i88015.jpg

Habituada a pedalar por São Paulo, a massagista Márcia Prado, 40 anos, usava a bicicleta até para viajar. Na quartafeira 14, ela pedalava na avenida Paulista, quando um ônibus tentou ultrapassá-la e a atropelou. Márcia não resistiu aos ferimentos e morreu no local. Na véspera do acidente, falou à ISTOÉ sobre a experiência de usar este meio de transporte na capital paulista (leia entrevista abaixo). Cicloativista, ela participava da Bicicletada, movimento inspirado na Critical Mass, de São Francisco (EUA), que reúne cerca de 300 participantes pelas ruas da cidade. O número de pessoas que se dispõem a adotar a bicicleta tem aumentado bastante. Mas São Paulo não está preparada para recebê-los com segurança.

Preocupação com os ônibus na última entrevista

Márcia Prado participava da Bicicletada, movimento ativista que busca dar visibilidade aos ciclistas no trânsito. No ano passado, ela assinou o “Manifesto dos Invisíveis”, em que os ciclistas pedem mais respeito. Atropelada por um ônibus na quarta-feira 14, na avenida Paulista, a ciclista não resistiu. Na véspera do acidente, Márcia falou com a ISTOÉ sobre sua rotina, em que a bike fazia parte de tudo.

Como mudou o trânsito em comparação com o de 20 anos atrás?
Os motoristas estão muito mais agressivos. Antes o cuidado com o ciclista era maior. A frustração das pessoas é descontada na bicicleta, mas felizmente é uma minoria que faz isso. O problema são os motoristas profissionais, principalmente os de ônibus e os motoboys.

O que faz você escolher a bicicleta, tendo opção de andar de moto?
Acho que a principal vantagem é reconhecer a cidade onde você mora, voltar a ter contato com ela.
Você se aproxima da arquitetura, das flores, percebe os perfumes das ruas. Você perde peso, fica com uma saúde melhor. Reduzi um número no manequim pedalando.

São Paulo não intimida, com as ladeiras e avenidas movimentadas?
No começo algumas ladeiras intimidam. Tive de empurrar a bike por um mês. Mas depois que você pega o ritmo, elas ficam “menores”. E sempre há caminhos alternativos. As pessoas dizem “aqui não é Paris”, mas quem diz que a cidade não é amigável é o motorista, que não quer se expor.

 /wp-content/uploads/istoeimagens/imagens/mi_1708248357052921.jpg

Estima-se que sejam 250 mil ciclistas em São Paulo, de acordo com o último dado divulgado pela prefeitura, de 2006. No Brasil, são 24 milhões, segundo a Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Bicicletas e Similares. Na capital paulista, o metrô criou no ano passado bicicletários e pontos de aluguel em algumas estações. Com mais bicicletas nas ruas, surge a necessidade de adaptar a estrutura viária para elas. Um dos sinais do trabalho que há pela frente é a extensão de ciclovias: em São Paulo, são 29,5 quilômetros, quase nada perto dos 300 quilômetros de Botogá ou dos 675 quilômetros de Nova York.

/wp-content/uploads/istoeimagens/imagens/mi_1708272572059650.jpg

REVOLTA 
Ativistas da Bicicletada protestam contra a agressividade no trânsito no local do acidente

Dados sobre as mortes de ciclistas no trânsito são alarmantes. De 2004 para 2007, subiram 62,7%, aumentando de 51 para 83 em são Paulo. Foram registrados também mais acidentes fatais de pedestres (aumento de 4,7%) e de motociclistas (de 46,5%). Para João Guilherme Lacerda, da ONG Transporte Ativo, o problema é a falta de fiscalização. “Sem isso, não adianta ter um dos códigos de trânsito mais avançados do mundo”, afirma. Para ele, Nova York é um exemplo a ser seguido. Entre as medidas implementadas lá está a campanha Look, que tem o objetivo de educar e incentivar o respeito entre ciclistas, motoristas e pedestres. Outra iniciativa foi a distribuição de 20 mil capacetes e 1,5 mil campainhas e luzes para bicicletas. A intenção é dobrar as ciclofaixas e ciclovias em três anos.

Para tornar a bicicleta uma opção mais segura, é necessário incluí-la no planejamento viário, afirmam os especialistas. “É preciso divulgar rotas alternativas, evitando avenidas movimentadas e privilegiando ruas tranquilas”, diz Lacerda. Soninha Francine, que acaba de assumir a subprefeitura da Lapa, em São Paulo, é usuária de bicicletas. Para ela, medidas simples já fariam toda a diferença. “O mais viável é uma sinalização adequada, no curto prazo. Nada que exija grandes investimentos”, afirma. Medidas como essas já ajudariam a evitar situações como a que causou o acidente fatal, em pleno cartão-postal paulistano.

/wp-content/uploads/istoeimagens/imagens/mi_1708297293994085.jpg