A atenção dada à criança na primeira infância pode determinar o seu desenvolvimento por toda a vida. A crença nesta orientação, trazida pelos estudos científicos, e a necessidade dos pais de terem um local confiável para
deixar os filhos pequenos levaram as escolas a apostar tanto nas opções de estimulação que é possível ver crianças de dois a cinco anos arranhando um violino ou fazendo alpinismo. Sem contar as aulas de inglês, informática, caratê, judô, balé ou ginástica rítmica. Por trás de um bebê, há um exército de profissionais. Pedagogos, psicólogos, enfermeiros, berçaristas, piscomotricistas, músicos e professores de educação física.

É o que acontece na escola Mágico de Oz, do grupo Magno, da zona sul de São Paulo. “Despertamos o interesse, mas cada criança tem o seu momento e responde a sua maneira”, informa a pedagoga Cláudia Tricate, diretora da educação infantil. Na sala de estimulação, brinquedos multicoloridos, almofadas e bolas imensas treinam o equilíbrio e a habilidade motora dos bebês. Os exercícios são orientados por um psicomotricista. “Usamos até espaguete cozido para treinar o movimento de pinça dos dedinhos”, conta Silvana Antibas, supervisora do berçário. No pátio, numa parede de cerca de dois metros, os pequenos de quatro anos treinam alpinismo e melhoram a autonomia e o controle corporal, habilidades antes aprimoradas naturalmente ao subir em muros e árvores. “Eles aprendem a conhecer a sua força e a usá-la no tempo certo. Melhoram a noção espacial e ganham autoconfiança”, diz o professor Dimitri Wuo Pereira.

Zen – Na escola paulista Red Brick, o foco é o aprendizado de uma segunda língua. Há atividades de arte, canto, culinária e educação física. Todas feitas em inglês. Com as crianças de seis anos, a escola experimentou um tipo de estimulação zen, com exercícios de ioga. “Eles vinham agitados do recreio, então a professora começou a treinar concentração, relaxamento e conhecimento do corpo”, informa Gabriela Ferreira, proprietária da escola. Seus pequenos alunos também participam do Sábado Curioso, atividade em que pais e filhos visitam museus e exposições de arte, assessorados pela artista plástica Ana Teixeira. Ela guia o olhar deles com jogos e desafios. “Numa das visitas, Ana fez um quebra-cabeça com reprodução das telas. Eles tinham que achar o quadro original e depois montar a cópia. Foi divertido e eficiente”, explica Gabriela.

Essa tendência à superestimulação aconteceu após as descobertas científicas feitas a partir da década de 1990. Foi nesta época que os neurocientistas relataram o quanto é extraordinário o progresso do cérebro nos primeiros anos de vida. Seus estudos comprovaram que a um simples carinho da mãe milhares de neurônios se conectam no cérebro do bebê. Essas conexões, chamadas de sinapses, são as pontes entre os neurônios e permitem a troca de sinais entre eles. Se muitas delas forem criadas e fortalecidas por estímulos positivos no início da vida, a criança terá mais chances de ser um adulto saudável, com bom desempenho na escola, no trabalho e na vida afetiva.

Dentro dessa perspectiva, surgiu o conceito das janelas de oportunidade – fases propícias para o desenvolvimento de certas habilidades. O aprendizado de línguas e o contato com um instrumento musical, por exemplo, seriam interessantes até os dez anos de idade. Também na primeira infância criam-se os modelos para as relações sociais. Estes conceitos formam a base da programação de atividades da escola paulista AeD Aprendizagem e Desenvolvimento. Lá, crianças de três anos fazem aula de violino. “Só a herança genética não garante a capacidade intelectual de uma criança”, defende a superintendente Júlia Manglano. Os métodos utilizados são o americano Early Intervention Education e o espanhol Aprendizajes Tempranos. A estimulação é feita com exercícios, jogos pedagógicos, música e cartelas com figuras, quadros e palavras.

O professor Renato Zamora Flores, do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, faz pesquisas sobre genética comportamental e adverte, no entanto, que não há estudos que atestem categoricamente que a estimulação na infância produz adultos mais habilidosos. Ele exemplifica: “A exposição precoce a sons aumenta a área do córtex auditivo, o que dará à criança uma percepção musical maior, mas ela só vai aprender música se achar que isso é divertido e faz sentido em sua vida. Não adianta estudar piano se em casa não se valoriza música.” Ou seja, os estímulos precoces são bem-vindos quando feitos de maneira lúdica e sem cobranças. Afinal, estamos falando de crianças, para quem brincadeira é forma de entender o mundo.