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O Ministério das Comunicações transferiu diretamente à estatal Telebrás a responsabilidade pelo acordo judicial que resultou no pagamento à vista de R$ 59,5 milhões, mais 40 parcelas de R$ 900 mil e cessão de créditos tributários equivalente a R$ 107,9 milhões ao empresário Uadji Menezes Moreira, da VT Um Produções e Empreendimentos Ltda. A ISTOÉ, o ministro Hélio Costa, amigo pessoal do empresário Moreira, afirmou: “Se havia um, dois, três recursos a serem feitos, que a Telebrás os fizesse. A empresa tem seu próprio departamento jurídico e poderia ter feito isso diretamente.” A declaração espelha o ambiente de desconforto entre o Ministério e a Telebrás – que, em última instância, é uma empresa subordinada à pasta de Hélio Costa – após a divulgação por ISTOÉ, na semana passada, do fechamento do acordo milionário. Interlocutores do ministro lembram que o presidente da estatal, Jorge da Motta e Silva, não é uma indicação pessoal de Costa, mas sim de seu antecessor, Eunício de Oliveira. No período em que Costa está no Ministério, desde julho de 2005, o presidente da Telebrás teve não mais do que dois despachos pessoais com o ministro. Na semana passada, ocorreu a terceira audiência, na qual Motta e Silva sofreu uma forte reprimenda. Os interlocutores do ministro garantem que Costa já tomou a decisão de exonerar o presidente da Telebrás. A demissão só não foi consumada porque a ala do PMDB que apoiava o ex-ministro Eunício dá sustentação política a ele.

O acordo entre a estatal e a VT Um foi assinado em 9 de junho deste ano, 11 dias depois de a 11ª Vara Cível de Brasília ter determinado à estatal o pagamento de R$ 506,2 milhões à empresa privada. A decisão foi motivada por um processo aberto por Uadji Moreira contra a estatal, em 1998, por quebra de contrato em torno da operação do sistema de ligações telefônicas tarifadas conhecido como 0900. Ele ganhou a causa em todas as instâncias judiciais até o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Mesmo assim, ainda havia a possibilidade de novos recursos após o último pronunciamento da Justiça. A disputa judicial e os meios de fazer a defesa da Telebrás, empresa de economia mista cujo maior acionista é a União, foram tratados em ofícios entre o presidente da Telebrás e o gabinete do ministro das Comunicações. Motta e Silva dirigiu-se a Costa e a seu chefe de Gabinete pedindo uma “solução institucional” para a questão, sugerindo a sua apreciação pela Advocacia Geral da União e, ainda, pelo Gabinete Civil da Presidência da República. “Se a AGU tivesse entrado no caso, a história seria outra”, disse o executivo a ISTOÉ antes da divulgação do acordo. Depois da chegada da revista às bancas, Motta foi chamado ao gabinete de Hélio Costa, onde encontrou um ministro furioso. Saiu de lá com um discurso diferente. “É um problema da Telebrás”, resumiu. A verdade é que o caso acendeu uma forte luz amarela dentro do governo e foi parar sobre a mesa do ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage. O advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro Costa, também destacou uma junta de advogados para averiguar todas as etapas do processo.

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A consultoria jurídica do Ministério das Comunicações alega que, durante a troca de correspondência oficial entre o órgão e a estatal, os advogados da Telebrás sustentaram que haviam esgotado todos os meios de evitar ou, ao menos, protelar a execução da última decisão judicial. Novos documentos obtidos por ISTOÉ, no entanto, mostram uma outra versão. Advogado contratado para defender a estatal, posição que ocupou até ser afastado do caso em 13 de julho, Sérgio Roncador apresentou cópias de mensagens eletrônicas enviadas a ele pela representante do departamento jurídico da Telebrás, Fátima Maria Cavaleiro. Um dos e-mails é datado do dia 13 de abril. Roncador lembra que, nessa data, o processo ainda não tinha chegado no fim da linha. Na mensagem, porém, Fátima pede para Roncador acompanhar a publicação da decisão judicial e “nada fazer sem a autorização da Telebrás”. A partir daí, obedecendo a orientação superior da empresa, Roncador parou de impetrar recursos. Na mesma mensagem, Fátima solicita ainda manifestação de Roncador sobre possibilidade ou não de recurso extraordinário. No dia 25 de abril, o advogado envia a resposta. Ele aponta os cuidados a serem tomados “caso entenda essa empresa pela interposição do RE (Recurso Extraordinário)”. No dia 2 de maio, Fátima encaminha nova mensagem a Roncador. “Tendo em vista a falta de requisitos específicos de admissibilidade”, diz ela, “a Telebrás não irá interpor recurso no processo” da VT Um. O acordo acabou fechado no dia 9 de junho, sem a participação de Roncador. “Cobrei várias vezes por telefone e ela falou que não era para recorrer”, afirma o advogado, que segue: “Não tem santo nesta história aí, não.”
ISTOÉ recebeu na semana passada uma carta em franca defesa da atuação do Ministério das Comunicações e da Telebrás durante o processo que resultou no acordo milionário. O autor, surpreendentemente, é o empresário Uadji Moreira. Ele discorre, no texto, sobre os esforços despendidos por Costa e sua equipe para conduzir corretamente a questão que, por fim, resultou num acordo que o fez receber de uma só vez um cheque de R$ 59,5 milhões, ter garantidas 40 mensalidades de R$ 900 mil, corrigidas pela Selic, e ainda ter direito a créditos tributários estimados em R$ 107,9 milhões. No conjunto, entre tantos elogios à postura do Ministério, ora Uadji Moreira passa a impressão de estar advogando contra os seus próprios interesses, ora mais parece o magistrado da questão. “A União não está obrigada a intervir em processos que a Telebrás funcione como parte”, registra o empresário. “Assim sendo, em momento algum houve qualquer ingerência do ministro das Comunicações no presente feito, já que juridicamente caberia apenas ao presidente da Telebrás decidir pela oportunidade e conveniência do acordo.” Em seguida, assinala: “O parecer do Ministério das Comunicações mencionado na reportagem não autoriza o acordo, mas apenas diz que caberia à Telebrás decidir pela realização da mencionada avença, salientando o interesse público no pagamento da quantia inferior ao efetivo débito”. Sabia-se que Moreira era amigo de Hélio Costa. O que não se conhecia era seu pendor para jurista.