Jô Soares de fardão? “Está maluco?”, responde o simpático one man show para ISTOÉ, aboletado em frente ao computador de tela plana de seu escritório de 600 m2 no bairro de Higienópolis, São Paulo. “Não tem ninguém me ameaçando com essa homenagem”, garante. Por enquanto a farda de camurça verde com os galardões dourados limita-se ao projeto gráfico criado por Hélio de Almeida para “vestir” Assassinatos na Academia Brasileira de Letras (Companhia das Letras, 256 págs., R$ 35), o novo livro de Jô, que chega às livrarias com uma tiragem de 100 mil exemplares. Coisa de Paulo Coelho.

A exemplo de O xangô de Baker street e O homem que matou Getúlio Vargas, trata-se de um thriller histórico, com pitadas de fantástico, muito humor e sensualidade. Uma fórmula “jô-cosa”, que não foi batizada até o momento – nem os redatores dos jornais americanos The New York Times e The Washington Post chegaram a uma conclusão, apesar de cobrirem autor e livros de elogios. O fato é que Jô foi pego de surpresa, deixando de lado a idéia de escrever algo sobre futebol, os anos 60, ou quem sabe um romance de mistério passado na Roma Antiga. No ano passado, enquanto voltava da gravação de seu programa, ele leu no jornal o caso de um envenenamento coletivo. Aquilo o deixou perturbado. Imaginou uma situação semelhante em algum lugar notável. O que pode ser mais notável do que uma reunião de imortais?

Jô situou sua história no Rio de Janeiro de 1924, sob o governo Arthur Bernardes. “Um injustiçado que governou 95% do tempo sob estado de sítio devido à insatisfação dos militares, mais ou menos como Lula hoje em dia”, brinca o apresentador. Depois de trocar o assassinato em massa por serial, o humorista decidiu contar a história à maneira de Julio Cortázar ou de Chico Buarque, partindo de um livro para chegar em outro. Cita fatos como a ereção do Cristo Redentor (a estátua), a inauguração do Copacabana Palace e a efervescência do Café Lamas – lugares freqüentados pelos pais do escritor, que chegou a morar no anexo do Copa. De resto, puro Jô Soares. Do desfile de tipos como Belizário Bezerra, “o Rodolfo Valentino da Zona da Mata”, Aloysio Varejeira, “o Vavá boca de esgoto”, e Camilo Rapozo, “o gnomo da tesoura”, às mulheres deslumbrantes do quilate da sedutora Monique, a adúltera Manuela e a “inocente” Galatea, sempre a bordo de carros luxuosíssimos tipo Hispano-Suiza, Panhard & Levassor, Delage G.L., Bugatti-Royale ou um prosaico Rolls-Royce Silver Ghost. Nos livros de Jô Soares, tudo é superlativo. Até farda vira fardão.