Parece a abertura de Harry & Sally – feitos um para o outro. O casal Smith, formado pelo sr. John (Brad Pitt) e pela sra. Jane (Angelina Jolie), está para lá de desconfortável diante do terapeuta matrimonial. O casamento dos dois é um tédio que dura “cinco anos”, afirma John. “Seis”, corrige Jane. Os dois são assassinos profissionais, como os personagens Jack Nicholson e Kathleen Turner em A honra do poderoso Prizzi. Mas um não sabe do outro, como na intriga vivida por Arnold Schwarzenegger e Jamie Lee Curtis em True lies. Jane relaxa escalando encostas do porte do Grand Canyon, como o agente criado por Tom Cruise em Missão impossível 2. John esfria a cabeça lutando boxe como em… tanto faz! Sr & sra Smith (Mr & Mrs Smith, Estados Unidos, 2005), que estréia mundialmente na quinta-feira 9, não é filme para cinéfilo. Porque, independentemente da trama, vai atrair multidões mais curiosas em desvendar em que cena ocorreu o clique definitivo entre Pitt e Angelina, protagonistas de um tórrido romance iniciado durante as filmagens. Como bem colocou a revista Time, todo mundo quer ver a fita, “menos Jennifer Aniston”, ex de Brad Pitt, rebaixada à condição de “friend” à sua revelia, graças aos lábios e aos olhares da filha de Jon Voight, La Jolie.

Angelina e Pitt não fazem por menos. São danças coladas de corar Uma Thurman e John Travolta, brigas violentas que se metamorfoseiam em cenas de enlouquecedora sensualidade. Dirigido por Doug Liman, Sr & sra Smith é, no entanto, um thriller dos melhores. Segundo as notas de produção, toda a sua estrutura foi apoiada nas cenas de ação. Para contrabalançar, a sensual Angela Basset e o hilariante Vince Vaughn encarnam assessores, respectivamente, da sra. e do sr. Smith, que se comportam à altura. Também pudera. Pitt já havia feito um excelente pas-de-deux com Julia Roberts em A mexicana. E Angelina está mais do que tarimbada em pancadaria depois dos dois filmes da série Lara Croft.

O roteiro de Simon Kinberg, trabalho de formatura, conta a história de dois assassinos contratados por agências rivais que se encontram em situação de desespero em Bogotá, Colômbia. Os dois têm a mesma idéia de manter a aparência através do casamento e durante algum tempo a enganação funciona. Jane diz que precisa ir a uma reunião à noite, mas na verdade elimina um figurão disfarçada de dominatrix. John sai bocejante para jogar pôquer em uma biboca qualquer e acaba fuzilando todos os participantes do jogo. Ao final da noite, os dois chegam com sua Mercedes e seu BMW e se recolhem como pombinhos, depois de discutir sobre cortinas ou algo menos excitante. A confusão surge quando ambos são contratados para eliminar uma mesma pessoa. Logicamente se trombam, se identificam e passam a guerrear. E o problema se agrava quando descobrem que eles próprios são alvos de terceiros. Excitação máxima. E combinando A guerra dos Roses, efeitos de Matrix e a paranóia de Bonnie & Clyde – uma rajada de balas, o filme caminha para um fim razoavelmente previsível.

Desconforto – Imprevisível mesmo foi ter dado certo. Pitt comprou o roteiro de Kinberg e contratou Liman em 2002. A idéia era que Nicole Kidman fosse a
estrela. Quando a ruiva australiana caiu fora, Catherine Zeta-Jones surgiu como opção, logo inviabializada porque sr. Pitt perdeu o interesse pelo projeto. Começou-se a falar, então, em Johnny Depp e em Will Smith para fazer o papel. Mas o nome Angelina Jolie fez com que Brad Pitt tivesse sua paixão pelo roteiro automaticamente reacesa. O curioso é que os dois não se conheciam. Portanto, o desconforto que eles demonstram na seqüência de abertura, quando encaram desajeitados a câmera-terapeuta, é autêntico. O que mais não seria? O diretor contratado Doug Liman teve de enfrentar vários contratempos, como mudanças de cenário, eliminação de personagens e refilmagens de cenas prontas. Mas manteve o pique que demonstrou em produções como Identidade Bourne, também dirigido por ele. Bem humorado, colocou Garota de Ipanema como música de elevador em uma cena. Em outra, um personagem usa uma camiseta do Clube da luta, filme
estrelado por Pitt, que, entre tapas e beijos com Angelina Jolie, acabou se saindo muito bem dentro e fora das telas.