chamada.jpg

Oficialmente, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), e a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), ainda não são candidatos a nada. Até que seus nomes estejam registrados no Tribunal Superior Eleitoral como cabeças de chapa das coligações que vão concorrer à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Serra e Dilma são apenas pré-candidatos. Na prática, no entanto, o governador e a ministra vêm seguindo um roteiro digno das semanas finais de uma eleição presidencial: onde há gente, câmeras e flashes, lá estão eles. Não importa se a obra ainda não está pronta, se a ponte existe apenas na maquete ou se os dois sisudos candidatos não têm lá um vasto histórico de foliões para, de repente, fazer um périplo pelos principais Carnavais do País. O que vale é aparecer.

img2.jpg
ALVO
Dilma e Lula não perdem uma oportunidade sequer de posar para as câmeras

Como em todo negócio, publicidade é a alma de uma campanha política. O problema é quando candidatos passam a utilizar recursos públicos a que têm acesso pelos cargos que ocupam para financiar a maratona de inaugurações, festejos e eventos de origem quase fictícia, e assim impulsionar suas campanhas. Nos últimos 30 dias Serra e Dilma têm seguido esse roteiro eleitoral bancado exclusivamente com dinheiro público. A ministra da Casa Civil, por exemplo, pulou Carnaval em Salvador e no Rio de Janeiro cruzou o País “inspecionando” obras do PAC e chegou a inaugurar um hospital que não contou com nenhum centavo de recursos federais. José Serra, por sua vez, foi ao distante Rio Grande do Sul prestigiar a Festa da Uva, inaugurou a maquete de uma ponte que não teve sequer o projeto aprovado e, por mais improvável que possa parecer, garante ter se divertido como nunca em meio à multidão de mais de um milhão de pessoas do Galo da Madrugada, o mais tradicional bloco do Carnaval do Recife.

img3.jpg
VIRTUAL
Para não perder a guerra midiática, Serra inaugura maquete de ponte

O problema na maior parte dos casos é que os dois se utilizaram da infraestrutura do poder público para cumprir a agenda eleitoral. Ambos deslocam-se Brasil afora a bordo dos aviões privativos a que têm direito. A tiracolo estão sempre com os assessores pagos pelo contribuinte e, não raro, utilizam as diárias de viagens para custear suas despesas quando longe dos gabinetes. Só nos dois primeiros meses deste ano Dilma recebeu mais de R$ 13 mil em diárias de viagem. Ao longo de todo o ano passado a ministra havia recebido cerca de R$ 25 mil, de acordo com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal, o Siafi, aos quais ISTOÉ teve acesso. Já os gastos de toda a Presidência da República com diárias totalizaram, em janeiro e fevereiro, R$ 1,2 milhão. No mesmo período em 2009, o governo havia gasto R$ 565 mil. Um crescimento de mais de 120%.

Serra pouco parou na capital paulista. Entre o dia 1º de fevereiro e 6 de março, o governador paulista visitou 20 cidades de quatro Estados, mais o Distrito Federal. Além de Brasília o governador esteve em mais de dez cidades do interior paulista inaugurando obras, foi ao Carnaval do Nordeste, visitou Belo Horizonte para afinar a sintonia com o mineiro Aécio Neves e, finalmente, esteve em território gaúcho para a Festa da Uva.

Serra desloca-se pelo País a bordo de um jatinho de oito lugares, um Hawker 800XP. Se fosse alugar esse avião para ir a Caxias do Sul, por exemplo, o comitê de campanha de Serra teria que desembolsar R$ 41,7 mil à empresa Líder Táxi Aéreo, representante da fabricante do avião no País. Dilma também cruzou o País com dinheiro dos eleitores. Segundo levantamento feito por ISTOÉ, desde fevereiro a ministra participou de 32 eventos públicos, entre os quais 19 inaugurações. Percorreu 18 trechos de avião. Visitou 8 Estados a bordo do Aerolula e aviões da FAB. Apesar das evidências gritantes, tanto ela quanto o governador paulista negam que estejam fazendo campanha. “Não acho que estou usando a máquina administrativa. Aliás, acho que é importantíssimo inaugurar obras. Ainda mais depois de tanto trabalho. Não é fácil tirar o País de uma situação de não investimento, que não tinha projeto nem obra”, disse na terça-feira 9 durante sessão solene do Congresso Nacional em homenagem ao Dia da Mulher. Serra nem admite que é candidato à Presidência da República.
Pela legislação eleitoral em vigor (Lei 9504/97), os candidatos só poderiam realizar comícios e eventos públicos com fins eleitorais a partir do dia 6 de junho. Oficialmente, é claro, os eventos são destinados à inauguração de obras e visitas a festas públicas. Na prática, no entanto, cada vez que Dilma e Serra sobem em um palanque estão, ainda que indiretamente, pedindo votos.

