Se os donos acabam se parecendo com seus cães, o dito popular não poderia ser mais verdadeiro quando aplicado ao pacato Juan Villegas (interpretando ele mesmo) e a seu cão dogo argentino Bombón Le Chien, retratados em O cachorro (El Perro, Argentina, 2004), em cartaz em São Paulo na sexta-feira 3. Como Bombón, rejeitado pela dona, uma simpática viúva do sem-fim da Patagônia, o mecânico Villegas acaba de ser demitido de um posto de gasolina e por pouco não é colocado na rua pela filha, mais preocupada em sua labuta na Argentina pós-bancarrota. Corretíssimo e quase tímido em sua humanidade, Villegas é, aliás, um homem de olhar canino, cujo corpanzil de índio se mostra incapaz de qualquer violência. Exatamente como Bombón, um macho pesadão e sem libido que prefere dormir a procriar-se, só mostrando os dentes quando alguma ameaça se insinua sobre seu dono.

Não pense, contudo, que o diretor argentino Carlos Sorin, de Histórias mínimas, tenha enveredado pela temática infantil. Embora o filme não seja impróprio para as crianças, a trajetória do desempregado Villegas está mais para os dramas do pós-guerra do italiano Vittorio De Sica, como Umberto D e Ladrões de bicicleta, que para qualquer pet-biografia. Com um sentido de economia, recurso sábio para evitar o sentimentalismo, Sorin esquadrinha a solidão de Villegas e de seu exemplar cão adotado. Como afirma um veterinário a certa altura: “Um cachorro de ótimo caráter.” O que dizer, então, de seu dono?


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