A identificação do personagem histórico Adolf Hitler com o mal absoluto é tão abrangente que qualquer possibilidade de tornar humana sua figura é imediatamente recebida como uma afronta passível de punições. Caso de A queda! As últimas horas de Hitler (Der untergang – Hitler und das ende des III Reichs, Alemanha/Itália/Áustria, 2004), que estréia nacionalmente na sexta-feira 6. Trata-se da reconstituição do ocaso da Alemanha em 1945, visto a partir do bunker onde Hitler (Bruno Ganz) se suicidou com a esposa, Eva Braun (Juliane Köhler).

Para o espectador comum, o fato de Hitler gostar de crianças, apreciar chocolate ou ser um galanteador pródigo em olhares é o que menos choca no filme de Oliver Hirschbiegel, inspirado nos livros do historiador Joachim Fest e da secretária particular do führer, Traudl Junge (Alexandra Maria Lara). O horror está na maneira como o ditador fascina homens e mulheres que se curvavam diante dele, um ser histérico, com as mãos trêmulas devido ao mal de Parkinson, classificado pela jovem esposa como “monótono, vegetariano e apaixonado por cachorros”. Depois de vê-la tresloucada, com uma taça de champanhe nas mãos, querendo dançar um “swing” enquanto o ministro da Propaganda, Joseph Goebells (Ulrich Matthes), mata a mulher e se suicida após envenenar os seis filhos, é como assistir a um pesadelo. Ganz, elogiado pelo próprio Fest, domina o filme. Ele faz questão de tornar Hitler uma figura banal. Só assim, despido dos clichês demoníacos, se pode entender a histeria coletiva que levou multidões a elegê-lo – e adorá-lo.


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