Na semana que passou, o presidente Lula ensaiou as primeiras iniciativas na tentativa de amainar a crise política que se abateu sobre a base aliada do governo no Congresso. Na quarta-feira 18, em um café da manhã, Lula reuniu pela primeira vez, desde que tomou posse o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), integrantes da Mesa e os líderes de todos os partidos, inclusive os da oposição. O presidente desejava discutir uma agenda de trabalho positiva para acabar com a paralisia nas votações e apaziguar a Câmara. Bem-humorado como de costume, chegou a brincar com Severino: “Está ganhando todas, hein?” Mas o esforço pouco adiantou. Lula, que manteve o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, sentado a seu lado, foi obrigado a ouvir ataques da oposição à falta de articulação do governo. À tarde, PSDB e PFL, com a obsequiosa ajuda do PT e dos aliados, conseguiam reunir 267 assinaturas – 69 a mais que o necessário – para a criação da CPI dos Correios, que investigará as denúncias de corrupção e achaque na diretoria da empresa.

No domingo 22, Lula embarca para uma viagem à Coréia e ao Japão. Estará
ausente por uma semana, mas no Brasil a crise promete novos abalos. O
presidente do STF, Nelson Jobim, em um encontro com Lula na quinta-feira, avisou que o governo será mesmo derrotado na ação que quer obrigar as lideranças a indicar os integrantes da CPI dos Bingos, reabrindo o caso Waldomiro e os ataques ao ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Com a decisão do Banco Central de elevar pela nona vez consecutiva a taxa de juros básica, alçando-a a 19,75%, nível mais alto desde setembro de 2003, espera-se nova rodada de ataques à política econômica. Não apenas fora do governo, como de praxe, mas também dentro do PT, que inicia nesse final de semana o debate da sucessão da presidência e direções regionais do partido.

O processo de criação da CPI é um eloqüente exemplo da incrível desorganização do governo. A oposição anunciou a pretensão de reunir assinaturas para criar a comissão logo na segunda-feira 16, mas o governo só se mexeu dois dias depois. Foi surpreendido pela decisão do presidente do PTB e principal envolvido nas acusações, deputado Roberto Jefferson (RJ), de colocar seu próprio jamegão no papel, o que deixou muitos aliados à vontade para colaborar com a oposição. Quando finalmente resolveu agir, o governo descobriu, atarantado, que não controlava seu partido. Na Câmara, 18 petistas assinaram o pedido de CPI, mesmo contra a vontade do Planalto. Nada menos que 101 deputados e dez senadores da base aliada apoiaram a CPI. O presidente do PT, José Genoino, e o líder do governo, Arlindo Chinaglia (SP), tentaram dobrar os dissidentes. Até o tesoureiro do partido, Delúbio Soares, pouco visto nos corredores do Congresso, entrou na operação. Fracassaram. O governo sabe que dificilmente a CPI se restringirá às negociatas nos Correios. A oposição quer conduzir as investigações para outras estatais, como a Petrobras, Eletrobrás, Eletronorte e Infraero, tornando a vida de Lula um inferno.

Abafa – Arrombada a porteira, o governo pôs em marcha uma operação para impedir a instalação da comissão. Lula acenou com a nomeação de um indicado de Severino para um cargo graduado no Ministério das Minas e Energia. Horas depois, Severino anunciava que também pretendia desengavetar a CPI do Setor Elétrico, destinada a investigar as privatizações de FHC. O governo tenta, ainda, convencer parlamentares a recuar no apoio à investigação do caso dos Correios, mas a tarefa é quase impossível. Será preciso demover 70 deles. Na quinta-feira, apenas cinco concordaram em reconsiderar.

A intervenção de Lula na política não parece, até o momento, ter melhorado o cenário. Na mesma quarta-feira em que o presidente tentava buscar entendimento com os deputados, a base governista no Senado fazia uma lambança. Quebrando um acordo, provocou a rejeição do nome de Alexandre de Moraes, ex-secretário de Justiça de São Paulo, ligado ao PFL e indicado pela Câmara para integrar o Conselho Nacional de Justiça. A rejeição causou bate-boca e tumulto na sessão. Agora, a Câmara promete dar o troco vetando a indicação do senador Luiz Otávio (PMDB-PA), aprovado pelo Senado, para o TCU. Na véspera, o bate-boca foi entre o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), por conta da falta de interlocução do governo com o Congresso. A conversa de Lula, também na quarta-feira, com quatro governadores do PPS e PSDB interessados em aderir à base aliada, voltou a azedar o diálogo no Congresso, irritando a um só tempo tucanos, neocomunistas e peemedebistas. Os dois primeiros, porque perderão quadros e o último, porque não os receberá.

Ao contrário do que se negociava inicialmente, todos devem migrar para outras siglas da base aliada e o PMDB põe a culpa pelo prejuízo no governo. Petistas avaliam que a conversa foi inoportuna. Em outro erro estratégico convertido em derrota, o PT não quis negociar com os peemedebistas uma candidatura de consenso para o TCU na Câmara, mantendo na disputa o petista José Pimentel (CE). Conforme o previsto, Pimentel perdeu e Severino fez seu candidato. Como
se vê, em todas as confusões há o dedo do PT. Na semana que passou, a única coisa em que Lula e seu partido não tiveram culpa foi em relação ao MST. Na
terça-feira, reunidos em ato público na Esplanada dos Ministérios, os sem-terra entraram em conflito com a polícia. A pancadaria resultou em 32 manifestantes
e 18 policiais feridos.

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