Foi um dos mais decisivos movimentos na direção do planejamento familiar e, por que não dizer, dos direitos sociais da população: o governo anunciou na semana passada, de uma só leva, a redução de 90% no preço dos anticoncepcionais, o aumento da oferta gratuita de pílulas e preservativos nos postos de saúde e novos recursos financeiros para procedimentos de laqueadura e vasectomia na rede pública. Um pacote que chega em boa hora e beneficía milhares de cidadãos de baixa renda por todo o País. Não dá para esconder com a peneira o grande problema brasileiro do descontrole da natalidade nas camadas mais pobres – algo que vem ocorrendo em ritmo crescente, há décadas, seja por falta de informação, seja pelo não acesso aos métodos de controle disponíveis. A democratização dos meios de contracepção serve antes de tudo para diminuir a desigualdade social. Numa equação inversamente proporcional é justamente nas comunidades mais carentes que se encontram os maiores índices de fecundidade. O fosso entre os poucos bem-nascidos e a esmagadora maioria de pobres se amplia, trazendo consigo todo tipo de distorções – da falta de condições de educação às dificuldades de emprego e de tratamento de saúde, por exemplo. Na proposta levada a cabo pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, o objetivo não é incentivar o policiamento das gestações. Ela trata, fundamentalmente, de dar acesso igual aos recursos técnicos existentes para que cada um faça a sua escolha, de acordo com as necessidades e os projetos pessoais. Até aqui, comunidades humildes não tinham sequer a opção ou o conhecimento das alternativas. O passo importante de popularizar o controle da natalidade é dado logo em seguida a um outro candente e mais delicado debate, trazido à tona pelo mesmo Temporão: o da liberalização do aborto. A reação da Igreja e de setores mais conservadores levou o governo a arquivar a idéia de um plebiscito. Mas a questão persiste e deve, da mesma maneira, ser encarada e discutida sem preconceitos, à luz da situação vivida pelo País. Talvez, lá na frente, será possível uma solução para um quadro que todos sabem real, mas que muitos teimam em ignorar.