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TESTE Um beijo, como este da cena do filme Modelos, entre Lee Bowman e Rita Hayworth, ajuda a saber se o toque dará prazer

Como descrever um legítimo ataque de paixão? Há quem sinta a mente embaralhada, a boca seca, palpitações e até uma estranha perda momentânea da coordenação motora. Na prática, render-se às emoções da paixão a ponto de protagonizar cenas ridículas, como a de ficar parado diante do amado sem concatenar uma única frase com começo, meio e fim, faz parte do anedotário de cada um de nós. A novidade é que, mais recentemente, a paixão virou tópico de grande interesse da neurociência, um ramo do estudo científico que se dedica a decifrar como o cérebro funciona. Os cientistas estão se esforçando para explicar, por exemplo, os processos que desencadeiam uma revolução bioquímica no organismo de homens e mulheres a partir de um simples olhar e quais as diferenças entre a paixão e o amor. O que se quer é entender por que amamos, como amamos e quais as repercussões que esse sentimento apresenta para a mente e o corpo.

Uma das primeiras respostas obtidas é a de que amamos para garantir a sobrevivência da nossa espécie. O que é surpreendente é a sofisticação da qual o corpo lança mão para que esse objetivo seja atingido. Uma das teorias mais fascinantes elaboradas sobre o assunto é a que afirma que os sentidos – visão, olfato, paladar, tato e audição – agem em conjunto para rastrear no alvo sinais químicos para selecionar se ele tem características compatíveis para garantir a diversidade necessária à continuidade do ser humano. “As pessoas sempre perguntam por que uma menina linda fica com o feioso em vez do bonitão. Eis aí uma pista sobre as escolhas”, explica Ricardo Monezi, professor de uma disciplina chamada fisiologia da afetividade, ministrada na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo.

O que o estudioso quer dizer é que muito antes de se encantar com um rosto bonito ou uma boa conversa, ele ou ela foram estimulados por outros fatores sem saber. O cheiro é um deles. Não se trata de ser atraído pelo perfume da moda, mas por um conjunto de moléculas exaladas pela pele chamadas feromônios. Essas substâncias despertam reações de atração ou de rejeição, dependendo de cada um. Ou seja, o mesmo cheiro funciona como um ímã para um e como um repelente para outro.

Não se sabe o que determina essas diferenças nas respostas ao mesmo estímulo, embora a ciência se empenhe em descobrir a resposta. Um dos investigadores desse mistério é o cientista Charles Wysocki, do Monell Chemical Senses Center, nos EUA. Em entrevista à ISTOÉ, ele disse acreditar na possibilidade de a aprendizagem ou as experiências de cada pessoa influenciarem a preferência de um odor corporal em relação a outro. “As expectativas de prazer ou aquelas mantidas em relação à reprodução também podem desempenhar um papel importante nesse processo”, disse o cientista. Há casos nos quais os feromônios provocam reações mais ou menos homogêneas. Foi o que revelou um trabalho publicado no ano passado, coordenado pela cientista Donatella Marazzitti, da Universidade de Pisa, na Itália. A pesquisa mostrou que a soma das gorjetas recebidas por dançarinas de strip-tease sofria uma generosa elevação no período da ovulação (quando um óvulo maduro sai do ovário e segue pelas trompas até o útero. Se não for fecundado nesse percurso, será eliminado na menstruação). A explicação é que provavelmente os feromônios exalados durante esses dias tornem os homens mais protetores e ciumentos.

Outra fonte de insumos para a paixão mais influente do que se imagina é a voz. O cientista Gordon Gallup, da Universidade de Albany, nos Estados Unidos, recentemente fez descobertas interessantes. Ele pediu a um grupo de voluntários para classificar como atraente ou pouco atraente mais de uma centena de vozes gravadas. As donas de vozes consideradas mais sedutoras eram mulheres que tinham cintura fina e quadris largos, justamente as formas associadas a um maior potencial de atração sexual. Além disso, as mais votadas estavam em plena fase ovulatória, o que leva a supor que há uma silenciosa conspiração do organismo feminino para atrair parceiros exatamente no período em que o corpo está pronto para conceber um filho. “O mero som de uma voz pode dar pistas sobre o potencial reprodutivo dessa pessoa”, disse Gallup à ISTOÉ. Mas isso ninguém consegue perceber no plano consciente.

A partir do momento em que a ligação se estabelece, o cérebro dos apaixonados inicia um processo desenhado para que a conexão se fortaleça. Diversas regiões são ativadas e substâncias liberadas (leia quadro). Depois, se tudo segue como mandam os genes – e o coração, obviamente –, os especialistas acreditam que após cerca de 18 a 30 meses, o corpo já não responde com tanta euforia às doses mais elevadas de serotonina que ocorrem durante a paixão.

Após esse período, tanto faz se a união está dando certo ou não, a serotonina volta aos níveis normais e não há mais alimento extra para os neurônios que se utilizam dela para fomentar a paixão. Outra possibilidade é o casal querer seguir em frente. Nesse caso, a serotonina é substituída pela dopamina, ligada a sensações de segurança e estabilidade. Além disso, outros hormônios começam a agir com mais intensidade e quantidade. No homem, um deles é a vasopressina, ligado à paternidade. Na mulher, sobe a ocitocina, associada ao relaxamento e à formação de vínculos. Tudo isso contribui para o surgimento de laços estáveis, favoráveis à criação de uma família. Se por algum motivo um desses mecanismos falhar, sempre há o alento de que uma nova paixão pode aparecer quando menos se espera.

 

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