WELTON ARAÚJO/ AG. A TARDE

FONTE NOVA Pelo vão de 17 metros aberto na arquibancada caíram 50 pessoas – sete morreram –, no domingo 25.

Na quinta-feira 29, o ministro dos Esportes, Orlando Silva Jr., deixou seu gabinete de Brasília e voou para São Paulo para receber uma espécie de radiografia dos estádios brasileiros, organizada pelo Sindicato Nacional da Arquitetura e Engenharia (Sinaenco). O estudo, intitulado Estado de Manutenção e Condição dos Estádios Brasileiros, revela um quadro negro. “Nenhuma das 29 arenas visitadas em 18 cidades está 100% apta para receber um jogo de futebol”, afirma o arquiteto Eduardo de Castro Melo, vice-presidente de arquitetura do Sinaenco. Pior: em 80% delas, o maior problema é estrutural. Diz o relatório: “ (há) estruturas com prazo de validade vencido, que oferecem riscos até de desabamento. Armaduras expostas e corroídas, problemas de impermeabilização”, afirma o estudo concluído no início de novembro. Duas semanas depois, um problema do tipo – um bloco de cimento que se despregou de uma laje – ocasionou a morte de sete pessoas, que despencaram da arquibancada do estádio da Fonte Nova (BA) a uma altura de 20 metros, quando assistiam à partida entre Bahia e Vila Nova, no domingo 25. Detalhe: a Fonte Nova foi o pior estádio na lista do Sinaenco.

Com o estudo em mãos, o ministro tomou conhecimento de que, muito mais do que problemas de drenagem e imperfeições no gramado, há estádios que oferecem riscos aos atletas no momento de entrar em campo por conta de degraus fora de padrão, pisos escorregadios e tetos baixos. No estádio Olímpico, do Grêmio, por exemplo, há um tubo de irrigação com espinhos metálicos para conter torcedores – praticamente uma armadilha mortal. No Mineirão, o segundo pior da lista e que foi indicado para receber jogos da Copa em 2014, nenhuma das bacias sanitárias dos vestiários tinha assento – 95% deles têm banheiros em péssimo estado, concluíram os técnicos. “Em alguns casos (estádios), os cinegrafistas precisam ter habilidades circenses para instalar seus equipamentos: saltar muros, equilibrar-se sobre vigas”, diz um trecho do estudo. Outros dados: 90% dos estádios não são adaptados às necessidades de deficientes físicos, 85% não possuem vestiários decentes e 82% não têm acesso adequado aos torcedores.

O relatório do Sinaenco sinaliza que, mais do que se preocupar com o fato de que nenhum estádio brasileiro está apto para receber jogos da Copa, em 2014 – como outros países-sede do evento também não estiveram tanto tempo antes do pontapé inicial –, os palcos do esporte mais popular do País não oferecem a torcedores e profissionais que cobrem os jogos condições necessárias para abrigar uma partida de futebol hoje. “Temos de modernizar não só 12 estádios para a Copa, mas todos aqueles, pensando nos nossos torcedores”, disse o ministro Orlando Silva Jr. “Estou insatisfeito com a fiscalização do estatuto do torcedor.”

WELTON ARAÚJO/ AG. A TARDE

Contrariando o estatuto do torcedor, que proíbe bebidas alcoólicas no estádio, latas de cerveja espalhadas pelo chão

De fato, na tragédia da Fonte Nova era possível ver latas de cerveja ao lado do buraco da arquibancada, o que fere o estatuto, que proíbe a venda e o consumo de bebidas alcoólicas dentro dos estádios. Pior: era algo anunciado. Desde março de 2006, o Ministério Público da Bahia pedia a interdição do estádio em função das condições precárias atestadas por laudos do corpo de bombeiros e da vigilância sanitária. Até hoje a ação civil não foi a julgamento. O ministro dos Esportes – que soube do acidente pela irmã, que assistia ao jogo na Fonte Nova – quer criar uma área especializada para cuidar de futebol dentro do ministério para, entre outras tarefas, fiscalizar as condições das arenas. “Convoquei uma reunião com secretários estaduais de esporte para esta semana, em que vou alertá-los e discutir medidas para evitar fatos trágicos como o que vimos”, diz ele.

A Fonte Nova, que será demolida, não era candidata a receber jogos da Copa. Como ela, outros 17 estádios visitados pelos arquitetos da Sinaenco também estão fora dessa disputa. Todos eles, porém, foram reprovados a olho nu, uma vez que técnicos e arquitetos fizeram uma inspeção visual, sem colocar uma lupa nas feridas das arenas. Mesmo assim, José Roberto Bernasconi, presidente do Sinaenco, consegue enxergar o maior problema de todos: “É cultural. No Brasil, não se faz manutenção correta das coisas.”