04/03/2010 - 16:54
Timerman afirma que a Embaixada brasileira negou suporte a ele e a outros médicos, e que a TAM também se omitiu.
Leia abaixo a íntegra do seu depoimento:
“Cheguei a Santiago na sexta-feira, 26, para participar, no sábado, 27, de um seminário sobre novos medicamentos para casos graves da gripe H1N1. Iria embora à noite. De madrugada, por volta das 3 horas da manhã, acordei com a cama e o quarto sacudindo. Tentei me levantar, mas não consegui. Olhei para o céu e vi que estava vermelho, por causa da explosão de uma usina próxima ao hotel. Pensei que o mundo ia acabar. Assim que deu, corri para a rua levando apenas o passaporte, mas vi muita gente descendo as escadas com malas. Só pude voltar ao hotel ao meio dia de sábado. Felizmente, o prédio do Hyatt não caiu e pudemos ficar lá.
Ainda na manhã de sábado, começou a maratona atrás de informações junto à Embaixada Brasileira. No mesmo dia, por volta das cinco da tarde, duas pessoas do nosso grupo foram à Embaixada com outros médicos para levar os nossos nomes e número de documentos. Não nos deixaram entrar. Fomos atendidos na calçada. Depois continuei telefonando e falei várias vezes com a funcionária Ana Patrícia Cruz. Ela dava apenas as notícias que estavam saindo nos jornais e repetia que não havia vôos para o Brasil.
Fiquei chocado ao perceber que havia favorecimentos no embarque de volta para o Brasil. Uma enfermeira de Brasília, chamada Petra, conseguiu voltar no sábado mesmo, às 23 horas, em um avião que a FAB negou ter decolado. Ela estava em boas condições de saúde e, nesse caso, a prioridade deveria ter sido dada à mãe de um bebê de cinco meses, cujo filho estava no Brasil e precisava ser amamentado. Soubemos depois que a enfermeira conhecia alguém da FAB.
Na segunda, liguei novamente para a Embaixada e fui atendido por Ana Nogueira. Soube que 30 brasileiros que estavam em um congresso literário haviam voltado. Para nós, porém, não foi dada nenhuma previsão de data de saída do Chile. Deixei claro que eu não queria privilégios. Queria orientações e previsão de embarque. À tarde, quando liguei novamente para buscar notícias, só uma secretaria eletrônica.
Na noite de segunda, dois aviões da presidência e um da FAB decolaram para o Brasil. Um deles levava seis pessoas indicadas pela Embaixada, como nos disse posteriormente a Embaixatriz, e outras 24 foram indicadas pelo Presidente da República. Vimos que muitos desses passageiros eram mulheres jovens, com ótima saúde. No entanto, havia pessoas precisando de atendimento. Tanto que na noite de terça fomos chamados pelo corpo diplomático para atendê-los na Embaixada.
Na terça, 2, nosso grupo ainda não tinha conseguido uma indicação dos critérios ou previsão de partida. Vimos então como estávamos desassistidos e abandonados pela Embaixada e também pela TAM. Nós queríamos entender os critérios da Embaixada, da FAB e da TAM para retirar as pessoas do Chile. Vivemos um absurdo. Em nome do meu grupo, telefonei muitas vezes para a TAM e falei com dois diretores. Um deles, Alexandre Moraes, disse-me que estava em reuniões e nos orientou a ficar em Santiago. A partir de segunda, 2, ele também não atendeu mais o telefone.
Terça pela manhã falei com mais uma funcionária da Embaixada, Letícia. Perguntei os critérios utilizados para embarcar as pessoas de volta e ela me disse que não tinha que me dar satisfação. Por tudo isso, decidimos sair de Santiago por nossos meios. Não estávamos mais agüentando a tensão emocional da espera e da falta de informações. Compramos passagens de ônibus para a quarta, 3, para ir a Mendoza, na Argentina, de onde partiríamos para Buenos Aires em aviões da Aerolineas Argentinas e de lá para o Brasil.
Na noite de terça, soube por amigos brasileiros que haveria vôos da TAM naquela noite e na quarta. Por volta da uma hora, depois de atendermos pessoas na Embaixada, seguimos em direção ao aeroporto. Passamos a noite em barracas no estacionamento esperando a decolagem. Parecia um acampamento de guerra. Primeiro, a TAM conseguiu três vagas, mas não quisemos embarcar se não houvesse lugar para os nove profissionais da saúde que compunham o grupo. Depois de idas e vindas, os nove lugares apareceram.
Cheguei ao meio dia da quarta 3 em São Paulo. Gastei mais de cinco mil dólares em passagens que não usamos e cerca de R$ 15 mil reais de celular para conseguir sair do País. Mas o pior de tudo foi a agonia causada pela falta de informações e de apoio tanto da Embaixada brasileira quanto da TAM. A atitude das autoridades brasileiras durante a catástrofe no Chile para conosco foi vergonhosa. Eu estou exausto e indignado. Não é verdade o que o ministro Marco Aurélio Garcia disse: que a embaixada estava dando suporte aos brasileiros. Isso é mentira. Nós fomos abandonados pelas autoridades brasileiras, pela empresa americana que nos levou para a reunião científica e também pela TAM. Conseguimos chegar, mas, além do terremoto, vivemos todo tipo de tensão por causa do descaso de quem deveria nos ajudar”.