Na biblioteca da autora de novelas Ivani Ribeiro, a edição ilustrada dos famosos contos árabes ocupava lugar de honra. Professores de roteiro sempre apontaram as narrativas anônimas como sendo a segunda maior fonte de histórias depois da Bíblia. Alvo de mais de uma centena de edições no Brasil – desde a pioneira de 1882, prefaciada por Machado de Assis –, o Livro das mil e uma noites – volume 1 – ramo sírio (Editora Globo, 424 págs., R$ 55) sai pela primeira vez em tradução direta do árabe, assinada por Mamede Mustafá Jarouche, professor de literatura árabe da USP. A obra, a ser editada semestralmente em cinco volumes, ficou conhecida com esse nome a partir do século XIII e sua primeira tradução para o Ocidente só foi feita quatro séculos mais tarde, pelo francês Jean Galland.

A estrutura das Mil e uma noites é simples. Em tempos remotos, Shahrazad, a culta e inteligente filha de um vizir importante da Pérsia, casa-se com o rei Shahryar, que, após ter sido traído pela sua primeira esposa, passou a desposar uma mulher por dia mandando matá-las após a noite de núpcias. Para fugir à terrível sina, a bela jovem contava histórias para o monarca, interrompendo-as no momento mais forte para continuá-las no dia seguinte. Assim ludibriou o carrasco e ganhou o amor do rei. A suspensão da narrativa é uma técnica utilizada pelos folhetins, seriados e pelas novelas de hoje em dia. Uma forma de se prender o espectador ou, no caso, o leitor. Aparentemente o recurso nasceu aí.

Entre as histórias que se tornaram clássicas, não raro infanto-juvenis, estão Aladim e a lâmpada maravilhosa, Ali Babá e os 40 ladrões, Simbad, o marujo, além daquelas centradas na própria Shahrazad, que ficou mais conhecida como Sherazade. Segundo Jarouche, que cotejou diversas edições, manuscritos e fragmentos, existem duas vertentes principais desses escritos imemoriais. O citado ramo sírio ocupará os três primeiros volumes. Os restantes são formados pelos escritos do ramo egípcio (tardio). A diferença está no número de histórias, sempre girando em torno de 200, na forma como são estruturadas e o no número de noites, raramente alcançando 1001. E quem quiser que conte outras.