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DIFERENÇAS
“O ‘FarmVille’ nos dá uma coisa da qual
nos orgulhar. O Twitter é só um telefone"

Por meio do GPS, empresas de planos de saúde vão acompanhar a atividade física de seus clientes e conceder descontos aos que se exercitam. Livros eletrônicos virão equipados com câmeras que acompanham o movimento dos olhos, para premiar leitores que chegam até o final das obras. Assim é o futuro desenhado por Jesse Schell, ex-diretor criativo da Disney, atual dono da produtora de jogos Schell Games e professor de tecnologia do entretenimento na universidade Carnegie Mellon (EUA). Na avaliação dele, indícios de que esses sistemas de recompensas externas serão o filão a ser explorado pela indústria já estão aí. Jogos como “FarmVille” e “Mafia Wars” – ambos disponíveis no Facebook – demonstram como as pessoas estão dispostas a incorporar elementos do mundo virtual na vida cotidiana e, mais importante, ser recompensadas por isso. Quando esse futuro chegar, os videogames farão de nós pessoas melhores, segundo Schell. Ele falou à ISTOÉ.

ISTOÉ – Você acredita que, ao criar, um designer de videogame está ciente de que jogos como “FarmVille” ajudam as pessoas a voltar à “realidade” por meio da tecnologia?
Jesse Schell – Duvido muito que eles pensem de maneira global na hora de criar seus games. Por outro lado, tenho certeza de que os designers intuíram que plantar coisas e vê-las florescer são atividades que têm apelo para uma audiência grande.

ISTOÉ – Com o “FarmVille”, a gente entra em contato com pessoas de verdade, mas com um meio virtual entre nós. O Twitter permite conexões mais diretas. Por que tem mais pessoas jogando do que “twittando”?
Schell – Isso acontece porque o game nos dá uma coisa da qual podemos nos orgulhar, que pode nos tornar invejados e nos fornece meios de ajudar o próximo. O Twitter não passa de um telefone.

ISTOÉ – Você diz que, ao jogar “FarmVille”, as pessoas estão procurando autenticidade. Não é um paradoxo buscar isso no mundo virtual?
Schell – Sim. Mas as pessoas não dão a menor bola para isso e vão buscar autenticidade onde quer que ela esteja. E na forma em que se apresentar. Na vizinhança, nos videogames, nos livros, no cinema.

ISTOÉ – Isso explicaria em parte o sucesso de “Avatar”?
Schell – Com certeza. O filme é uma história sobre gente que, paradoxalmente, quer se reconectar com a natureza por meio da tecnologia.
É exatamente isso que eu acho que as pessoas estão fazendo hoje. E isso vai se intensificar no futuro.

ISTOÉ – Em suas palestras, você dá vários exemplos de mecanismos de recompensa do futuro. É o bônus dado pelo rastreador de olhares do e-reader e o contador de passos para diminuir a mensalidade do plano de saúde. Essa é a estratégia definitiva para fazer de nós seres humanos melhores?
Schell – Definitiva é uma palavra forte demais. Mas, com certeza, essas recompensas são um bom caminho para o crescimento de cada um de nós.

ISTOÉ – Na sua visão, para que os games nos melhorem, é preciso que eles sejam criados de maneira correta. Quais as dicas para que os designers cheguem lá?
Schell – Primeiro, têm de querer muito fazer o seu trabalho. Sem isso, as coisas boas não irão acontecer. Segundo, é preciso usar truques para seduzir o jogador. Isso passa por descobrir maneiras de entretê-lo ao longo do caminho que o levará a uma melhora pessoal. Terceiro, o designer deve usar o poder das redes sociais, pois as pessoas mudam seu comportamento para melhor quando acreditam que estão sendo vistas por outras pessoas. Assim, é preciso criar situações nas quais os amigos que o jogador estima se sintam impelidos a vigiá-lo.

ISTOÉ – E o resultado disso?
É um ambiente para que o jogador vire uma pessoa melhor. E se orgulhe de exibir isso. No mundo real.