Michael Nagle/Getty Images

Escalada: a cidade ficou apavorada,
com medo de um novo ataque terrorista 

Na segunda-feira 8, Nova York fedia. Mais do que o normal. A ponto de sufocar a população acostumada aos odores punjentes que pairam constantemente nos ares. Era gás, com certeza. A primeira reação foi tapar o nariz, improvisando-se máscaras com cachecóis, mangas de casacos e o que se tinha em mãos. Depois veio a pergunta: “Quem foi?” Em seguida, as repostas usuais nestes casos: “Não fui eu!”, “Nem eu!”, “Não olhem para mim!” Todo mundo se fazendo de inocente, mas a realidade é que as narinas eram assaltadas por aquilo que parecia a mãe de todas as flatulências. Numa urbe traumatizada pelos ataques de 11 de setembro de 2001, logo surgiram as teorias sobre atentados. Mas quem teria reserva de gás tamanha? Só se fosse o boliviano Evo Morales, inimigo declarado dos ianques. O prefeito Michael Bloomberg reuniu apressadamente a imprensa para declarar que não se tratava de ação terrorista. “Ainda não sabemos o que ou quem causou este mau cheiro, mas posso garantir que a cidade não corre perigo.” O alcaide foi logo bombardeado com dúvidas. Afinal, não se sabiam origem nem natureza do fenômeno, como poderia se afirmar que não havia perigo? O fato é que os sensores de odores espalhados pela cidade – cuja prolífica existência foi uma surpresa para a maioria dos contribuintes – não identificaram presenças de substâncias nocivas. De todo modo, até o final do dia 19 pessoas haviam sido atentidas em pronto-socorros, vítimas do bodum. De Manhattan a Nova Jersey os olfatos padeciam.

Somente às três da tarde, a fedentina começaria a se dissipar. Dedos acusadores foram apontados para a companhia de gás “Con Edsion”, que se esquivou dizendo não ter constatado nenhum vazamento significativo em seus dutos de distribuição. Houve quem sugerisse no blog do New York Times que o presidente Bush ou o vice Dick Cheney estariam secretamente na cidade, o que teria provocado o mau cheiro. Outro internauta disse que os nova-iorquinos haviam aspirado e exalado coletivamente ao mesmo tempo, e estariam apenas sentindo os eflúvios do próprio mau hálito. Nada disso, claro, era convincente. Partiu-se então para o suspeito usual de todos os males na região: o Estado de Nova Jersey. Vieram, naturalmente, as negativas: “Daqui não saiu nenhum gás.”

Mas o sorriso amarelo – para não dizer a mão amarela – das autoridades jersianas serviu como prova de sua culpa. “O que deve ter acontecido foi uma combinação de fenômenos naturais”, explicou a ISTOÉ o climatologista Chris Cimino, da Rede NBC de televisão. “O tempo estava nublado. As nuvens pairavam bem baixo, numa altura de cerca de 250 metros. Criou-se deste modo um escudo que não deixava a poluição subir e ser dissipada pelos ventos mais acima”, diz. Quanto à origem do fedor, parece que Nova Jersey é mesmo culpada. “Há um enorme mangue na área entre Elizabeth e Jersey City. Trata-se de zona protegida pela Secretaria de Meio Ambiente federal. A lama, com este calor fora de época que está fazendo agora, passou a fermentar e expelir gases”, diz o ambientalista Arnold Platz, do Hudson Institute. Um dos gases é o T-butil mercaptan – também adicionado ao gás de cozinha, que é inodoro, exatamente para alertar as pessoas sobre vazamentos. O mangue jersiano teria soltado na atmosferta uma enorme quantidade desta substância, que ficou presa entre a terra e o céu, devido ao cobertor de cúmulo-nimbo. Outra alternativa é a de que o sistema de esgoto da própria cidade tenha fermentado e exalado o mesmo tipo de gás, que também está presente em material fecal ou no fato (o gás expelido pelo corpo). Mas acho esta uma hipótese menos provável”, disse Platz.

O mistério não foi totalmente desvendado e ainda preocupa alguns, principalmente porque em agosto do ano passado nove pessoas morreram na área do Queens depois de sentirem mau cheiro que se espalhou pela vizinhança. E em 28 de outubro os habitantes da parte sul de Manhattan foram envolvidos pelo aroma inconfundível de bolo assando no forno. Durante horas enfrentaram como puderam a vontade que deu de comer doces. De todo modo, na segunda-feira 15, lá pelas três da tarde, as nuvens foram para outras freguesias, o tempo abriu, e o mau cheiro passou como se alguém houvesse aberto janelas. A cidade, finalmente, pode respirar fundo e aliviada.

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