Como as cinco pontas de sua estrela-símbolo, o PT se agita em torno de cinco candidatos que se preparam para a eleição nacional que vai escolher seu novo presidente. Contra José Genoino, candidato à reeleição, mobilizam-se quatro nomes à esquerda, que coincidem na crítica ao governo e no bombardeio à política econômica de Palocci e cia. A eleição levará 830 mil filiados às urnas no dia 18 de setembro. Eles votarão diretamente nos novos dirigentes. Mas a proliferação de candidatos, embora vista como coisa natural no PT, assusta o Planalto. A hipótese de um segundo turno, se ninguém garantir a metade mais um dos votos, pode complicar a reeleição de Genoino e tornar ainda mais turbulenta a convivência do governo com um PT cada vez mais inquieto. Tanto que o próprio Lula disse a aliados, em Belém, na quinta-feira 28, que está pensando em antecipar em três meses a eleição, passando-a para junho. A precipitação do presidente – que enfrentou uma semana de turbulências devido às fortes críticas à política econômica de seu governo, mas passou no teste da primeira entrevista coletiva realizada na sexta-feira 29 – pode aumentar o tiroteio interno e as rachaduras no partido. Na eleição de 2001, o Campo Majoritário, grupo moderado que abriga os ministros Palocci, José Dirceu e as principais estrelas petistas, incluindo Lula, somou 51%. A esquerda, de onde nascem as candidaturas de Valter Pomar (Articulação de Esquerda), Raul Pont (DS) e Plínio de Arruda Sampaio (Ação Popular Socialista), obteve 36%. O centro, de Maria do Rosário (Movimento PT), teve 13%. Somados, teriam 49% dos votos, que podem ganhar a perigosa e decisiva adesão dos dissidentes, cada vez mais numerosos.

Maria do Rosário “Este BC já tem autonomia demais”

Deputada federal mais votada do Rio Grande do Sul, a pedagoga Maria do Rosário Nunes, 38 anos, foi aclamada por 300 delegados do Movimento PT.

ISTOÉ – Sua candidatura revela a divisão atual do PT?
Maria do Rosário
– Ao contrário. Meu nome não é contra José Genoino. Eu me apresento para o debate político. A pluralidade de idéias compõe a própria história do partido e o fortalece.

ISTOÉ – E o que a incomoda na condução do PT?
Rosário
– Devemos ser um partido de governo e que dialoga com os movimentos sociais. O PT deve ser o principal partido de sustentação do governo. Mas o governo tem condicionantes, por causa das alianças, que o partido não tem.

ISTOÉ – O PT traiu antigos ideais?
Rosário
– Nós compreendemos as ações neste primeiro período, mas defendemos que é preciso uma transição. E isso significa ir mais para a esquerda.

ISTOÉ – A economia a desagrada?
Rosário
– Há conquistas importantes, mas é preciso investir mais em infra-estrutura e nas políticas sociais. Isso passa pela redução do superávit primário, que representaria mais recursos.

ISTOÉ – É uma crítica a Palocci?
Rosário
– Somos críticos. Alguns setores do partido acham que, para criticar, é preciso se aliar à oposição. Nós não pensamos assim.

ISTOÉ – Vocês acham que Palocci é um clone de Pedro Malan?
Rosário
– Claro que não. Mas é possível avançar. O Copom, por exemplo, deve ter representantes do setor produtivo, trabalhadores, empresários. E não se deve mais falar em autonomia do Banco Central. Este BC já tem autonomia demais.

José Genoino “Não existe eleição ganha”
O ex- deputado José Genoino completa 59 anos na terça-feira 3, preparado para enfrentar uma dura batalha interna pela reeleição.

O ex- deputado José Genoino completa 59 anos na terça-feira 3, preparado para enfrentar uma dura batalha interna pela reeleição.

ISTOÉ – Dá para ganhar contra quatro candidatos?
José Genoino
– Não existe eleição ganha. Vamos fazer dela um momento de diálogo do PT com a sociedade.

ISTOÉ – A existência de cinco candidaturas não mostra um PT dividido?
Genoino
– Em 2001 foram seis candidatos. É normal num partido democrático.

ISTOÉ – Todos os seus adversários criticam a política econômica.
Genoino
– Se considerarmos a situação em que recebemos o País, a política econômica só registra avanços, com crescimento, geração de empregos, a não-renovação do acordo com o FMI… Os juros estão altos, mas temos que trabalhar de maneira responsável e consistente para diminuir a taxa.

ISTOÉ – É mais fácil derrotar uma esquerda dividida?
Genoino
– Ter diferentes correntes disputando é um compromisso do PT. Somos o único partido do mundo com eleição direta para seus dirigentes.

ISTOÉ – As críticas da esquerda não insinuam a idéia de que o PT está submisso ao Planalto?
Genoino
– Pelo contrário. O PT realizou a experiência de ser o partido do
governo e, ao mesmo tempo, saber negociar e até fazer mudanças de
decisões do próprio governo.

ISTOÉ – Um exemplo em que o PT dobrou o Planalto.
Genoino
– Na reforma da Previdência, no aumento de 50% do salário mínimo, na reforma agrária, na questão dos transgênicos…

Raul Pont “É preciso ter um pé na decisão popular”
Ex-prefeito de Porto Alegre, o deputado estadual Raul Pont, 58 anos, concorre pela Democracia Socialista,
uma das principais tendências da esquerda petista.

