar, pelo impulso de crescimento que nós demos. Crescimento é o melhor antídoto para as contas públicas. Se não houvesse um crescimento do PIB como tivemos, não haveria aumento do ICMS, do ISS, do IPTU. A segunda razão é que o governo federal abriu um espaço fiscal para os Estados se endividarem. Sem o aval do Ministério da Fazenda, os Estados não podem contrair novas dívidas para investimento com organismos como o BNDES ou o Banco Mundial. Só em São Paulo demos quase R$ 14 bilhões de espaço fiscal para o Estado contrair empréstimos para investir em infraestrutura.

ISTOÉ

O sr. entende então que as grandes obras realizadas por José Serra são mérito também do governo federal?

Guido Mantega

Eu diria que metade dos investimentos de São Paulo se deu por conta da Secretaria do Tesouro, com a minha autorização. Não sei ao certo quanto foi investido em São Paulo, mas pelo menos metade vem dessa autorização que nós demos. Além disso, as obras também têm participação do PAC. Sem a ampliação do espaço fiscal, duvido que São Paulo e os outros Estados tivessem o desempenho que tiveram. Além disso, em São Paulo o governo injetou mais R$ 4 bilhões ou R$ 5 bilhões nos cofres do Estado ao comprar a Nossa Caixa e permitiu ao governador Serra fazer os investimentos que fez. O que é ótimo, nós trabalhamos de forma republicana. Então, ele teve todo o apoio necessário para fazer as obras que fez. No Rodoanel foi mais de R$ 1 bilhão de recursos federais.

ISTOÉ

E a questão das contas públicas? São Paulo de fato conseguiu equilibrar suas contas, enquanto as críticas aos gastos de custeio do governo federal são crescentes.

Guido Mantega

As contas públicas federais são dez vezes melhores do que no governo anterior. A nossa dívida pública é menor. É só comparar. O Serra foi ministro do Planejamento, assim como eu fui. Então, ele sabe muito bem como era a dívida pública. Era 54% do PIB. Agora, por causa da crise, chegou a 42%, mas vai voltar a cair e será entregue em torno de 35%.

ISTOÉ

A economia será o cartão de visitas e a principal bandeira da ex-ministra Dilma Rousseff como candidata à Presidência. O sr. será um cabo eleitoral atuante?

Guido Mantega

Vou me dedicar à gestão da economia. Estarei ocupado com a economia e não vou me dedicar à campanha política. Ajudarei nas horas livres, nos fins de semana ou com uma interlocução. Dilma é minha amiga, minha companheira.

ISTOÉ

O esboço do plano de governo apresentado pelo PT fala muito em fortalecimento do papel do Estado e recebeu críticas fortes do setor produtivo. O sr. pretende fazer algum tipo de interlocução entre empresários e a candidata do governo para aparar possíveis arestas?

Guido Mantega

O que tende a acontecer em caso de uma vitória da candidata situacionista é uma continuidade do que está acontecendo agora. É claro que em um outro patamar. A estratégia básica é a mesma, o papel do Estado será o mesmo. Não li esse documento do PT, mas acho que ele foi distorcido. Certamente o Estado em nossa gestão teve papel diferente, é isso o que estamos vendo. Um Estado que fomenta o crescimento, faz parceria com o setor privado e transferência de renda. Esse é o Estado que temos e não há choque com o setor privado, pelo contrário. Enfim, será a mesma coisa.

ISTOÉ

Mas quais são as garantias de que não haverá uma mudança de rumo no papel do Estado em um eventual governo de Dilma?

Guido Mantega

Eu posso garantir. Conheço o pensamento da ministra Dilma e tenho certeza de que essa é a linha que ela vai seguir.

ISTOÉ

O sr. pretende dar essa garantia ao setor produtivo, convencê-lo de que nada vai mudar?

Guido Mantega

Não cabe a mim fazer o trabalho político. Estou dedicado à gestão. Mas estou esclarecendo, conheço o pensamento dela, trabalhamos juntos todos esses anos. E sei que a proposta dela é continuar exatamente nessa linha, porque é uma linha de sucesso.