i65589.jpgUm relatório confidencial guardado no Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), em Brasília, mostra as conclusões finais da investigação sobre o maior acidente aéreo do Brasil. Mantido sob segredo de Justiça, o documento número 2007.61.81.008823-6 aponta as causas que provocaram a tragédia do vôo 3054, da TAM, em 17 de julho de 2007. Naquele final de tarde chuvoso, 199 pessoas morreram depois que o Airbus A-320 não conseguiu frear na pista 17R/35L do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, e explodiu após colidir contra um prédio da própria companhia. As investigações conduzidas por técnicos do Instituto Nacional de Criminalística, às quais ISTOÉ teve acesso, desmentem o que nos últimos 14 meses foi apontado por especialistas como uma das principais causas do acidente. "A pista molhada e sem grooving (ranhuras no asfalto que ajudam o escoamento da água) não teve peso decisivo no acidente", registra o relatório. "Mesmo que houvesse mais 250 metros de pista, não pouparia a tragédia."

Segundo o relatório, o Airbus tocou o solo com uma velocidade de 270 km/h e atravessou os 1.940 metros de asfalto molhado a 240 km/h.

Não houve derrapagem ou aquaplanagem. "Houve uma resposta inesperada do sistema automático de frenagem da aeronave nos momentos iniciais em solo, o que aconteceu por conseqüência da não abertura dos spoilers durante o pouso", diz o documento do Cenipa.

"Pode-se afirmar que o não funcionamento dos spoilers e problemas no autobreck (freio automático), certamente, estiveram entre os fatores determinantes que inibiram a desaceleração da aeronave." O documento, no entanto, não é conclusivo quando analisa as causas do não funcionamento dos sistemas de frenagem do avião. Esses sistemas podem ter falhado por razões mecânicas e/ou eletrônicas ou por erro humano. Para saber exatamente como se comportaram os pilotos do avião, os técnicos precisam comparar os dados digitais, armazenados no computador de bordo, com o posicionamento físico das manetes, operadas manualmente pelos pilotos para determinar a frenagem ou a aceleração da aeronave.

Os dados digitais apontam que o motor do lado direito do avião estava acelerado em potência máxima, enquanto o esquerdo estava em reverso. O problema é que essas informações só podem ser dadas como absolutamente verdadeiras caso a posição das manetes as confirmem.

No caso do vôo 3054, os especialistas submeteram o que sobrou dos comandos de cabine a laboratórios franceses, onde foram feitos mais de 200 testes de ressonância magnética. O objetivo era saber a exata posição das manetes. Mas isso foi impossível de determinar. Os comandos ficaram expostos a uma temperatura superior a 2000 graus centígrados e chegaram aos laboratórios completamente derretidos.

Apesar do relatório do Cenipa, a tragédia do vôo 3054 está longe de ser encerrada. Ainda em outubro, o delegado Antônio Carlos Barbosa, que conduz em São Paulo um inquérito policial sobre o caso, encaminhará ao Ministério Público o resultado de suas investigações. "Vou apontar de sete a dez pessoas como responsáveis por homicídio culposo (sem intenção de matar)", diz Barbosa, sem antecipar os nomes. Ele avalia que tanto o governo federal como as empresas envolvidas pode riam ter evitado o desastre. Barbosa sustenta que em dezembro de 2006, sete meses antes do acidente, em uma reunião na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a Infraero e as maiores companhias aéreas brasileiras, entre elas a TAM, foram informadas sobre o risco de se pousar em Congonhas em dias de chuva com aeronaves com o reverso travado.

Na reunião, segundo ata obtida por ISTOÉ, ficou acertado entre as empresas e os organismos que gerenciam a aviação comercial no Brasil que não seriam usados aviões com quaisquer limitação no sistema de freios no aeroporto de Congonhas em dias de chuva. Nas cinco folhas da ata, os representantes das companhias aéreas assumem o compromisso de distribuir a orientação para todos os seus pilotos. O Airbus da TAM que fazia o vôo 3054 pousou com o reverso pinado. O delegado agora questiona de quem é a responsabilidade pelo fato de não ter sido praticado o que fora pactuado na reunião. Ele também questiona o fato de os gerentes da Anac não terem transformado em regra ou em norma aquilo que fora acertado na reunião. Na tarde da quinta-feira 24, a assessoria da TAM informou que a empresa "não vai comentar investigações ainda em andamento".