img1.jpg

A campanha antecipada com dinheiro público gerou reação de ambos os lados da trincheira. E o debate eleitoral se tornou tão rasteiro que os concorrentes ao Planalto passaram a travar, nos últimos dias, uma disputa retórica sobre quem inaugurou ou lançou projetos menos eleitoreiros. Na quarta-feira 10, o presidente Lula aproveitou a inauguração da termelétrica Euzébio Rocha, em Cubatão (SP), para mirar as baterias na direção de Serra. “Estamos num ano de campanha e percebemos que tem gente inaugurando até maquete”, ironizou. O líder do PSDB na Câmara, deputado João Almeida (BA), reagiu: “É muito estranho o presidente Lula falar uma coisa dessas. Justo ele que inaugura até ordem de serviço para licitação pelo País inteiro e com a ministra Dilma do lado.” No TSE, já são dez ações impetradas por PSDB, DEM e PPS, contra Dilma e Lula – cinco delas já foram julgadas improcedentes e as restantes ainda estão tramitando. Até a quinta-feira 11, o tribunal não havia registrado nenhuma interpelação do PT contra eventual campanha antecipada de Serra.

Por isso, nas duas trincheiras, ninguém dá sinal de que vai recuar. Para manter o nome da ministra em evidência, Lula irá lançar a segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento, o chamado PAC 2, no dia 29, cinco dias antes da data-limite para a saída de Dilma do cargo. Já Serra vai inaugurar o trecho sul do Rodoanel paulistano, que ainda não está completamente concluído, e as novas pistas da Marginal Tiête, na capital paulista, sem os viadutos previstos no projeto.

Como se vê, enquanto a Justiça Eleitoral continar a fazer vista grossa, as campanhas fora de hora com dinheiro público continuarão em ritmo acelerado Brasil afora.
Colaborou Fabiana Guedes

A estratégia tucana

O governador José Serra (PSDB) analisa diariamente uma pesquisa qualitativa para finalizar a estratégia de lançamento da sua campanha a presidente. Em uma reunião, na terça-feira 9, Serra informou a líderes do PSDB que só deixará o cargo no dia 2 de abril. Apesar disso, autorizou o partido a promover uma série de eventos que funcionariam como “pré-lançamentos” de sua candidatura. “Não temos o lançamento de um PAC 2. Então, faremos ações para mostrar a cara da oposição”, afirma o deputado Eduardo Gomes, presidente do PSDB no Tocantins. O primeiro evento será em São Paulo entre os dias 22 e 25 e poderá ocorrer nas pistas ainda inacabadas do eixo sul do Rodoanel. O PSDB pretende oficializar aquele que está mais cotado para ser o slogan da campanha: “Brasil pra frente, Serra presidente.” Na semana seguinte, outro evento em São Paulo deverá reunir prefeitos para a apresentação de Geraldo Alckmin como candidato ao governo paulista. As pesquisas em poder do PSDB apontam que dificilmente Alckmin deixará de se eleger no primeiro turno e Serra quer desde o início marcar a unidade entre as duas campanhas. Já fora do governo, Serra fará o lançamento oficial de sua candidatura em Brasília. A ideia é promover o maior número de eventos nacionais até o início da Copa do Mundo, com o objetivo de mostrar que a oposição está unida. Para isso, o PSDB aposta também nas convenções do DEM e do PPS. “Até agora a pré-candidata do governo fez campanha sozinha. Agora vamos entrar em campo”, afirma o presidente do PSDB, Sérgio Guerra.

As pesquisas analisadas por Serra indicam que para ter sucesso na eleição o PSDB precisa começar a disputa com cerca de seis milhões de votos a mais do que a candidata do PT. Para isso, planeja entrar, em abril, com quatro milhões de votos à frente de Dilma em São Paulo e 1,5 milhão em Minas Gerais. Os outros 500 mil seriam distribuídos pelo País. Essa preocupação foi colocada ao governador Aécio Neves (MG) pelo próprio Serra. Em resposta, Aécio tranquilizou o colega tucano. Para consolidar a diferença esperada em São Paulo, Alckmin foi escalado. O projeto é que nos próximos dias ele e Serra reforcem a agenda em cerca de 80 municípios onde o PSDB não foi bem em 2008. “O Alckmin tem muito prestígio no interior e poderá ajudar a consolidar a liderança de Serra no Estado”, avalia o presidente regional do PSDB, Mendes Thame. Municípios da Baixada Santista, da região metropolitana de Campinas e do Vale do Paraíba terão prioridade na agenda. Por isso, na última semana foi “inaugurada” a maquete de uma ponte em Santos e, na segunda-feira 8, houve um desvio de rota de Tremembé, onde foi inaugurada obra de saneamento, para Taubaté apenas para que Serra tomasse chocolate quente em uma popular padaria da cidade.