ISTOÉ – Por que mudar a direção?
Raul Pont
– O partido dá apoio ao governo, mas tem que manter a autonomia. Seu programa defende os sindicatos e os movimentos sociais e eles nem sempre se expressam no governo.

ISTOÉ – O PT virou correia de transmissão do Planalto?
Pont –
Sim. O diretório se reúne, diz que estamos numa transição, que temos que defender o governo, vota e a maioria diz que está tudo bem, mesmo quando se sabe que na base do partido há uma oposição grande.

ISTOÉ – Qual a principal crítica ao governo?
Pont
– A subordinação à política de juros elevados. Além disso, não
podemos governar sem participação popular. Ou ficaremos reféns do
Congresso. Nenhum projeto inteiro do governo chegou lá e foi aprovado.
Uma política voltada só para conseguir a maioria está errada. O PT tem
que ter um pé apoiado na decisão popular.

ISTOÉ – Mas o PT, no governo, não precisa de alianças?
Pont
– Não. Eu fui prefeito e nunca tive maioria. E isso não impediu que fizesse o maior investimento em obras e serviços da história de Porto Alegre.

ISTOÉ – Mas o sr. perdeu a eleição…
Pont
– Não por isso. Perdemos por erros de campanha, pelas reformas no Congresso, pela renúncia do Tarso Genro…

ISTOÉ – Lula pode perder a reeleição?
Pont
– Se continuarmos desvinculados dos movimentos sindicais e sociais, as pessoas podem não acreditar na gente.

Plínio de Arruda Sampaio “Tem que substituir Palocci e equipe”

Autor da tese que serviu de base para o estatuto de fundação do PT, em 1980, o professor e ex-deputado constituinte Plínio de Arruda Sampaio, 74 anos, está sendo cogitado pela tendência Ação Popular Socialista para enfrentar Genoino

ISTOÉ – O PT virou um partido de cúpula?
Plínio de Arruda
– Virou uma máquina eleitoral.

ISTOÉ – Ficou igual aos outros?
Plínio
– Não, isso também não. Mas, se não tomar cuidado, vai ficar.

ISTOÉ – Neste desvio de conduta, o PT perdeu o quê?
Plínio
– Virou um partido eleitoral, e não era para ser apenas isso. Era para disputar eleições com um pé na institucionalidade e outro na organização popular.

ISTOÉ – O que falta fazer?
Plínio
– A reforma agrária e a parte dos gastos sociais. E a política econômica precisa mudar. Uma coisa é a estabilidade, outra é a política que enriquece os bancos. Os juros altos são parte do quadro.

ISTOÉ – Pode-se mudar com esta equipe econômica?
Plínio
– Não, tem que substituir. Temos um monte de gente competente para
o lugar de Palocci.

ISTOÉ – A atual direção do PT é submissa ao Planalto?
Plínio
– Virou uma correia de transmissão, não está certo. O partido tem que apoiar o governo, mas ele tem um programa que transcende os quatro anos. O governo é refém deste mercado. É preciso dar ao Lula a certeza de que, se ele enfrentar este mercado, terá um partido capaz de mobilizar o povo.

ISTOÉ – Esta visão não é um tanto romântica?
Plínio
– Sem romantismo, o que se faz? Deve-se enfrentar. O PT era o partido da mudança. Virou um partido da ordem.

Valter Pomar “O Planalto pode se surpreender”

Neto do mentor da guerrilha do Araguaia, Pedro Pomar, morto pela repressão no massacre da Lapa, em 1975, Valter Pomar, 34 anos, quer subir na hierarquia do PT: trocar a atual terceira vice-presidência nacional pelo cargo máximo do partido, hoje ocupado pelo ex-guerrilheiro Genoino.

ISTOÉ – Por que não reeleger Genoino?
Valter Pomar
– Precisamos mudar a política econômica.

ISTOÉ – A política do Palocci é como a do Malan?
Pomar
– Não. Há muita diferença nas privatizações, no fortalecimento do Estado, na importância dos gastos sociais. Mas no aspecto monetário não conseguimos superar a anterior.

ISTOÉ – Que mudanças sugere?
Pomar
– Baixar a taxa de juros, reduzir o superávit primário para ampliar os investimentos sociais e de infra-estrutura e medidas de proteção do espaço econômico-social.

ISTOÉ – Há um ponto em comum na esquerda?
Pomar
– A crítica à política econômica e a defesa da autonomia do PT diante do governo. Governo tem limites, e o partido pode ir além.

ISTOÉ – Um exemplo.
Pomar
– O Bush vem ao Brasil. Lula deve recebê-lo com dignidade, segurança e cortesia. E o PT, com mobilização de rua contra o imperialismo americano.

ISTOÉ – Isso não é contraditório?
Pomar
– Contraditória é a realidade. Se o partido limitar sua atuação ao que o governo pode fazer, para que partido?

ISTOÉ – O Planalto acredita na vitória de Genoino.
Pomar
– Acho que eles vão ter uma surpresa. Acredito que Lula possa votar num candidato que, como ele, esteja insatisfeito com a alta dos juros.